Além do Cidadão Kane

domingo, 27 de dezembro de 2009

O Caso Battisti e a politização do Judiciário

O governo Berlusconi silenciou quando, muito recentemente, o Presidente francês Sarkozy negou-se a extraditar Marina Petrella, ex-militante das Brigadas Vermelhas. No caso Battisti, exigiu a extradição como se o Brasil fosse uma republiqueta sulamericana.

Enquanto Cesare Battisti esteve exilado na França, o governo italiano não ousou pedir sua extradição. Bastou ser detido no Brasil para o governo Berlusconi exigir a extradição, como se o Brasil fosse uma republiqueta sul-americana. Lembremos que o governo Berlusconi silenciou quando, muito recentemente, o Presidente francês Sarkozy negou-se a extraditar Marina Petrella, ex-militante das Brigadas Vermelhas.

As ações atribuídas a Battisti pela delação premiada de um prisioneiro – não há provas além da testemunhal – configuram crime político, anistiável pela lei brasileira, e já prescrito. A pressão do governo italiano, por si só, já mostra que o caso é político, por mais que o chamem de terrorista. Durante a ditadura militar, os exilados brasileiros também foram chamados de terroristas sanguinários.

Em qualquer país civilizado, questões de política internacional, inclusive conceder ou não asilo político, são da alçada do poder Executivo e não do poder Judiciário. No Brasil, o Supremo Tribunal Federal entendeu que devia antes examinar se havia ou não pressupostos legais para uma possível extradição. Na realidade, parte do STF tentou negar o fundamento da decisão do Ministro da Justiça que concedera refúgio a Battisti, interrompendo, assim, o processo de extradição.

Sem entrar no mérito da distinção técnica entre refúgio e asilo, é importante assinalar que o fato de existir tratado de extradição entre a Itália e o Brasil obriga o governo brasileiro a examinar o pedido de extradição, mas não necessariamente a concedê-la.

O STF concluiu que não havia impedimento legal para uma eventual extradição que, entretanto, só poderia ser decidida pelo Poder Executivo.

Daí a decisão da maioria na segunda votação, que causou celeuma e certa incompreensão, apesar de existir precedentes no próprio STF em relação à extradição de um israelense acusado de maltratar crianças. Naquela ocasião, conforme esclareceu o ministro Ayres Britto, o Supremo Tribunal entendeu que caberia ao presidente da República a decisão final.

Preocupante, na verdade, foi o voto vencido de que o STF poderia decidir a extradição, usurpando prerrogativa constitucional do Executivo. Já são numerosos, no Brasil, os casos de judicialização da política. A parte vencida do Supremo Tribunal queria avançar ainda mais, na direção do que seria um caso flagrante de politização do Judiciário.

Prevaleceu o bom senso e o respeito à Constituição. Cabe ao presidente da República, legitimamente eleito, a decisão de conceder ou não o asilo político. Isso é o que está na Constituição. O resto são lamentações de fundo político ou ideológico.

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Liszt Vieira é antigo exilado político, Professor da PUC-Rio, atualmente Presidente do Jardim Botânico.

Original em Carta Maior

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