Além do Cidadão Kane

quarta-feira, 30 de setembro de 2009


Instituto Millenium, catalisador de idéias conservadoras


Apoiado por barões da mídia e das finanças, organização pretende promover ideais como a economia de mercado e a meritocracia

Antes do golpe civil-militar de 1964, houve no Brasil duas instituições de atuação interligada: o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais (IPES), financiados por empresários nacionais e estadunidenses. Embora não tenham resistido até o golpe, foram responsáveis por promover a agitação intelectual que nele resultou. Em 2005, surge no Rio de Janeiro uma instituição em diversos aspectos semelhante. O Instituto Millenium foi criado como um think tank, uma organização para promover ideais de direita. Defendem a propriedade privada, a economia de mercado, a democracia representativa e a meritocracia. Embora não possuam vínculo formal, é o principal entusiasta da entrada da UnoAmerica no país, ao lado da Academia Brasileira de Filosofia.
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O instituto é presidido por Patrícia Carlos de Andrade. Ex-mulher de um ex-integrante do Banco Central, foi analista de economia e política nos bancos Icatu e JPMorgan. Há quatro anos passou a se dedicar de forma voraz à construção do Instituto Millenium. Patrícia é filha do falecido jornalista Evandro Carlos de Andrade. Em 1995, ele passou a coordenar a Central Globo de Jornalismo e sua gestão é tida como responsável por dar maiores feições de “imparcialidade” e “seriedade” ao jornalismo global – na verdade, parcialidade hipócrita e defesa mascarada dos interesses da burguesia.
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Os vínculos do instituto com a grande mídia não param por aí. Entre os dez principais mantenedores, estão João Roberto Marinho, das Organizações Globo, Roberto Civita, da Editora Abril, e Washington Olivetto, da W/Brasil. O Conselho Editorial é capitaneado por Eurípedes Alcântara, diretor de redação da revista Veja. Entre os integrantes, está Pedro Bial, o comentarista de múltiplos assuntos Carlos Alberto Sardenberg e o intelectual preferido da direita, Demétrio Magnoli. Os “especialistas” propagandeados pelo instituto também têm passagem freqüente pela mídia. Quando o assunto era a criação da CPI da Petrobras, por exemplo, Alexandre Barros era a voz do momento. Foi o governo federal anunciar suas políticas para o pré-sal, Adriano Pires, também indicado pelo instituto, ganhou projeção nos telejornais considerando ruim o projeto, porque seria “estatizante”.
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O gestor do fundo patrimonial é ninguém menos do que Armínio Fraga, presidente do Banco Central de 1999 a 2002. Seu antecessor, Gustavo Franco, também integra o time. Entre os membros do instituto também estão os delegados da UnoAmerica no Brasil, Heitor de Paola e Graça Salgueiro. Já entre os mantenedores, Jorge Gerdau (Gerdau), Sergio Foguel (Odebrecht), Pedro Henrique Mariani (Banco BBM), Salim Mattar (Localiza), Marcos Amaro (Amarco Participações – TAM), Maristea Mafei (Máquina de Notícias) e William Ling (Petropar). O instituto promove anualmente o que chamam de “Dia da Liberdade de Impostos”. Para se ter uma idéia do nível de conservadorismo de seus integrantes, Patrícia, Heitor e Graça assinaram, em 2002, o “Manifesto contra a ditadura esquerdista na mídia”, de Olavo de Carvalho. O documento protestava contra um suposto predomínio de valores progressistas na mídia brasileira. (AA)
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Original em Brasil de Fato

“Povo hondurenho não está disposto a deixar-se vencer”, afirma Zelaya

Dafne Melo
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Após pouco mais de uma semana na embaixada do Brasil, Manuel Zelaya, ainda não viu as negociações com o governo golpista avançarem como gostaria. Para vencer a situação, afirma a necessidade de paciência e continuar as mobilizações por todo país. Tossindo muito e com uma voz cansada, ele concedeu por telefone entrevista exclusiva ao Brasil de Fato da embaixada brasileira em Tegucigalpa.

Existem negociações com os golpistas?
Há muitas aproximações, mas até o momento nenhuma deu fruto. Mas, sim, há negociações.

Como estão as mobilizações no país?
As mobilizações estão tendo bastante expressão, mas nossa comunicação está comprometida, nossos celulares foram cortados. Mas estamos resistindo com muito estoicismo, muita paciência, porque o bem supremo tem um custo e esperamos conseguir restituir o sistema democrático. As mobilizações continuam em todo país, mas estão sendo muito reprimidas pelas forças armadas e pela polícia. Há um estado de ingovernabilidade que creio que deve ser solucionado nas próximas horas. Creio que um país não pode viver em convulsão, a não ser que queiramos viver como no Afeganistão. A América Latina não merece isso, o povo hondurenho não merece.

Reverter o golpe de Estado em Honduras vai ser uma vacina contra os golpes de Estado em todos os países da América, incluindo Brasil, reverter vai ser parte da história do Brasil e da América Latina por sociedades mais democráticas que respeitem a soberania popular. Estamos escrevendo história junto com o Brasil

Como avalia a postura do governo brasileiro?
O governo brasileiro e o presidente Lula têm demonstrado sua vocação democrática ao aceitar que seja feito um diálogo a partir da embaixada, e que quem deve fazer parte desse diálogo é o presidente que eles reconhecem, o governo eleito pelo povo. Isso fala muito da estatura moral e política continental que tem o presidente do Brasil. Nós queremos que esse processo dure o menor tempo possível para devolver à América Latina a certeza de que não serão permitidos golpes de Estado no século 21.

Quais são as alternativas, caso não se consiga uma saída diplomática?
A alternativa que temos é manter a luta. O povo hondurenho não está disposto a deixar-se vencer e ajoelhar-se diante de uma ditadura militar. Então, por agora, mantemos as mobilizações e também contamos com o apoio da comunidade internacional.

No Brasil existe uma especulação a respeito de se Lula participou de algum plano para sua volta. O governo nega e diz que foi avisado uma hora antes. O senhor confirma essa informação?
Nem o presidente Lula, nem Marco Aurélio [Garcia], nem o chanceler [Celso] Amorim sabiam da minha chegada a Tegucigalpa com antecedência. Quando cheguei tinha várias opções. Mas escolhi o Brasil. Falei com o Amorim, expliquei que queria tentar algum diálogo a partir daqui, também por motivos de segurança, por temor a represálias ou de ser sacrificado pelo regime. E me disseram que podia ir. Mas só souberam nesse momento.
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Original em Brasil de Fato

terça-feira, 29 de setembro de 2009

HONDURAS RESISTE

Noites de terror em Honduras

por Angel Palacios (*)

Nas noites de Honduras impera o terror. A ditadura converteu Honduras numa imensa prisão onde as noites são aproveitadas por matilhas de polícias e militares que invadem, torturam e saqueiam.

À noite em Honduras o que percorre as ruas é o terror com botas, capacetes e uniformes. Veículos com militares e polícias encapuzados patrulham as ruas nas noites, disparando contra os bairros e as casas. saem a toda velocidade dos comissariados para regressar em pouco tempo com as camionetas repletas de cidadãos golpeados, humilhados, sangrentos...

A noite com toque de recolher é o cenário preferido pelos sabujos. O toque de recolher, sem garantias constitucionais, sem câmaras de televisão, nem multidões nas ruas, é o momento que os cães da ditadura aproveitam para semear o terror. Na noite passada pudemos percorrer vários bairros e foi isto que vimos:

Avisam-nos que numa das escadas de um bairro um comando policial chegou de forma intempestiva e vão invadir uma vivenda. Trata-se da casa de uma pintora muito conhecida na vizinhança. Na volta de uma escada oito polícias, como gatos na escuridão, cercam a casa. A casa está pintada de rosa e tem um grafitti contra o golpe na fachada. Os polícias golpeavam a porta com paus. Partem os vidros da janela. Um dos polícias, com uma bomba lacrimogênea na mão, calcula o ângulo para lançá-la dentro da casa. O veículo identificado como Polícia Nacional aguarda-os na parte debaixo das escadas. O polícia que conduz dá o alerta de que um grupo de jornalistas está a gravá-los. O chefe da operação (subcomissário García) tapa-nos a lente de uma das câmaras. Outros tapam o nome costurado nos seus coletes. Há vizinhos que abrem as suas portas e janelas confiados na presença da imprensa internacional e gritam-lhes, denunciam-nos. Os polícias tratam de retirar-se. O polícia identificado como García justifica-se argumentando que vive nessa vizinhança e que não suportava que a sua vizinha houvesse pintado na fachada: "GOLPISTAS: EL MUNDO LOS CONDENA", "VIVA MEL". Foi esse o argumento do funcionário para desencadear o terror contra uma mulher humilde. Membros de organizações de Direitos Humanos e da Frente de Advogados contra o Golpe fazem-se presente e os polícias fogem acossados pela denúncia. A mulher que, temerosa, por fim abriu a porta, também saiu do bairro. Foi dormir num lugar seguro, perante a ameaça de que voltassem à sua procura mais tarde.

Um jovem aparentando 20 anos caminha por uma rua escura em plena noite. Tem o rosto banhado em sangue e uma ferida na fronte de uns 5 centímetros. Anda descalço. Explica-nos: estava na porta da sua casa quando uma camioneta da polícia apareceu na sua rua e sem meias palavras saíram e golpearam-no entre outros. Atiraram-no para cima da camioneta e arrancaram com ele. Enquanto davam voltas e o pateavam, revistaram-lhe os bolsos despojando-o de um telefone celular e do seu relógio. Continuava jogado no piso da camioneta enquanto escutava os polícias a discutirem sobre quem ficava com o relógio e quem com o celular. Deixaram-no estendido longe da sua casa. O jovem não quis fazer a denúncia. Não queria mais problemas com a polícia, estava aterrorizado. Só pedia que o levássemos à sua casa.

Outro jovem é detido na esquina do seu bairro. Antes de subi-lo para a camioneta, quatro polícias lhe dão uma sova. A seguir esvaziam uma lata de tinta em spray na sua cara. O jovem respira com dificuldade. Conta-nos no hospital, enquanto lhe limpam a tina dos olhos inflamados pelos golpes, que um dos polícias lhe dizia enquanto o golpeava: "Não é da resistência? Pois resiste!"

Numa ponte há um posto de controle. Detêm-nos e entabulamos conversação com os polícias qualquer assunto para poder seguir. Um veículo que passa por ali percebe o posto de controle e retrocede lentamente. Um dos polícias que nos mandou parar olha o carro a retroceder e convida-nos, divertido, a ver o que vai acontecer, mas obrigando-nos a manter as câmaras desligadas. Sob a ponte, pela rua que seguiu o carro que tentar evitar o posto de controle, há um grupo de polícias a caçar os que tentam evadir-se. Detêm-no. Na parte de cima da ponte não se vê mas ouve-se... Ouve-se a porta que se abre... Ouvem-se a raiva e os insultos dos polícias, os golpes contra o carro... Ouvem-se outros golpes e os gritos do condutor. Não ouvimos mais. O carro seguiu dali a pouco.

Ouvem-se disparo numa avenida paralela a um bairro popular. Uma camioneta cheia de polícias é a que dispara na noite, às cegas, contra as casas do bairro. Vão devagar. Nada os ameaça. Disparam repetidamente. Nem sequer apontam. Só semeiam o terror na sua passagem.

Num comissariado à meia-noite, os membros de organizações de direitos humanos, advogados e imprensa internacional perguntam pelos detidos, que acabamos de ver que desceram de uma pick-up patrulha (eram cerca de 10). Sarcasticamente, o oficial diz-nos que ali não têm ninguém preso. Mas os presos gritam que são da resistência. Gritam os seus nomes. O oficial continua a negar o que é evidente. A insistência dos advogados e dos defensores dos direitos humanos consegue que soltem a metade dos detidos e que um médico venha a essa hora constatar o estado físico do resto. Todos golpeados, sangrando. Pela manhã os advogados da resistência conseguiram que os soltassem.

Em outro comissariado, atrás de um portão negro, escutam-se as vozes de pelo menos uma vintena de pessoas a recitarem os seus nomes. Do lado de fora umas quantas mães e esposas tentam estabelecer contacto com o seu familiar, tentam reconhecer-lhes a voz. Os uniformizados riem diante da cena. Aproximam-se e golpeiam contra o portão... ...e contra os familiares.

Em outro bairro, nas alturas de Tegucigalpa, cerca de 40 uniformizados, entre policias e militares, avançam apontando fuzis de guerra às casas. Quando se pergunta quem é o comandante dessa operação todos os uniformizados assinalam-nos um militar. Este diz que é uma operação de rotina, porque "o governo não vai continuar a permitir desordens" e que "o que se passe a essa hora não é da sua responsabilidade porque há toque de recolher". As credenciais de imprensa internacional e de organizações humanitárias dificilmente conseguem abrir-nos passagem e continuar. Os uniformizados afastam-se. As luzes das casas no bairro se vão acendendo à medida que o esquadrão do terror se afasta. Ninguém sai, mas ouvem-se gritos: "Assassinos", "Urge Mel", "Viva a Resistência".

Estes são apenas alguns casos dos que pudemos ver numa noite. Todos os dias ocorre o mesmo. Não se sabe quantos detidos há a cada noite. Não se sabe quantos corpos são rompidos, maltratados, humilhados nas noites de Honduras. Não se sabe quantas mulheres são violadas. Não se sabe os nomes, as idades, não se conhecem os testemunhos... Porque os toques de recolher são para isso. Para que a matilha de assassinos que sustentam esta ditadura semeie o terror sem que transpire aos meios de comunicação e para que as vítimas se imobilizem e não denunciem.

Nas noites de Honduras não brilham as estrelas. Só as luzes das patrulhas e o sangue dos que caem nas mãos da matilha uniformizada. Botas e mais botas nas ruas, nas costas, nos rostos dos hondurenhos. E apesar do terror que a cada noite semeia a ditadura, não há medo. A resistência continua.

Quando sai o sol, há marchas, tomadas de ruas, mobilizações pacíficas mas desafiantes e contundentes. Os que curam as suas feridas talvez não os vejamos durante alguns dias nos protestos, mas a notícia corre e a indignação pelo que se está a passar hoje em Honduras faz com que muitos mais se incorporem. Noventa dias de resistência. Corpos contra balas. Os organismos direitos humanos referem-se a mais de 600 detidos, dos que se tem conhecimento. Mas muitos são detidos e torturados na noite e não denunciam por medo. Honduras precisa que o mundo reaja mais rapidamente perante a terrível violação dos direitos humanos que se está a verificar. A diplomacia não basta. É urgente que o mundo atue aqui em Honduras e agora.

PS: As organizações de direitos humanos e advogados solidários fazem um trabalho incansável para atender as vítimas, para acompanhar as denúncias, para efetuar registros. Mas não têm recursos. Não contam com o mínimo. Não têm como encher o reservatório de gasolina para se deslocarem aos lugares, não têm saldo nos telefones para efetuar as chamadas necessárias. E ainda assim fazem magia para defender os direitos dos seus compatriotas. Levam 90 dias fazendo magia e é muito o que conseguem. A sede da COFADEH está a toda hora cheia de gente que vai denunciar os atropelos vividos, e cheia também de gente que vai apoiar o seu trabalho. Muitos e muitas dirigentes destas organizações de direitos humanos foram perseguidos, encarcerados para tentar calá-los. Apesar das dificuldades continuam a ser o único lugar aonde acudir para buscar refúgio diante da repressão. É urgente a solidariedade povo a povo, que os organismos de direitos humanos de outros países, que os comitês de solidariedade de outros países se ponham em contato com eles e os apóiem, divulguem as suas denúncias, enviem apoio a essas organizações que em Honduras lutam contra o Terror da Ditadura.


28/Setembro/2009



Original em Resumen latino-americano , nº 2088
Este artigo encontra-se em Resistir

Estados Unidos tornam a impedir venda de equipamentos médicos a Cuba

TeleSUR
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O governo estadunidense impediu nesta terça-feira à transnacional Cook Vascular Inc. de vender a Cuba dispositivos para extrair os eletrodos ou cabos danificados de marca-passos implantados na cavidade cardíaca.
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Em declarações ao diário Granma, o médico cubano Francisco Dorticós, chefe do Departamento de Arritmias e Marca-passos do Instituto de Cardiologia e Cirurgia Cardiovascular, criticou a reiterada negativa a ofertar tais meios a seu país.
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"Fizemos em diferentes situações a solicitação para a compra, e a resposta recebida é sempre a mesma negativa", disse o também Doutor em Ciências.
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Esses aparelhos permitem a substituição dos eletrodos sem necessidade de realizar uma cirurgia cardíaca que tem altos riscos cirúrgicos para a vida dos pacientes, maior permanência hospitalar e recuperação, e elevados custos assistenciais.
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segunda-feira, 28 de setembro de 2009

As seguradoras gastam um milhão de euros por dia, para fazer fracassar a reforma de Obama

Charlotte Bozonnet

Nos Estados Unidos, o setor privado quer impedir a todo custo que se lhes escape esta verdadeira mina de dinheiro. Por trás das espetaculares manifestações de rua contra a reforma sanitária – na semana passada dezenas de milhares desfilaram em Washington acusando a Obama de conduzir o país ao socialismo - se encontra outra oposição, menos espetacular, mas muito poderosa: a das companhias de seguros e dos laboratórios farmacêuticos. “Para eles, é imensamente grande o que está em jogo e estão dispostos a gastar muito dinheiro para defender sua fatia do bolo”, diz Catherine Sauviat, economista do Instituto de Investigações econômicas e sociais (IRES). E que fatia! Cerca de 70% dos norte-americanos que têm cobertura da saúde estão segurados por meio de seguros privados e o mercado da saúde representa um sexto do PIB norte-americano. “A indústria dos seguros de saúde viu aumentar a sua participação no PIB de 1,5 % em 1979 para 5,5 % em 2007”, assinala o premio Nobel de economia Paul Krugman em um artigo no New York Times.

Conseqüência: “um ator menor se converteu em um monstro político que gasta 1,4 milhões de dólares – 1 milhão de euros - cada dia para fazer pressão sobre o Congresso.” Ultrapassando a própria reforma, os protagonistas da saúde - indústrias farmacêuticas e seguradoras à frente - são os principais financiadores dos representantes do Congresso. Sua influencia no projeto de reforma é, por tanto, maior. “Se aceitam alguns pontos da reforma, é só com importantes contrapartidas, afirma Catherine Sauviat. De maneira que se aceitaram terminar com a seleção de riscos, é unicamente porque a obrigatoriedade do seguro lhes vai trazer dezenas de milhões de novos clientes.” A indústria dos seguros também se tem oposto ferozmente à instauração de uma saúde pública que poderia competir com ela. Com êxito, sem duvida, já que a comissão de finanças do Senado, cujo papel será decisivo na redação do projeto final, se declarou contra. “A reforma tería dois objetivos, recorda Catherine Sauviat. A instauração de uma cobertura universal que deveria levar ao estabelecimento de um sistema se não obrigatório, com muitos estímulos e a redução de custos, o que se está dificultando. Enquanto não se toque na fatia do bolo das seguradoras privadas, será muito difícil estabelecer políticas de redução de custos.” Com este enfoque, a reforma não questionará seu caráter secreto de negócios.
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Publicado em L'Humanité

Ditadura fecha rádio e tv, cassa direitos civis e ameça embaixada brasileira

Do Brasil de Fato


O governo hondurenho suspendeu por 45 dias, nesta segunda-feira (28/9), as garantias constitucionais, como o direito de reunião e de habeas-corpus, e restringiu as liberdades de circulação e expressão.

Os golpistas também fecharam a rádio Globo, que se manifestava favorável ao presidente deposto, Manuel Zelaya. Cerca de 20 pessoas das forças de segurança tomaram o edifício da rádio por volta das 5h30mim (horário local) e tiraram o sinal do ar. Policiais também realizaram uma intervenção no Canal 36, retirando suas antenas.

Com a medida, foram fechados os únicos meios que a Frente Nacional contra o golpe do Estado de Honduras tinha para comunicar-se com todo o país.

O ministro do Interior da administração golpista, Oscar Matute, afirmou que os veículos de imprensa que incitarem violência estarão na mira do governo, anunciando ainda que a estatal Hondutel irá vigiar os meios de comunicação.

Segundo o decreto, a polícia e as Forças Armadas poderão fechar estações de rádio ou televisão "que não ajustarem sua programação às disposições atuais".

Autoridades policiais ou militares também poderão deter pessoas que desobedecerem o toque de recolher ou que forem suspeitas de provocar distúrbios.

Ameaça

No domingo (27/9), o ministro de Relações Exteriores do governo golpista de Honduras, Carlos Lopez Contreras, anunciou que a embaixada do Brasil será considerada "um prédio privado", se, no prazo de dez dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não informar oficialmente em que condições o presidente deposto, Manuel Zelaya, está abrigado.

“O Brasil decidiu romper com o governo. Simplesmente, o que estamos fazendo é reciprocidade. As relações diplomáticas são vínculos entre dois países, esse vínculo dá certos direitos e privilégios. E um dos direitos é manter os escudos diplomáticos. O título para ter escudo e tudo isso é acompanhando da relação bilateral. Se não existe essa relação bilateral, tem que se retirar o escudo. Vai ser um escritório privado”, explicou Contreras.

Na prática, significa que o Brasil poderá ficar sem embaixada em Honduras. O ultimato foi dado em entrevista coletiva na Casa Presidencial. De acordo com Contreras, por "cortesia", mesmo que o prazo expire, o prédio não será invadido para a detenção de Zelaya, que pediu abrigo na última segunda-feira (21).

“Isso não quer dizer que, por cortesia e por relação de civilização que o governo de Honduras tem, vai entrar na embaixada porque não tem o escudo”, garantiu.

O ministro conselheiros do Brasil na Organização dos Estados Americanos (OEA), Lineu Pupo de Paula, que está dentro da embaixada do Brasil, disse que a situação é "muito séria", mas avalia que, mesmo se o Brasil perder a embaixada, o prédio não deve ser invadido para a captura de Zelaya.

Além do ultimato ao Brasil, o governo golpista anunciou o rompimento de todas as relações diplomáticas com Espanha, Argentina, México e Venezuela.

Lula rejeita ultimato

Na noite de sábado (26/9), o governo de Micheletti já havia dito que o Brasil tinha um prazo de dez dias para determinar a situação de Zelaya, caso contrário, adotaria medidas "adicionais", previstas na legislação internacional.

Lula, porém, afirmou que não acataria o ultimato do governo de Honduras para que o Brasil definisse em dez dias a situação de Zelaya.

“Primeiro, o governo brasileiro não acata ultimato de um golpista e nem reconhece [Roberto] Micheletti como um governo interino. Não sei por que o editor de vocês pediu para vocês falarem em governo interino, uma vez que a palavra correta é golpista, usurpadores de poder, essa é a palavra correta, e o governo brasileiro não negocia com eles”, afirmou.

Segundo Lula, quem tem que negociar com Micheletti é a OEA, assim como o Conselho de Segurança das Nações Unidas, e não o Brasil.

“Portanto, este caso, para mim, estará encerrado na medida em que houve a decisão por unanimidade da OEA, como foi a decisão do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Então o Brasil não tem que conversar com estes senhores que usurparam o poder. Se a ONU ou a OEA fizerem um pedido ao Brasil, poderemos simplesmente acatar esse pedido, mas não desses senhores”, garantiu.

O presidente também destacou que poucas vezes na história houve tanto consenso de repúdio a um governo como está havendo agora em Honduras. “É toda a América do Sul, toda a América Latina, toda a Europa e os Estados Unidos. É toda a África e a Ásia. Não tem um único governo no mundo defendendo este golpista”, assegurou.

Lula informou ainda que o embaixador Celso Amorim ligou para a embaixada brasileira em Honduras e pediu a Zelaya para não fazer incitações. “Que se ele quiser falar com os jornais, que fale, mas sem fazer incitações. Porque evidentemente que se ele extrapolar nós vamos falar que não é politicamente correto ficar utilizando a embaixada para incitação a qualquer coisa além do espaço democrático que nós estamos dando para ele”, completou.

Entrada bloqueada

O chefe da missão brasileira na Organizações dos Estados Americanos, embaixador Ruy Casaes, confirmou que quatro funcionários da OEA foram impedidos de entrar em Honduras na manhã de domingo (27) pelo governo golpista liderado por Roberto Michelleti.

Segundo o chefe da missão brasileira, tratava-se de um grupo precursor que iria preparar a chegada de uma missão de cerca de 15 representantes da OEA, com desembarque previsto para terça-feira (29) em Tegucigalpa.

O governo de Roberto Michelleti bloqueou a entrada dos funcionários sob o argumento de que eles não apresentaram as credenciais diplomáticas à Chancelaria hondurenha.

A OEA, as Nações Unidas e o Brasil não reconhecem a legitimidade do governo golpista e, portanto, os funcionários não estão autorizados a encaminhar um pedido formal para entrar no país.
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Publicado em MST

Ato falho: Tucanos escrevem Brasil com "Z" em seminário nacional

Adesivos onde a palavra “Brasil” está escrita com “Z” foram distribuídos neste sábado (26) num seminário nacional sobre educação, que o PSDB promoveu em Natal, com a presença do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, dos governadores e presidenciáveis José Serra e Aécio Neves. Os adesivos com os dizeres “PSDB a favor do Brazil” foram grudados nas camisas das pessoas logo na entrada do Hotel Praia Mar. A "praguinha" disseminou pelos tucanos e muita gente a usou até o fim, como a moça da foto.
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O PSDB do Rio Grande do Norte, que organizou o evento, disse mais tarde que os adesivos com a frase infeliz não foram confeccionados a pedido do diretório estadual. O material foi feito, segundo a assessoria de imprensa do partido, por um grupo de cerca de 50 filiados do interior.
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O uso da grafia inglesa para o nome do Brasil foi atribuído à gráfica que confeccionou os adesivos. A assessoria de imprensa alegou ainda que, ao perceber o erro, a organização do seminário do PSDB pediu que os filiados retirassem os adesivos, mas alguns permaneceram usando.
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O Brasil com "Z" roubou o brilho do seminário nacional tucano, o quarto de uma série promovida em diferentes estados do país. A ideia era transmitir outra imagem, de um partido preocupado com os problemas brasileiros, unido, apesar da disputa entre os projetos presidenciais de Serra e Aécio, e dispondo de aliados fieis como o DEM, representado pelo senador potiguar José Agripino Maia.
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O próprio tema, educação e inclusão social, foi escolhido buscando apagar uma mancha na imagem pública do partido – a de que os tucanos não são bons em educação. Serra discorreu sobre o tema, dizendo que "o foco deve ser a sala de aula", esquecido de que o estado que governa, embora sendo o mais rico, é o 12º colocado no ranking da educação pública.
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Fonte:Blogosfera

Duas trajetórias distintas

Em que mãos você gostaria que estivesse o Brasil? Qual o verdadeiro diploma que cada um tem e que conta para construir um país justo, soberano e humanista?
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Emir Sader
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Nas horas mais difíceis se revela a personalidade – as forças e as fraquezas - de cada um. Os franceses puderam fazer esse teste quando foram invadidos e tinham que se decidir entre compactuar com o governo capitulacionsista de Vichy ou participar da resistência. Os italianos podiam optar entre participar da resistência clandestina ou aderir ao regime fascista. Os alemães perguntam a seus pais onde estavam no momento do nazismo.
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No Brasil também, na hora negra da ditadura militar, formos todos testados na nossa firmeza na decisão de lutar contra a ditadura, entre aderir ao regime surgido do golpe, tentar ficar alheios a todas as brutalidades que sucediam ou somar-se à resistência. Poderíamos olhar para trás, para saber onde estava cada um naquele período.
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Dois personagens que aparecem como pré-candidatos à presidência são casos opostos de comportamento e daí podemos julgar seu caráter, exatamente no momento mais difícil, quando não era possível esconder seus comportamentos, sua personalidade, sua coragem para enfrentar dificuldades, seus valores.
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José Serra era dirigente estudantil, tinha sido presidente do Grêmio Politécnico, da Escola de Engenharia da USP. Já com aquela ânsia de poder que seguiu caracterizando-o por toda a vida, brigou duramente até conseguir ser presidente da União Estadual dos Estudantes (UEE) de São Paulo e, com os mesmos meios de não se deter diante de nada, chegou a ser presidente da UNE.
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Com esse cargo participou do comício da Central do Brasil, em março de 1964, poucas semanas antes do golpe. Nesse evento, foi mais radical do que todos os que discursaram, não apenas de Jango, mas de Miguel Arraes e mesmo de Leonel Brizola.
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No dia do golpe, poucos dias depois, da mesma forma que as outras organizações de massa, a UNE, por seu presidente, decretou greve geral. Esperava-se que iria comandar o processo de resistência estudantil, a partir do cargo pelo qual havia lutado tanto e para o qual havia sido eleito.
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No entanto, Serra saiu do Brasil no primeiro grupo de pessoas que abandonou o país. Deixou abandonada a UNE, abandonou a luta de resistência dos estudantes contra a ditadura, abandonou o cargo para o qual tinha sido eleito pelos estudantes. Essa a atitude de Serra diante da primeira adversidade.
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Por isso sua biografia só menciona que foi presidente da UNE, mas nunca diz que não concluiu o mandato, abandonou a UNE e os estudantes brasileiros. Nunca se pronunciou sobre esse episódio vergonhoso da sua vida.
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Os estudantes brasileiros foram em frente, rapidamente se reorganizaram e protagonizaram, a parir de 1965, o primeiro grande ciclo de mobilizações populares de resistência à ditadura, enquanto Serra vivia no exílio, longe da luta dos estudantes. Ficou claro o caráter de Serra, que só voltou ao Brasil quando já havia condições de trabalho legal da oposição, sem maiores riscos.
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Outra personalidade que aparece como pré-candidata à presidência também teve que reagir diante das circunstâncias do golpe militar e da ditadura. Dilma Rousseff, estudante mineira, fez outra escolha. Optou por ficar no Brasil e participar ativamente da resistência à ditadura, primeiro das mobilizações estudantis, depois das organizações clandestinas, que buscavam criar as condições para uma luta armada contra a ditadura militar.
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No episódio da comissão do Senado em que ela foi questionada por ter assumido que tinha dito mentido durante a ditadura – por um senador da direita, aliado dos tucanos de Serra -, Dilma mostrou todo o seu caráter, o mesmo com que tinha atuado na clandestinidade e resistido duramente às torturas. Disse que mentiu diante das torturas que sofreu, disse que o senador não tem idéia como é duro sofrer as torturas e mentir para salvar aos companheiros. Que se orgulha de ter se comportado dessa maneira, que na ditadura não há verdade, só mentira. Que ela e o senador da base tucano-demo estavam em lados opostos: ela do lado da resistência democrática, ele do lado da ditadura, do regime de terror, que sequestrava, desaparecia, fuzilava, torturava.
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Dilma lutou na clandestinidade contra a ditadura, nessa luta foi presa, torturada , condenada, ficando detida quatro anos. Saiu para retomar a luta nas novas condições que a resistência à ditadura colocava. Entrou para o PDT de Brizola, mais tarde ingressou no PT, onde participou como secretária do governo do Rio Grande do Sul. Posteriormente foi Ministra de Minas e Energia e Ministra-chefe da Casa Civil.
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Essa trajetória, em particular aquela nas condições mais difíceis, é o grande diploma de Dilma: a dignidade, a firmeza, a coerência, para realizar os ideais que assume como seus. Quem pode revelar sua trajetória com transparência e quem tem que esconder momentos fundamentais da sua vida, porque vividos nas circunstâncias mais difíceis?
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Original no Blog do Emir

domingo, 27 de setembro de 2009

Adalberto Monteiro: do governo Lula aos novos desafios do PCdoB

Dois temas — o balanço do governo Lula e as perspectivas de luta para os comunistas — dominaram, na manhã desta segunda-feira (14), o primeiro “Debate dos Projetos de Resolução do 12º Congresso do PCdoB”. Com exposição de Adalberto Monteiro, presidente da Fundação Maurício Grabois e secretário de Formação do PCdoB, a atividade teve como eixo o mote “Garantir a continuidade do ciclo progressista, aberto em 2002 no Brasil, promovendo a aprofundamento das mudanças”.
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Em sua fala, Adalberto sintetizou os 27 pontos do Projeto de Resolução Político ao 12º Congresso do PCdoB sobre a Situação Conjuntural do Brasil. O documento já foi debatido e aprovado pelo Comitê Central do partido. Seu texto final será apresentado justamente no Congresso, após servir de base para discussões nas mais variadas esferas e bases comunistas.
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De acordo com Adalberto, os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram marcados por um mesmo confronto dentro e fora do governo. “Esse conflito opunha duas vertentes — uma de mudança, desenvolvimentista, e a outra de continuísmo, neoliberal. A resultante foi um governo Lula de modelo intermediário, com nítidos avanços, mas sem grandes choques — sem uma ruptura maior.
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”De positivo, segundo Adalberto, o governo deixa um legado de muito mais democracia institucional, melhores relações com os movimentos sociais e dezenas de conferências temáticas para refletir sobre políticas públicas. “Isso sem contar a presença de comunistas no governo federal — o que é um fato novo para nós”, lembra o dirigente do PCdoB.
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Na área de Relações Exteriores, é de louvar o trabalho desenvolvido pelo o Itamaraty nos últimos anos. “O Brasil fortaleceu sua soberania, praticou uma política externa independente e foi decisivo para o processo de integração sul-americana. O enterro da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) e a construção de um G20 ajudaram a construir pólos alternativos à grande hegemonia dos Estados Unidos”, frisa Adalberto. Com a recuperação — sobretudo material — das Forças Armadas, o Brasil sob Lula fortaleceu também a defesa nacional.
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Nesta correlação de forças, um novo projeto nacional de desenvolvimento se torna mais viável. O PCdoB, assim, propõe quatro pilares para tal projeto: mais democracia, consolidação da soberania nacional, impulso à integração latino-americana e ampliação das conquistas sociais.
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As críticas
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Para Adalberto Monteiro, um dos pontos mais fracos do governo Lula é a política de comunicações. “Acredito que democratizar a mídia hoje, em pleno século 21, terá um impacto tão simbólico e importante quanto a conquista do sufrágio universal pelos operários no século 19”, comparou o dirigente. A criminalização crescente das rádios comunitárias e a concentração da publicidade oficial para a grande mídia foram outros pontos criticados por Adalberto.
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A política econômica não escapou de contestações. De um lado, com a valorização constante do salário mínimo e o êxito de programas como o Bolsa-Família (que beneficia mais de 53 milhões de brasileiros), o governo Lula possibilita distribuição de renda e mobilidade social. Em contrapartida, a política macroeconômica — conforme as palavras de Adalberto — é “ortodoxa, liberal”, “expõe a força do capital financeiro no Banco Central (BC)”, “reflete a Carta aos Brasileiros de 2002” e, por isso, “honra compromissos firmados com o setor rentista e especulador”.
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Por consequência dessa política “híbrida” e com a eclosão da crise do capitalismo, o Brasil foi abatido “quando chegava à altura do cruzeiro”. A “relação promíscua” entre o BC e o capital privado favorece “a desnacionalização da economia, a sangria do Estado nacional”. Parte da dívida pública é atrelada à Selic (taxa básica de juros, regulada pelo Comitê Político Monetário — Copom — do Banco Central. “Pagamos um preço alto por ter mantido os juros altos”, afirma Adalberto.
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O segundo mandato
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Na opinião do PCdoB, o segundo governo Lula, iniciado em 2007, apresenta limitações, apesar de ter acumulado forças para uma “viragem” e de haver implantado ações de relevo, como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). “O segundo mandato não superou a Carta aos Brasileiros, embora o campo desenvolvimentista tenha se fortalecido”, diz Adalberto. Em sua opinião, o governo padece de “debilidades na esfera das convicções”, do “estilo do presidente em favor de situações de moderadas” e do “aceno ao centro, com negligência ao papel da esquerda”.
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Como se comportam os comunistas diante desse cenário? Adalberto resgata uma deliberação da 9ª Conferência Nacional do PCdoB, de 1995. “Dizíamos lá que, nos marcos do capitalismo, os comunistas têm condições de participar de governos de coalizão como força minoritária, mantendo lealdade — mas também autonomia — a esses governos. É o que fazemos na gestão Lula.”
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O dirigente comunista evocou também o manifesto “O governo Lula numa encruzilhada”, de autoria de Renato Rabelo, presidente nacional do PCdoB. No texto, Renato defende que “é chegada a hora de reconstruir o pacto político”, que dê “maior força à base popular e democrática, aos trabalhadores e as camadas médias, em aliança com os empresários da produção e do comércio. Construir assim um grande pacto pela defesa e impulso do desenvolvimento, da economia nacional e do mercado interno, da renda do trabalho e do emprego”.
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O objetivo, agora, é dar “continuidade e aprofundamento ao ciclo aberto pelas duas eleições de Lula” — cujo governo consistiu numa “via alternativa ao neoliberalismo sem rupturas profundas”. Para 2010, a oposição vai credenciada, segundo Adalberto, pela tendência de coesão entre PSDB e DEM, pela hegemonia nos dois maiores colégios eleitorais do país (São Paulo e Minas Gerais), pelo apoio desabrido da mídia e pelo dinheiro incomensurável para a campanha.
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Adalberto conclui: “Para derrotar uma vez mais a direita, o que nós, do campo progressista e democrático, devemos construir é uma aliança ampla — mas com liderança da esquerda, e não do centro”. O PCdoB, por sua vez, deve buscar um desempenho eleitoral que simbolize e reflita seu crescimento — a destacada participação no governo Lula. “Temos condições de ampliar consideravelmente nossa presença na Câmara Federal e no Senado.”
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André Cintra
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Original em Vermelho

Quantas mortes Obama precisará em Honduras?

por Atilio Borón (*)

Ontem o Comitê pela Defesa dos Direitos Humanos de Honduras (CODEH) tornou público um relatório em que responsabiliza o presidente de fato desse país e líder dos golpistas, Roberto Micheletti, pelas mais de 101 mortes extralegais e sumárias perpetradas desde 28 de Junho até à data.

A CODEH foi criada em 11 de Maio de 1981 por um grupo de cidadãos hondurenhos
preocupados com as graves violações aos direitos humanos que se estavam a verificar no país quando o governo de Ronald Reagan decidiu que Honduras seria a plataforma de operações a partir da qual a Casa Branca lançaria a sua ofensiva contra a Revolução Sandinista, que acabava de triunfar na Nicarágua, e a Frente Farabundo Martí, que em El Salvador estava progressivamente a reverter em seu favor a luta contra o exército salvadorenho e seus "assessores" estadunidenses.

Como se recorda, Reagan determinou que à frente dessa operação ficasse John Negroponte, um homem carente de escrúpulos morais e que não vacilou em organizar esquadrões da morte e envolver-se no tráfico de armas e drogas da Operação Irã - Contras dirigida pelo coronel Oliver North. A árdua luta da CODEH e a sua intransigente defesa dos direitos humanos fez que em Novembro de 1994 o governo de Honduras lhe concedesse um estatuto jurídico legal.

Esta instituição, que conta com numerosos homens e mulheres que pagaram com a vida a sua devoção à causa dos direitos humanos, acusa os golpistas hondurenhos de produzir um novo holocausto. Este massacre silencioso, do que apenas uns poucos casos ficaram registrados nos meios de comunicação devido à censura quase total à imprensa e ao sistemático bloqueio de toda informação relativa a esses fatos, teve lugar, segundo a CODEH, no âmbito dos sucessivos "toques de recolher" decretados pelos usurpadores.

As suas vítimas incluem menores e mulheres. Estes assassinatos tiveram lugar principalmente durante as horas em que a polícia e as forças armadas exerciam um controle absoluto das ruas e praças de Honduras.

Para além de qualquer polêmica sobre o número exato de pessoas que morreram neste triste episódio, o certo é que pela mão de Micheletti e dos seus cúmplices e mentores a violência e a morte assenhoraram-se desse país. E é certo também esta brutal escalada prossegue seu curso com a cumplicidade total do presidente Barack Obama, cuja defesa dos direitos humanos, da legalidade, democracia, liberdade e outros valores consagrados pela luta dos povos demonstrou ser, como prevíamos, uma retórica destinada a enganar os incautos e nada mais.

Há poucos dias o presidente Hugo Chávez perguntava perante a Assembléia Geral da ONU qual era o verdadeiro Obama: se aquele que dizia frases bonitas ou o que aceitava o golpe de estado em Honduras, (ao qual teimosamente recusa-se a chamá-lo pelo seu nome), mantinha o bloqueio a Cuba e a injusta e ilegal prisão "dos 5", e semeava bases militares por toda a América Latina em nome da liberdade. Lamentavelmente, a resposta salta à vista e dispensa maiores argumentações.

A idêntica conclusão chegava há poucos dias Mark Weisbrot, distinto acadêmico estadunidense e presidente do Just Foreign Policy quando se perguntava quanta repressão Hillary Clinton apoiará em Honduras. Na sua nota, reproduzida em Rebelión Weisbrot assegura que "a 11 de Agosto, 16 membros do Congresso dos EUA enviaram uma carta ao presidente Obama instando-o a 'denunciar publicamente a utilização da violência e a repressão de manifestantes pacíficos, o assassinato de pacíficos organizadores políticos e todas as formas de censura e intimidação contra os meios de comunicação'. Ainda estão à espera de uma resposta".

Os gorilas hondurenhos não deixaram direito algum por violar: assassinatos, torturas, seqüestros, repressão a manifestantes pacíficos e indefesos, desprezo pelo quadro jurídico nacional e a legalidade internacional, ataque à embaixada do Brasil, censura da imprensa; enfim, a lista seria interminável. Fica de pé a pergunta: Quantas mortes mais precisará a Casa Branca para abandonar a sua inqualificável cumplicidade com um regime que regride a nossa região ao pior do século passado? Quantas precisará Obama para perceber que cada uma delas é também um golpe mais na sua já minguada credibilidade? Os Estados Unidos são o único país com peso significativo na arena internacional que ainda mantém o seu embaixador em Tegucigalpa: O que espera para retirá-lo? Ou será que Honduras está a prefigurar o futuro terrível da América Latina e do Caribe, Obama não sendo outra coisa senão o sorridente e simpático relações públicas, mas que nem por isso deixa de ser uma peça mais na engrenagem infernal do "pentagonismo", como o denominou Juan Bosch.

Para concluir: não é que agora os anti-imperialistas peçam a Washington que intervenha, como refinadamente argumentou nos últimos dias. Já está a intervir, e muito. E está a fazê-lo para perpetuar um regime violador dos direitos humanos, não para promovê-los.

O silêncio de Obama perante tantos crimes nada tem a ver com a abstinência ou o não-intervencionismo. Calar é também uma forma – dissimulada, muitas vezes manhosa e covarde – de intervir. Aquilo que se lhe perde é que, de uma vez por todas, os Estados Unidos deixe de fazê-lo e abstenha-se de apoiar os golpistas. Do resto se encarregará o povo hondurenho, que tem dado mostras da sua capacidade e valentia para sacar Micheletti de cima sem necessidade de ajuda alguma da Casa Branca.

Original em Kaos em la red
Este artigo encontra-se em Resistir

sábado, 26 de setembro de 2009

Impedem auxilio depois de ataque químico a embaixada em Tegucigalpa

por Bianka de Jesus

O regime de fato em Honduras impede que a Cruz Vermelha Internacional auxilie ao presidente Manuel Zelaya e outras 70 pessoas, vítimas de gases tóxicos lançados pelos militares contra a embaixada brasileira.

Altas concentrações de amoníaco e de cianeto de hidrogênio estão no ar, confirmaram medidas realizadas nos arredores da sede diplomática pelo especialista Mauricio Castelhanos; o qual faz prever que ao interior do recinto a situação seja bem mais grave.

O médico Marcos Girón, quem se encontra junto a Zelaya no edifício da missão diplomática, exigiu que se permita o auxilio humanitário, impedido até o momento pelos golpistas, segundo o mandatário constitucional, em declarações à imprensa.

Vômitos, náusea, sangramento nasal, dificuldades respiratórias, dores abdominais, são os sintomas comuns que apresentam os afetados pelos químicos, explicou Girón.

Adicionalmente, informou aos jornalistas que se esgotou o pequeno lote de medicamentos do qual dispunham e enfatizou a necessidade de receber ajuda externa, pois se trata de amenizar os efeitos de tais produtos da indústria militar; para isso, médicos civis como ele carecem de devido treinamento.

"São produtos da indústria militar e não estamos preparados para esse tipo de ataque com gases; não sabemos o antídoto, precisamos mais informação sobre as reações, sintomatologia e antídotos", disse Girón.

Sem essa informação, assegurou o médico, "estamos impossibilitados para tomar as medidas necessárias", reiterando também que a Cruz Vermelha possa chegar à embaixada.

"Somos humanos e exigimos por razões humanitárias que deixem passar os medicamentos", exigiu o médico.

Original em Prensa Latina

Guerra de classe

Rick Wolff (*)

Tradução de Margarida Ferreira
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Os salários reais dos trabalhadores americanos (salários monetários ajustados aos preços que os trabalhadores realmente pagam) não têm aumentado desde os anos 70. Dados recentes do Gabinete de Estatísticas do Trabalho confirmam que os salários reais continuaram a estagnar durante 2009. Durante este mesmo período de 30 anos, a produtividade da força de trabalho continuou a aumentar: o trabalhador médio tem vindo sempre a produzir mais e o empregador médio a vender mais. Portanto, os rendimentos dos capitalistas aumentaram em relação aos salários dos trabalhadores.

Os capitalistas utilizaram esses rendimentos crescentes para intensificar a guerra de classe contra os trabalhadores americanos. Em primeiro lugar, os capitalistas enfraqueceram os seus adversários emprestando uma parte dos seus enormes rendimentos aos trabalhadores americanos, sob a forma de "empréstimos para consumo" a taxas altas. Com salários sem aumentos, os trabalhadores apenas puderam financiar as suas casas, a escola dos filhos, os tratamentos médicos, etc. de que precisavam, através de empréstimos ou pondo a trabalhar mais membros da família, nomeadamente as mulheres. Esta evolução que beneficiava os capitalistas, provocou graves tensões interpessoais nos lares dos trabalhadores que se debatiam com dívidas acumuladas. Durante as últimas décadas, os trabalhadores concentraram-se na solução desses problemas; gastaram menos tempo e energia nos assuntos cívicos, nas atividades sindicais, nos problemas da escola dos seus filhos, etc. Ressentiram-se amargamente com tudo o que o governo pudesse fazer, como aumentos de impostos, que tornassem ainda mais difícil essa solução. Como escreveu um conhecido comentador sobre o atual individualismo dos trabalhadores, eles passaram a jogar "bowling sozinhos" .

Em segundo lugar, os capitalistas utilizaram os seus novos rendimentos para financiar (1) a relocalização da produção e de outras instalações fora dos EUA e (2) a computorização da produção. Através da globalização, as corporações ameaçaram empregados e sindicatos de que o aumento de salários ou de outras melhorias no trabalho podiam traduzir-se na perda de emprego. Através da computorização, passaram a ser precisos menos trabalhadores e o seu poder de negociação com os capitalistas enfraqueceu.

Em terceiro lugar, os conselhos de direção capitalistas utilizaram outra parte das novas receitas para aumentar os salários e os bônus dos gestores de topo (incluindo-se a si próprios), ou seja, das pessoas que contribuem com somas significativas para os políticos que são a favor de leis e regulamentações conservadoras, viradas para os negócios. Assim, as corporações e os gestores de topo aumentaram a dependência dos políticos da sua generosidade coordenada. Simultaneamente, uma grande parte dos trabalhadores distanciou-se dos assuntos políticos. A política americana tornou-se cada vez mais um desporto de espectadores extremamente dispendioso. A política oficial virou-se para a direita mesmo quando a opinião popular de massas, quando sondada, apontava claramente noutra direção. Os políticos perceberam que as suas carreiras não conseguiriam sobreviver perante o fluxo de dinheiro com que as corporações capitalistas e os abastados gestores de topo inundavam as campanhas contra eles. Reagiram ao fato de que os trabalhadores cada vez percebiam menos de política, nomeadamente de finanças, e cada vez participavam menos. Foram ultrapassados pelos seus opositores de classe e perderam a confiança na capacidade ou vontade do Partido Democrata e dos sindicatos em promover os seus interesses de classe.

E assim, embora as maiorias defendam o fim do envolvimento no Iraque, mantêm-se lá grandes forças americanas. A maioria agora se opõe à ocupação do Afeganistão, mas a administração prossegue. A maioria é a favor do apoio do governo ao comum das pessoas, juntamente com a ajuda aos bancos, às companhias de seguros, etc., nesta crise econômica, mas continuamos sem uma solução real para o desastre das penhoras e sem um programa público de emprego para os milhões despedidos pelos empregadores privados. A maioria é a favor do seguro médico para todos e de cuidados médicos de baixo custo , mas a legislação que vai aparecendo está muito longe disso. As maiorias são a favor de estritas limitações e controles sobre o financiamento privado das campanhas políticas, mas o que acontece é o contrário.

Na guerra de classe, os capitalistas desviam a ira e a amargura dos seus adversários com receio de que esses sentimentos mobilizem os trabalhadores. Enormes despesas em publicidade, grupos de analistas, meios de comunicação, celebridades porta-vozes, e acadêmicos conseguem fazer isso responsabilizando o governo, e não os capitalistas, pelas dificuldades dos trabalhadores. Reparem na atual campanha, financiada principalmente pelas corporações de seguros médicos privados, contra a extensão da cobertura pública a milhões de cidadãos sem seguro médico. Demoniza essa extensão como a "imposição do socialismo". A campanha explora os receios dos cidadãos em relação ao que lhes irá custar mais um programa do governo. Contribui para que as pessoas "esqueçam" (se é que sabiam) que em 2008 cerca de 87,4 milhões de cidadãos americanos tinham e apoiavam fortemente o seguro médico público (a Medicare, a Medicaid e o sistema Veteran Affairs das forças armadas). Omite qualquer referência a que, entre 2004 e 2008, a dedução duma família média para os serviços médicos dentro destas redes, na maior parte dos seguros médicos privados proporcionados por empregadores, aumentou de 1 000 para 1 850 dólares . Ao suprimir o conhecimento dos crescentes custos privados e ao exagerar, simultaneamente, os riscos do aumento de custos públicos, a campanha dos seguradores privados lança o alarme nos cidadãos para que estes se oponham ao alargamento do seguro do governo. Pelas mesmas razões, pouco americanos se apercebem de que o sistema médico privado americano é muito mais caro do que os sistemas públicos de muitos outros países (que também prestam melhores cuidados de saúde); a Organização Mundial de Saúde coloca os EUA em 37º lugar quanto à qualidade do seu sistema de saúde (a França ocupa o nº 1).

Mas esta guerra de classe – centrada no desvio de rendimentos, riqueza e poder dos trabalhadores para os capitalistas – não consegue tirar aos trabalhadores a sua arma mais poderosa. Os trabalhadores produzem e entregam aos seus adversários os recursos que depois são utilizados contra eles – aquela diferença entre a sua produtividade para os empregadores e os seus salários dos empregadores. O dilema do capitalismo é esta contradição: os trabalhadores que os capitalistas contratam, exploram e tentam dominar são os mesmos trabalhadores de quem eles dependem para poderem contratar, explorar e dominar.

A guerra de classes provém de uma estrutura profundamente impregnada de capitalismo que lança capitalistas contra trabalhadores. O fim da subida dos salários reais, nos anos 70, aumentou os recursos adicionais nas mãos dos capitalistas permitindo que estes intensificassem a guerra de classes enquanto que esta enfraquecia os trabalhadores. Mas a guerra de classes não foi apenas uma conseqüência, também foi, desde o início, a causa de os salários reais deixarem de aumentar. O capitalismo leva sempre a que os empregadores procurem salários mais baixos, ou seja, leva à guerra de classes para assegurar salários mais baixos. Mas a falta de mão-de-obra nos EUA impediu durante muito tempo que os empregadores o conseguissem (mesmo quando utilizaram maciças vagas de imigração, automação e outras armas de guerra de classes). Quando, por volta da década de 70, essas condições mudaram finalmente (a computorização e a globalização reduziram a procura de mão-de-obra enquanto que as mulheres e nova imigração aumentavam a oferta de trabalho), os empregadores deixaram de aumentar os salários reais com todos os resultados acima referidos.

Tanto em épocas de prosperidade como em épocas de crise, o capitalismo precisa da guerra de classe. Só uma mudança de sistema pode acabar com isso. Os capitalistas têm poucas razões para mudar o sistema. Como sempre, são os trabalhadores que se mantêm em posição de provocar a rotura. Entretanto, sofrem as conseqüências de não o fazerem.

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(*) Professor de Economia na Universidade de Massachusetts – Amherst. Autor de muitos livros e artigos , incluíndo (c/ Stephen Resnick) Class Theory and History: Capitalism and Communism in the USSR (Routledge, 2002) e (c/ Stephen Resnick) New Departures in Marxian Theory (Routledge, 2006). O seu novo livro acerca da crise atual é Capitalism Hits the Fan .
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Publicado em Resistir

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

O MUNDO DEVE ENTENDER QUE NA AMÉRICA LATINA HÁ UMA REVOLUÇÃO

Tradução: Rosalvo Maciel
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O Presidente da República Bolivariana da Venezuela, Hugo Chávez Frías, em seu discurso ante a 64º Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), afirmou: “É necessário que o mundo assuma e aceite que na América Latina há uma revolução, porque essa é uma realidade que não vai mudar”.

“É uma revolução que transcende o ideológico; é uma revolução geográfica, geopolítica, histórica, moral, espiritual e necessária”, asseverou Chávez, ao mesmo tempo que destacou que além disso “esta revolução é grande e vai seguir crescendo a medida que passem os dias, os meses e os anos”.

“São séculos acumulados de luta, de batalhas, de esperança, de sofrimento de milhões e milhões de seres humanos na América Latina”, afirmou.

Esta Revolução, disse, “é grande pelo espaço que vai ocupando e a profundidade (...); pelas massas populares que se somam a ela. Por isso, não tente ninguém pará-la porque ninguém a poderá parar”.

"Somos milhões e nada nem ninguém poderá deter esta revolução latino-americana e caribenha", sentenciou Chávez.

O Chefe de Estado venezuelano fez referencia a que a realidade que vive a América Latina na atualidade está contida no filme de Oliver Stone, “Al sur de la frontera”, no qual “se podem encontrar muitos códigos para entender o mundo em que vivemos”, assinalou.

Disse que após o cine-debate que se realizou nesta quarta-feira em Nova York, ao qual participou com cidadãos estadunidenses, pode constatar que esse país vive imerso em um bombardeio midiático, que não permite que os cidadãos conheçam a realidade da revolução bolivariana que está crescendo ao longo da América Latina.

“O povo estadunidense é vítima do bombardeio midiático e ideológico que cai de maneira inclemente sobre este país e sobre o mundo, tratando de inverter a realidade”, disse Chávez.

Mostrou que Oliver Stone começou a receber pressões para que não seja difundido o filme nos Estados Unidos por parte de “monopólios, mas isso já não depende das salas de cinema que são ligadas aos monopólios, pois estamos na era digital e esse filme vai andar por aí, pela Internet”, disse.
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Original em Tribuna Popular

Ali se gera uma revolução

Fidel Castro

No último 16 de julho disse textualmente que o golpe de Estado em Honduras "foi concebido e organizado por personagens inescrupulosos da extrema direita, que eram funcionários de confiança de George W. Bush e haviam sido promovidos por ele."Citei os nomes de Hugo Llorens, Robert Blau, Stephen McFarland y Robert Callahan, embaixadores yankis em Honduras, El Salvador, Guatemala e Nicarágua, nomeados por Bush nos meses de julho e agosto de 2008 e que os quatro seguiam a linha de John Negroponte e Otto Reich, de tenebrosa historia.

Apontei a base yanki de Soto Cano como ponto de apoio principal do golpe de Estado e que "a idéia de uma iniciativa de paz a partir da Costa Rica foi dada ao Presidente desse país pelo Departamento de Estado quando Obama estava em Moscou e declarava, em uma universidade russa, que o único Presidente de Honduras era Manuel Zelaya". Acrescentei que "com a reunião de Costa Rica se questionava a autoridade da ONU, da OEA e demais instituições que comprometeram seu apoio ao povo de Honduras e a única alternativa era exigir do Governo dos Estados Unidos o fim de sua intervenção em Honduras e a retirada desse país da Força de Tarefa Conjunta."

A resposta dos Estados Unidos, apos o golpe de Estado nesse país da América Central, foi compactuar com o Governo da Colômbia um acordo para criar sete bases militares, como a de Soto Cano, nesse país irmão, que ameaçam a Venezuela, Brasil e todos os demais povos da America do Sul.

Em um momento crítico, quando se discute em uma reunião de Chefes de Estado nas Nações Unidas a tragédia da mudança climática e a crise econômica internacional, os golpistas em Honduras ameaçam violar a imunidade da Embaixada do Brasil, onde se encontra o presidente Manuel Zelaya, sua família e um grupo de seus seguidores que foram obrigados a proteger-se nesse recinto.

Está provado que o governo do Brasil não teve absolutamente nada que ver com a situação que ali se criou.É por tanto inadmissível, mais ainda inconcebível, que a Embaixada brasileira seja assaltada pelo governo fascista, a não ser que pretenda instrumentar seu próprio suicídio, arrastando o país a uma intervenção direta de forças estrangeiras como ocorreu no Haiti, o que significaria a intervenção de tropas yankis sob a bandeira das Nações Unidas. Honduras não é um país distante e isolado no Caribe. Uma intervenção de forças estrangeiras em Honduras desataria um conflito na América Central e criaria um caos político em toda a América Latina.

A heróica luta do povo hondurenho, depois de quase 90 dias de incessante batalhar, pôs em crise o governo fascista e pró yanki que reprime a homens e mulheres desarmados.

Temos visto surgir uma nova consciência no povo hondurenho. Toda uma legião de lutadores sociais se moldou nessa batalha. Zelaya cumpriu sua promessa de regressar. Tem direito a que se lhe recoloquem no Governo e realize as eleições. Dos combativos movimentos sociais estão se destacando novos e admiráveis quadros, capazes de conduzir a esse povo pelos difíceis caminhos que esperam aos povos de Nossa América. Ali se gera uma Revolução.

A Assembléia das Nações Unidas pode ser histórica na dependência de seus acertos ou erros.

Os líderes mundiais expuseram temas de grande interesse e complexidade. Eles refletiram a magnitude das tarefas que a humanidade tem por diante e quão escasso é o tempo disponível.
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Publicado em TeleSUR
Traduzido por Rosalvo Maciel
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Honduras: os golpistas em xeque

Com a chegada de Manuel Zelaya às Honduras e a sua instalação na embaixada do Brasil em Tegucigalpa – onde está como hóspede, pois o Presidente da República não pode estar como asilado político no seu próprio país – aos golpistas agrupados à volta de Micheletti põe-se uma opção: ou “perpetrar um banho de sangue para afogar o movimento popular, fortalecido na reivindicação do regresso à institucionalidade, ou retirar-se do poder que ocuparam delituosamente desde há quase três meses. (…) Os golpistas encabeçados por Micheletti parecem encurralados, mas não derrotados.

La Jornada (Editorial)

A surpreendente aparição do presidente constitucional hondurenho, Manuel Zelaya, na embaixada brasileira em Tegucigalpa altera o impasse em que se encontrava a nação centro-americana desde o golpe de Estado oligárquico cometido em finais de Junho passado, quando eletivos militares tiraram o presidente da sua residência, expulsaram-no das Honduras e impuseram como titular do Executivo o usurpador Roberto Micheletti.

Deste modo, o regresso do presidente deposto ao país abre um novo espaço para a ação da diplomacia continental, que parecia ter esgotado completamente os seus caminhos, desde que o presidente costa-riquense, Óscar Árias, formulou uma incongruente e antidemocrática proposta conciliatória que pretendia premiar os golpistas com a distribuição de pastas no governo.

A resistência popular hondurenha vê-se subitamente fortalecida, não só perante o regime de gorilas [gorilato] instaurado em Junho, mas também perante o próprio Zelaya e os governos latino-americanos e os organismos internacionais, depois de quase 90 dias passados desde o golpe se ter mantido viva, mais ampla, ter ganho organização e presença e sido o único fator interno de contrapeso ao golpismo. Torna-se claro que, com estes antecedentes terá de ser tomada em conta no processo de restauração da institucionalidade.

A julgar pela informação disponível, os comandantes quarteleiros e civis que se prestaram a instaurar um regime espúrio encontram-se, devido aos acontecimentos de ontem, perante duas opções: perpetrar um banho de sangue para afogar o movimento popular, fortalecido na reivindicação do regresso à institucionalidade, ou retirar-se do poder que ocuparam delituosamente desde há quase três meses. A moeda está no ar e, até ao fecho desta edição [22 de Setembro], os golpistas encabeçados por Micheletti parecem encurralados, mas não derrotados.

No âmbito externo, os fatos parecem demonstrar que Zelaya não regressou ao país sem ter assegurado previamente o apoio – ou, pelo menos as boas graças – dos governos do Brasil e da Nicarágua – foi a partir do seu território que pode partir furtivamente – e dos Estados Unidos; é o que sugere o fato de o Departamento de Estado e a chancelaria brasileira terem confirmado a presença do presidente constitucional em solo hondurenho num momento em que o regime de Micheletti não tinha conhecimento disso.

Se o que foi dito antes é verdade, a região encontra-se perante um importante realinhamento das presenças continentais na América Central: o Brasil – cuja embaixada na capital hondurenha serve de refúgio a Zelaya, mas sobretudo de quartel-general – ganharia um protagonismo regional indiscutível entre as nações do istmo centro-americano, parcialmente construído sobre a ausência da diplomacia mexicana na zona.

Finalmente, essa ausência deveria ser motivo de reflexão: se durante décadas a chancelaria do nosso país [México] desempenhou um papel fundamental junto das nações centro-americanas – recordem-se. Por exemplo, a Declaração Franco-Mexicana sobre El Salvador (1981), a criação do Grupo Contadora, antecessor do Grupo do Rio e as mediações nos processos de paz de El Salvador e Guatemala –, esse papel foi progressivamente abandonado até ao ponto de o governo foxista o ter substituído por uma sigla sem qualquer substância (o Plano Puebla-Panamá), e a atual administração ter inclusivamente prescindido da sigla.

Este texto foi publicado no diário mexicano La Jornada.

Tradução de José Paulo Gascão

quinta-feira, 24 de setembro de 2009

O embuste dos kits

Ou a incapacidade de gerenciar honestamente
Leandro Fortes

Na manhã de 16 de junho, o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, do DEM, e o secretário de Saúde Distrital, Augusto Carvalho, do PPS, se encontraram no Almoxarifado Central da Secretaria para participar de um lance de marketing: a entrega de 30 kits de equipamentos, no valor de 3 milhões de reais, para desafogar a precária rede de unidades de terapia intensiva (UTIs) do sistema de saúde local. O evento, como logo em seguida iria demonstrar o Ministério Público, era um embuste. A compra não só era falsa como a transação escondia parte de um esquema voltado para a privatização da saúde no DF.

Dois dias depois, ao mesmo Almoxarifado se dirigiu um grupo liderado pelo promotor Jairo Bisol, do Ministério Público do Distrito Federal, titular da Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus). Acompanhado de um perito e dois analistas, todos médicos, Bisol descobriu que os equipamentos eram, além de usados, tecnologicamente obsoletos. Além disso, a maioria não tinha nota fiscal nem qualquer documento a lhe atestar a origem. O destinatário da mercadoria não era o secretário Augusto Carvalho, mas duas pessoas estranhas ao serviço público: Gustavo Teixeira de Aquino e Marisete Anes de Carvalho.

No endereço indicado nas caixas, um escritório no Setor Sudoeste de Brasília, o Ministério Público localizou a empresária Marisete Carvalho, dona de uma pequena empresa de reformas de condomínios e de comércio de equipamentos hospitalares. Marisete é um dos elos a unir os negócios da saúde no Distrito Federal a um esquema de contratos irregulares descoberto pelo MP do DF, com potencial de se transformar numa ação de improbidade administrativa contra diversas autoridades brasilienses.

Ao depor no Ministério Público, Marisete Carvalho disse ter sido procurada, em maio, por um empresário de Goiânia, Davi Clemente Monteiro Correia, dono da Equipamed. Amigo pessoal de Fernando Antunes, secretário-adjunto de Saúde do DF e braço direito de Augusto Carvalho, usou apenas o endereço comercial de Marisete para formalizar a remessa dos equipamentos por carga aérea. Ao promotor Bisol, a empresária disse que as caixas foram recolhidas no aeroporto de Brasília. Disse desconhecer o outro destinatário, Gustavo Teixeira Aquino, embora ambos tenham figurado como habitantes do mesmo endereço.

O mistério em torno do tal Gustavo foi resolvido pelo MP. Ele é irmão de Rodrigo Teixeira de Aquino, dono da Intensicare Gestão em Saúde Ltda, representante de equipamentos hospitalares. E sócio do empresário Davi Correia – amigão do secretário-adjunto Fernando Antunes – em um Centro Brasileiro de Medicina Avançada, em Goiânia. Em 2 de julho, 15 dias depois de Arruda e Carvalho anunciarem a compra fajuta dos kits de saúde, a empresa de Rodrigo Aquino foi agraciada com um contrato de 33,3 milhões de reais para administrar 70 leitos de UTI do Hospital Regional de Santa Maria – a menina dos olhos do esquema de privatização da saúde no DF.

A explicação dada ao promotor Jairo Bisol sobre o imbróglio aqui descrito beira o surreal. Ao depor no Ministério Público, o secretário-adjunto Fernando Antunes admitiu a amizade com o empresário Davi Correia, da Equipamed, e fez uma confissão aparentemente absurda: os 30 kits levados ao Almoxarifado Central, anunciados publicamente pelo governo Arruda como parte de um projeto de ampliação de UTIs, ao custo de 3 milhões de reais, resultavam de um empréstimo de aparelhos usados, a serem devolvidos em 90 dias.

Na origem das transações está a decisão de Arruda em contratar, sem licitação, a Real Sociedade Espanhola de Beneficência, da Bahia, para gerir o Hospital Regional de Santa Maria, inaugurado há um ano e meio, ao custo de 130 milhões de reais (8 milhões dos quais repassados pelo governo federal). Trata-se de um contrato de dois anos, firmado em janeiro, de 222 milhões de reais, sob suspeita de servir ao caixa 2 eleitoral. O contrato soa irregular a começar pela instituição contratada, investigada pelos ministérios públicos estadual e federal da Bahia por fraude e desvio de verbas da prefeitura de Salvador, sob auspícios do prefeito João Henrique Barradas, do PMDB.

O processo de escolha da Real Sociedade Espanhola tem sido contestado pelo Ministério Público e pela bancada de quatro deputados do PT na Câmara Legislativa do DF. O partido entregou, em vão, uma representação ao procurador-geral de Justiça, Leonardo Bandarra, para suspender o convênio. “Há uma quadrilha instalada na Secretaria de Saúde”, acusa o deputado Cabo Patrício, do PT, um dos articuladores da natimorta CPI da Saúde do DF. Graças ao apoio de 20 dos 24 deputados distritais, Arruda evitou a investigação na Câmara local.

Em 15 de abril, a promotora de Justiça Cátia Vergara tentou impedir a terceirização do Hospital de Santa Maria. De acordo com ela, a Constituição Federal concedia à iniciativa privada uma participação exclusivamente complementar junto ao Sistema Único de Saúde (SUS). A mesma norma é reforçada pela Lei Orgânica da Saúde, Lei Orgânica do DF, Lei de Licitações e Contratos, uma portaria do Ministério da Saúde e outra do Conselho Nacional de Saúde.

Por meio de uma ação civil pública, Cátia Vergara acusou a terceirização de injustificável do ponto de vista administrativo, haja vista existirem centenas de aprovados em concursos públicos realizados pela Secretaria de Saúde do DF, jamais chamados a trabalhar. Para ela, o Hospital de Santa Maria poderia estar em regime de pleno atendimento à população, não fosse a decisão do governador Arruda de terceirizá-lo.

Em 20 de abril, a 8ª Vara de Fazenda Pública do DF, com base na ação do Ministério Público Distrital e de um parecer do Tribunal de Contas do DF, determinou a suspensão do contrato com a Real Sociedade Espanhola. Menos de um mês depois, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal derrubou a decisão de primeira instância e o GDF prosseguiu a terceirização do Santa Maria. Para tal, ignorou outros graves antecedentes da feliz ganhadora do contrato.

A Real Sociedade Espanhola é investigada pela Controladoria-Geral da União (CGU) por suspeita de desvio de dinheiro público em Salvador. A CGU apontou o envolvimento da entidade no desvio de cerca de 80 milhões de reais de verbas federais, estaduais e municipais. A investigação foi iniciada após o assassinato de Neylton Souto da Silveira, em 2007, na sede da Secretaria Municipal de Saúde. Silveira trabalhava no setor de Gestão Plena, responsável pelo pagamento das prestadoras de serviços terceirizados à prefeitura de Salvador.

Com base nessas informações, há duas semanas, o Conselho Nacional de Saúde solicitou ao Ministério da Saúde o cancelamento dos repasses do SUS ao GDF até o final das investigações sobre o contrato de terceirização do Hospital de Santa Maria. O CNS levou em conta as informações levantadas, em agosto, pelo Departamento Nacional de Auditoria do SUS (Denasus), do ministério. A auditoria revelou que recursos repassados pelo governo federal eram usados em aplicações financeiras no Banco de Brasília (BRB), estatal e controlado por Arruda. Outras informações foram levantadas pelo Sindicato dos Médicos (Sindmédico) do DF, responsável por uma pesquisa do Instituto Vox Populi, de junho, que aponta a reprovação de mais de 80% do sistema de saúde local pela população.

Segundo o Denasus, o GDF recebeu, em 2008, 378 milhões de reais da União para investir em programas de Saúde. Mas, em março, 238 milhões de reais desse montante estavam aplicados em Certificados de Depósitos Bancários (CDBs) no BRB. Por uma razão jamais devidamente esclarecida, o secretário Augusto Carvalho, bancário de origem, aplicou recursos públicos federais em troca de rendimentos. Procurado por CartaCapital, Carvalho não foi encontrado, por três dias, pela assessoria de imprensa da secretaria para esclarecer as denúncias.

No Ministério Público Distrital e no Conselho Nacional de Saúde há desconfiança na política de privatização da saúde no DF. “Vários desses processos de terceirização demonstram ter sido montados para formar caixa 2 de campanha de grupos políticos”, diz Francisco Batista Júnior, presidente do CNS. Ele espera, constatadas as irregularidades, que o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, nomeie interventor federal para gerir recursos no DF. O ministro tem 30 dias para decidir se acata a resolução do CNS.

A inspiração terceirizante de José Roberto Arruda veio de uma doutrina do governador José Serra (PSDB), de São Paulo, transformada em lei estadual em 4 de setembro, de modo a reservar 25% do atendimento nos hospitais a convênios e consultas da rede privada. Esses espaços, assim como no caso do Hospital de Santa Maria, serão administrados pelas Organizações Sociais (OSs), como a Real Sociedade Espanhola de Beneficência. “Só querem dar a essas organizações o filé dos serviços, os mais rentáveis, como as UTIs”, avisa o promotor Jairo Bisol, do Ministério Público do DF.

Para essas organizações sociais, trata-se de um ótimo negócio, porque o poder público entra com toda a infraestrutura física e de pessoal. As OSs administram e recebem os recursos dos contratos. Para o Distrito Federal, em 2009, o governo federal destinou à Secretaria de Saúde 2,1 bilhões de reais. Até 14 de setembro, segundo o site “Contas Abertas”, com informações do sistema de controle de gastos da administração federal, o Siafi, foram pagos 1,5 bilhão de reais. Além disso, a Secretaria de Saúde tem orçamento próprio de 1,7 bilhão de reais para 2009. Isso gerou recursos, para o ano corrente, de 3,8 bilhões de reais. A dúvida é saber onde esse dinheiro será aplicado, se no sistema de saúde ou em CDBs do Banco de Brasília.

Leandro Fortes é jornalista, professor e escritor, autor dos livros Jornalismo Investigativo, Cayman: o dossiê do medo e Fragmentos da Grande Guerra, entre outros.
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Original em Carta Capital

O Brasil e a crise política em Honduras

Carol Proner (*)

A atual crise vivida por Honduras constitui um caso importante a ser estudado pelo direito internacional do nosso país. Primeiro porque se trata de um conflito que repercute mundialmente e que implica de modo amplo a América Latina e particular o Brasil. Também porque a análise requer a ponderação de diversos aspectos que incluem a legalidade do governo hondurenho e a aplicação de medidas e normas por uma autoridade que não é reconhecida internacionalmente como legítima e, ao mesmo tempo, um amplo espectro geopolítico que vem determinando as ações adotadas por outros países.

O Brasil atualmente está no centro da crise por haver recebido José Manuel Zelaya Rosales em sua Embaixada na condição de convidado por ser o presidente legítimo de Honduras. Zelaya não foi recebido na condição de asilado político, mas de Presidente legítimo. Essa condição de autoridade constitucional já havia sido confirmada por outros 192 países nas Nações Unidas que, por unanimidade, votaram uma resolução de repúdio ao Golpe de Estado exigindo a restauração imediata e incondicional do Presidente Zelaya. No âmbito interamericano a decisão unânime foi no sentido da suspensão de Honduras da Organização dos Estados Americanos com base na ruptura da ordem democrática e no fracasso de iniciativas diplomáticas (Carta Democrática Interamericana).

Outros Estados também adotaram medidas concretas como forma de pressionar o governo golpista a restabelecer a legitimidade. A Comissão Européia anunciou o congelamento de um fundo de ajuda orçamentária ao governo de Honduras e, após haver chamado para consultas todos os embaixadores de seus países-membros com representatividade no país, ratificou a suspensão das negociações de um acordo comercial com os países da América Central até que o presidente deposto retorne ao poder. França, Espanha e Itália tomaram medidas de repúdio ao golpe e o embaixador da Alemanha deixou o país.

A Espanha comunicou a expulsão do embaixador hondurenho em Madri depois de sua destituição pelo presidente Zelaya e destacando ser um ato de coerência com o compromisso da comunidade internacional de manter a interlocução oficial com o governo constitucional de Honduras.

O Departamento de Estado norte-americano, embora pressionado por setores ultraconservadores, anunciou a suspensão da concessão de vistos não emergenciais a cidadãos hondurenhos e planejam cortar mais US$ 25 milhões em assistência caso Zelaya não seja restituído à Presidência.

O caso de Honduras já seria interessante pelo ineditismo de canalizar o amplo repúdio da comunidade internacional a golpes militares e a interrupções bruscas e ditatoriais da normalidade democrática. Mas outros elementos o fazem especialmente chamativo, como o posicionamento do Departamento de Estado norte-americano até o momento e a expectativa pelos gestos futuros, a mudança de postura da OEA que também responde a uma renovação trazida pelo governo de Obama e a coordenação latino-americana em torno de causas comuns.

O Brasil vive um momento de respeitabilidade internacional sem precedentes e que tem contribuído para sedimentar novos consensos junto a organismos internacionais, mas diante da imprevisibilidade com que atuam os golpistas, a gestão da crise dependerá fundamentalmente da perícia diplomática brasileira e do cuidado técnico em não contribuir para o aprofundamento da violência militar. Não há razões para suspeitar que o Itamaraty seja incapaz de enfrentar o ineditismo desse desafio, apesar da resposta covarde dos golpistas e dos saudosistas de regimes militares. Estes não apenas em Honduras.

(*) Carol Proner é doutora em Direito, Professora de Direito Internacional da UniBrasil e Pesquisadora da l'École des hautes études en sciences sociales em Paris, Professora do Programa de Direitos Humanos e Desenvolvimento da Universidade Pablo de Olavide, Sevilha. carolproner@uol.com.br.

Original em Carta Maior

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O que disse 'o político mais popular da Terra', na Newsweek?

A mídia brasileira deu grande repercussão à reportagem da revista americana Newsweek sobre o presidente Lula, sob o título O político mais popular da Terra. O Google Notícias, na noite desta quarta-feira (23), indicava 540 conteúdos sobre o tema. Mas por que ninguém mostrou o longo duelo que foi a entrevista de Lula à Newsweek? Veja aqui a entrevista e tire suas conclusões.

A revista, que publicou a entrevista no seu site, desmancha-se em elogios ao "espetacular trabalho" do presidente do Brasil. Não faltam as referências de costume ao pobre menino nordestino que até os sete anos não sabia o que era um pão. O título é tirado da hoje famosa tirada do presidente Barack Obama numa reunião do G20 em abril, em que o chefe da Casa Branca chamou Lula de "o cara". O "gancho" foi a presença do governante brasileiro em Nova York, onde ele abriu a Assembléia Geral da ONU.

Porém a revista, que serviu de modelo para Victor Civita criar a Veja no Brasil, não está mudando de "lado", para usar uma expressão cara a Lula. Basta ler a entrevista, a cargo do premiado jornalista Mac Margolis, correpondente da Newsweek no Rio de Janeiro, escalado para espremer "o cara" com perguntas espinhosas, em busca de respostas de cedência ou pelo menos de contemporização.
Lula foi inquirido sobre os méritos do mercado na crise econômica, as excelências das privatizações do governo Fernando Henrique, o "controle estatal" sobre o pré-sal, os compromissos do Brasil na cúpula climática em Copenhague e, no fim, claro, o "estridente" presidente venezuelano Hugo Chávez, acusado de inimigo da democracia ligado a gangs de vândalos. Veja a íntegra da entrevista publicada. Julgue as perguntas. E confira como foi que Lula se saiu.
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Newsweek: Quando o senhor tomou posse, o Brasil era enxergado como uma promessa não realizada, e a última das nações do Bric. Agora o Brasil é considerado uma estrela entre os mercados emergentes. O que aconteceu?
Luiz Inácio Lula da Silva: Ninguém respeita ninguém que não respeita a si mesmo. E o Brasil sempre se comportou como um país de segunda classe. Nós sempre dissemos a nós mesmos que éramos o país do futuro e o celeiro do mundo. Mas nós nunca transformamos essas qualidades em algo concreto. Em um mundo globalizado você não pode ficar parado. Tem que pegar a estrada e vender o seu país.
Então nós decidimos fazer do fortalecimento do Mercosul (o bloco comercial sul-americano) uma prioridade, e aprofundamos nossas relações com a América Latina em geral. Priorizamos o comércio com a África e entramos agressivamente no Oriente Médio. Hoje nossa balança comercial é altamente diversificada. Isso nos ajudou a amortecer o impacto da crise econômica. Sofremos bem menos que todos esses países que concentraram todo o seu comércio em um ou outro bloco econômico. Tudo isso criou um laço entre o Brasil e outros países e hoje estamos em pé de iigualdade nas relações internacionais. Ao mesmo tempo eu acredito que as nações desenvolvidas começaram a entender que a situação mundial era tão séria que elas não seriam capazes de resolver todos os problemas sozinhas. O Brasil foi convidado pela primeira vez para o G8 (o grupo dos países ricos) em 2003. Agora estas são relações instituídas. Estamos pedindo uma reforma do Conselho de Segurança da ONU. Isto nós ainda não conseguimos, mas vamos conseguir.
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Newsweek: O sucesso do Brasil em pilotar a crise econômica mudou o enfoque dos investidores?
Lula: Eu vou lhe dar um exemplo. No início da crise, as matrizes da indústria automobilística mandaram todo mundo reduzir a produção, reduzir os estoques e remeter recursos. Mais tarde eles chamaram os brasileiros para que explicassem que milagre eles haviam realizado, ao recuperar tão depressa os seus mercados. Não houve milagre. Tínhamos um mercado interno forte. Tínhamos consumidores que queriam comprar carros. Reduzimos parte dos impostos sobre as vendas e pedimos Para as empresas que oferecessem crédito em condições favoráveis. O resultado é que estamos batendo recorde atrás de recorde em vendas de carros no Brasil. O mesmo acontece com geladeiras, fogões, máquinas de lavar, e com computadores e a construção de moradia. Se todos os países tivessem feito isso tão rápido como o Brasil e a China fizeram, certamente o mundo poderia emergir da crise mais depressa. Já estamos começando a ver sinais de recuperação. Se eu lhe disser que este ano vamos gerar um milhão de empregos você provavelmente não vai acreditar. Mas espere só os números em dezembro sobre quantos empregos vamos criar no setor formal.
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Newsweek: Quais são as lições para outros países?
Lula: A grande lição para todos é que o Estado tem um importante papel a jogar, e tem grande responsabilidade. Não queremos o Estado para gerir negócios. Mas ele pode ser um indutor do crescimento e pode trabalhar em harmonia com a sociedade. No Brasil, graças a Deus, temos um sistema financeiro sólido e bancos públicos com um importante papel na oferta de crédito. Estes foram os bancos que garantiram que a crise não fosse tão ruim quanto foi em outros países.
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Newsweek:Não foi também porque o mercado brasileiro era forte?
Lula: Foi um mérito do trabalho duro, por parte do setor privado e do governo. Eu não aceito a ideia de que quando as coisas vão bem o mérito vai para o setor privado e quando as coisas vão mal a culpa é do governo. Ninguém neste país teve um papel mais ativo que eu tive em vender produtos prasileiros. Ninguém impulsionou as empresas brasileiras mais do que eu impulsionei. É assim que construimos uma grande nação.
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Newsweek: O senhor frequentemente critica o processo de privatização. Porém graças à venda das empresas estatais até os brasileiros mais pobres têm celulares, e as ex-estatais como a Vale se tornaram vencedoras sob propriedade privada.
Lula: Mas o Estado poderia ter feito a mesma coisa.
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Newsweek: Só que não fez.
Lula: Não fez porque a elite brasileira usava as empresas públicas para seus próprios fins. Quando você faz assim, qualquer companhia quebra, em qualquer lugar do mundo. Eu penso que as privatizações foram um erro. Antes de eu tomar posse, a Petrobras estava investindo R$ 250 milhões (US$ 139 milhões) em prospecção. Hoje estamos investindo cerca de US$ 560 bilhões. A descoberta de petróleo na camada do pré-sal , nas águas profundas do oceano, não foi um golpe de sorte. Foi o resultado de investimento. Só foi preciso investir corretamente. Mas eu não sou de ficar remoendo o passado. Você nunca vai me ouvir falar em reestatizar uma empresa. O que está feito está feito e vamos seguir adiante.
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Newsweek: O Brasil consegue manter seu compromisso com uma energia limpa, com todos os pesados investimentos necessários para extrair o petróleo do pré-sal?
Lula: Iremos usar o dinheiro do petróleo para ajudar a explorar energia limpa. As duas (a petrolífera e a renovável) não são incompatíveis. O Brasil é um dos poucos países com um enorme potencial de energia limpa, renovável. A Petrobras no ano passado criou uma empresa de biodiesel. Estamos trabalhando no desenvolvimento de plataformas hidreléticas que irão simplesmente usar o fluxo do rio para gerar energia. Os trabalhadores irão de helicóptero para a estação geradora, como vão para uma plataforma petrolífera no mar. As plataformas serão rodeadas pela floresta, para reduzir o impacto ambiental. O Brasil tem a responsabilidade de mostrar ao mundo que é cada vez mais viável usar uma energia que não polui o mundo. Nossa matriz energética vai se tornar firmemente mais limpa.
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Newsweek: O Brasil concorda com reduções na emissão de gases do efeito estufa na próxima rodada da mudança climática, em Copenhague?
Lula: Queremos construir com outros países uma proposta que seja compatível com a capacidade de cada um, encontrar compromissos apropriados a cada país. O Brasil apoiará a criação de um fundo para estimular o sequestro de carbono pelas nações mais pobres, mas o Brasil também vai querer que o mundo rico reduza suas emissões de gases do feito estufa. Precisamos medir as emissões históricas de cada nação, para que cada um de nós pague de acordo com sua própria responsabilidade.
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Newsweek: Mas o Brasil vai se comprometer com metas de redução?
Lula: O Brasil vai se comprometer a alcançar um amplo acordo, e se esse acordo contiver metas de emissão o Brasil deseja cumprir. Mas quer ver se as outras nações vão também encontrar as suas metas de redução.
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Newsweek: Por que o senhor deseja aumentar o controle estatal na indústria petrolífera, quando o atual sistema de concessões ao setor privado está funcionando?
Lula: Este novo modelo de partilha de produção que estamos propondo ao Congresso é o sistema dominante no mundo de hoje. A única razão para manter o sistema de concessões, que é um tipo de contrato de risco, é quando um país não tem certeza de que vai se achar petróleo e quer partilhar o risco (da prospecção). Mas quando sabemos que o petróleo está ali, e esse óleo é um recurso estatal, por que iríamos entregar concessões (às empresas estrangeiras)? Mas pode apostar que as maiores empresas petrolíferas do mundo vão se interessar em investir nos projetos do pré-sal no Brasil, sob estas novas normas.
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Newsweek: O bloco comercial do Mercosul, que o Brasil lidera, só admite como membros democracias plenas, que respeitem os desejos humanos. A Venezuela está qualificada?
Lula: Dê-me um exemplo em que a Venezuela seja antidemocrática.
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Newsweek: Trinta e quatro estações de rádio fechadas pelo governo em um fim de semana. Repressão a sindicatos independentes e perseguição do governo a rivais políticos. Gangs ligadas ao governo de Hugo Chávez vandalizando a única rede de TV independente.
Lula: Esta não é a versão do governo.
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Newsweek: Existe alguma dúvida?
Lula:Vamos ser francos sobre uma questão. Primeiro, cada país estabelece o regime democrático que convém a seu povo. Isto é uma decisão soberana de qualquer nação. Eu nunca questionei o fato de que, num sistema parlamentarista, o primeiro ministro pode ficar no poder por 15 ou 18 anos. Agora [Álvaro] Uribe está apoiando [uma emenda constitucional para permitir] um terceiro mandato. Eu não ouvi ninguém criticar a Colômbia por isso.
Por que eu não quero um terceiro mandato? Porque o que vale para mim vale para meus opositores. Se agora eu quero três mandatos, amanhã eles vão querer quatro. Por isso eu digo que você não pode brincar com a democracia. Dois mandatos e oito anos é um tempo razoável para se governar um país. E vamos ser honestos: a elite venezuelana não era exatamente um jardim de flores. Lembre que Chávez foi vítima de um golpe. Você não pode esperar que ele esqueça disso tão cedo. Eles sequestraram o homem exatamente como sequestraram [o presidente hondurenho, Manuel] Zelaya. Não podemos deixar que isso continue a acontecer na América Latina. Chávez terá de se submeter às regras do Mercosul. O Mercosul tem normas definidas.
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Newsweek: Sim, mas as normas do Mercosul dizem que para um país ingressar no mercado comum precisa respeitar as regras da democracia e dos direitos humanos.
Lula: Chávez foi testado em quatro eleições nos dez últimos anos, e o povo venezuelano está aprendendo. Nós somos um continente colonizado. A maioria dos países da região passaram o século 20 na pobreza. O petróleo da Venezuela enriqueceu meia dúzia de pessoas enquanto o resto do povo continuava pobre. Esta é a primeira vez que este [dinheiro do] petróleo está sendo usado para aumentar a participação do povo. Se está certo ou errado, o povo venezuelano vai julgar.
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Newsweek: A democracia é só eleições?
Lula: Eleições são um grande indicativo de democracia. A democracia na prática significa instituições que funcionam devidamente, e estou trabalhando para defender a democracia brasileira. Cada país tem de construir a democracia que quer. Eu não tenho dúvida de que os latino-americanos estão em um dos mais ricos momentos da gestão democrática em nossa história.
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Newsweek: Com o Brasil assumindo um maior papel internacional, muita gente se pergunta por que o país permanece tão silencioso em relação a países cujos regimes não são democráticos...
Lula: Se oilharmos para os direitos humanos literalmente, então todas as nações cometem erros, inclusive os Estados Unidos. Onde estão os direitos humanos em Guantânamo? Todos os países têm problemas. Só a paz e a democracia serão capazes de garantir o crescimento econômico necessário a uma vida melhor para a maioria.
De vez em quando as pessoas me perguntam: Lula, você é o líder da América Latina? Eu digo que não. Ninguém me escolheu para ser líder. Mas estou absolutamente convencido de que as relações do Brasil com a América Latina nunca foram tão claras, transparentes e honestas como hoje. Quando o Paraguai fica nervoso com o Brasil, eu tenho que compreender o Paraguai. Não posso ser agressivo se o Paraguai grita comigo. O Brasil tem muito mais poder e recursos. É como a relação entre pai e filho. Um pai não bate no seu filho toda vez que o menino grita. Ele tenta argumentar. É assim que os países grandes devem agir.
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Fonte: Newsweek
Publicado em Vermelho

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