A CPI não seria necessária, mas pior do que fazer a CPI é ficar uma nuvem pairando em cima do governo como se o governo tivesse algo a esconder. O governo não ficará refém da oposição”, afirmou o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), logo após protocolar um requerimento com a assinatura de 31 senadores para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para averiguar possíveis desvirtuamentos na utilização de recursos destinados a cobrir gastos de servidores públicos, pagos por meio das contas bancárias denominadas tipo “B” ou cartões de crédito.
Mais do que uma ducha de água fria, a atitude de Jucá deixou a oposição atônita, perdida e sem bandeira. Não é nenhum exagero afirmar que alguns conhecidos caçadores de holofotes passaram o carnaval inteiro treinando o que iriam dizer no retorno dos trabalhos do Congresso. A mídia já havia montado o seu carnaval. Era necessário ocupar lugar de destaque.
TINTAS
Porém, a CPI foi um estouro no galinheiro. Não que fosse necessária, pois a Controladoria Geral da União (CGU) já havia esclarecido o que representavam os gastos do cartão. No mesmo sentido, o governo já havia anunciado medidas para limitar o seu uso, principalmente para saques. Isso não era suficiente para a oposição e a mídia, pois nem a oposição e muito menos a mídia queriam melhorar alguma coisa. O que importava era a balbúrdia.
Os cartões corporativos foram criados no governo Fernando Henrique para substituir as chamadas “caixinhas” ou contas “tipo B” utilizadas pelos órgãos públicos para suprir gastos emergenciais. Como mostra o levantamento da CGU, o governo Lula vem aumentando o gasto no cartão e diminuindo o das contas bancárias, exatamente para aumentar o controle sobre esses gastos. Isso foi efetivo e a despesa total (a somatória da conta bancária com o cartão) foi reduzida significativamente no governo Lula em relação ao governo anterior.
A Controladoria revelou que enquanto em 2001 e 2002 os gastos totais foram de R$ 213,6 milhões e R$ 233,2 milhões respectivamente, a partir de 2003 foram reduzidos para R$ 143,5 milhões em média. Em 2007, segundo a CGU, o gasto do governo com o cartão corporativo representou entre 0,002% e 0,004% das despesas totais do Poder Executivo. “O cartão é um instrumento mais moderno, que permite melhor controle do que o velho talonário de cheques”, disse o secretário executivo da CGU, Luiz Navarro, acrescentando que “o aumento das despesas pagas com o uso do cartão nos últimos anos acontece, na grande maioria dos casos, simultaneamente a uma redução no volume de pagamentos feitos pelo sistema antigo (tipo B) e corresponde à gradativa migração de um sistema para o outro”.
Entretanto, mesmo depois de todos os is estarem com seus pingos, tintas e mais tintas foram gastas para bater na tapioca de oito reais e cinqüenta centavos do ministro Orlando Silva ou nos setenta reais gastos pelo ministro da Pesca, Altemir Gregolin, no “Pingüim”, em Ribeirão Preto (SP), que não é só choperia como tanto foi martelado, mas um bom e agradável restaurante.
Da tapioca pularam para os gastos sigilosos dos servidores que fazem a segurança dos filhos do presidente. Foi o sinal para os candidatos a líderes da oposição disputarem os microfones para denunciar que a CPI sairia “de qualquer jeito”, nem que tivessem que “recorrer ao STF”. Enquanto Onyx Lorenzoni (Dem-RS), por um lado, corria para anunciar que iria recolher assinaturas na Câmara, Antônio Carlos Pannunzio (PSDB-SP), por outro, fazia o mesmo. No Senado, Demóstenes Torres (Dem-GO) reclamava o título de recolhedor oficial de assinaturas, já que os demais se atrasaram, e Eduardo Suplicy (PT-SP) já declarava apoiar a CPI (um filme nada novo). Porém, envolvidos nas disputas, nem perceberam que Romero Jucá já tinha as assinaturas necessárias. Às 18:05 h a novela estava parcialmente encerrada.
Pior ainda para a oposição: a CPI protocolada por Jucá pede apurações em “eventuais irregularidades na utilização de suprimento de fundos por meio de adiantamentos, de contas bancárias destinadas à sua movimentação e dos denominados cartões de pagamento [corporativos] no período de janeiro de 1998 até a presente data”. E agora? Como explicar que os gastos foram muito maiores no governo anterior? E naquela época a mídia sequer olhava para qualquer prestação de contas do governo. Mas agora alguém vai olhar.
Restou ao senador e líder do PSDB, Arthur Virgílio, reclamar da CPI dizendo que era uma farsa. Em nota, ele disse que “o PSDB quer investigação completa, quer saber os gastos de todos os Ministérios, autarquias ou qualquer outra titularidade” para “compará-los com os do mercado e saber da necessidade e legitimidade das aquisições”. Nem bem a súplica de Virgílio foi lançada e o jornalista Paulo Henrique Amorim a atendeu, publicando os gastos do governo de São Paulo com os “famosos” cartões corporativos, um ótimo parâmetro, não do mercado, mas de um governo do PSDB, para as comparações do senador.
GUICHÊ
Como mostrou Amorim, “o gasto total com cartões corporativos no Estado de São Paulo em 2007 chegou a R$ 108 milhões”. Aumentaram 5,82% em 2007 em relação a 2006, ano em que já havia crescido 22,93% em relação ao anterior. Mais ainda: 44,58% dos gastos com o cartão em São Paulo são saques diretos no caixa, ou seja, dinheiro sacado no guichê ou no caixa eletrônico, sem nenhum controle do seu uso.
Já o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), homem de estilo enfático, reclamou que a CPI “queria abarcar o mundo com as pernas”, coisa a que ele tem o maior horror, pois, “não chega a lugar nenhum”.
Sem se abalar com as reclamações, Jucá encerrou o assunto tranqüilizando a todos. “Percebemos que a CPI seria uma disputa, um Carnaval político. A oposição dizia que se não houvesse CPI mista, haveria no Senado. Estamos apenas antecipando o pedido”, disse o líder.
ALESSANDRO RODRIGUES
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