Além do Cidadão Kane

terça-feira, 25 de março de 2008

Cuba

Espanta-me terem colocado como primeira pergunta no debate da televisão CNN em inglês, no primeiro debate eleitoral logo após a renúncia de Fidel, o que fariam os dois candidatos do Partido Democrata para “ajudarem” Cuba a entrar na democracia.
Valha-me-Deus-minha-Nossa-Senhora, e quem disse que Cuba precisa de ajuda? Principalmente vinda desses aí. E quem são eles para dizerem que não existe democracia em Cuba? A Ilha, com I maiúsculo, vai muito bem, obrigada. E afirmo isso porque sou cubana de alma – e quando sobra grana, de corpo também – e tenho autoridade pra falar do país como se fizesse parte dele. Eu o defendo como se fosse meu país. Ou melhor, como se fosse meu pai e mãe, o que é mais garantido.
Em Cuba, a democracia começa pelos cargos políticos que são a título de colaboração. Fidel Castro ganha um salário inferior a 30 dólares por mês, bem diferente do que publicou a revistinha Forbes, em 2006, apontando o Comandante como o homem mais rico do mundo.
E saber que a grande mídia em massa por aí tem coragem de publicar manchetes asquerosas no dia da renúncia de Fidel. “Cuba vai ser livre?” “Cuba finalmente será capitalista?” Ilude-se quem pensa que Cuba será capitalista, parafraseando o companheiro Frei Betto em entrevista ao Estadão. Cuba não só não será jamais capitalista, como não vai mudar. Ela não precisa de mudanças.
E o que é a porcaria do capitalismo, afinal? Por que os Estados Unidos, em vez de criticarem tanto Cuba, não tratam de tomar conta do seu próprio país?
Porque Cuba continua firmemente atacando o império, mas não parou no tempo por isso. A Ilha possui uma das melhores medicinas do mundo e, quero aqui ressaltar, é gratuita. E Cuba também tem um dos melhores ensinos do mundo e, quero aqui ressaltar, é gratuito. Porque Cuba tem seguramente os melhores cantores do mundo e, quero ressaltar aqui, não são vistos em clínicas médicas se recuperando por vício em drogas, porque lá isso aí é utopia. Estou falando de um país que não chega a centésima parte do tamanho do imperiozinho. Estou falando de um país que tem menos de 10, dos quase 300 milhões de mão-de-obra dos EUA e que ainda sim possui, proporcionalmente, um melhor país contruído.
Estou falando de Cuba, onde as mulheres, mesmo sem maquiagem, são lindas. E onde os homens descem dos ônibus nas paradas para darem às mãos e ajudarem os mais velhos a desembarcar.
E os EUA, afinal, investem no quê? Tecnologia? Criticam tanto que a informática cubana é inexistente, mas estive lá e eles têm um tal de... não sei se americano já ouviu falar, software livre. Livre, de liberdade, freedom, se é que tem algum americano aí que não me entende. E isso é normal, porque os americanoss não se dão ao trabalho de compreender o português.
Ah, claro, não posso ser hipócrita e esquecer de mencionar que os EUA investem em GPS para carros de aluguel e em máquinas de vender doces e caixas automáticos, porque, afinal, isso é imprescindível. Lá, tecnologia e overdose são mais importantes que cuidar da saúde, da educação, da cultura. É preferível ter um CD da Britney Spears a ter um clássico do Compay Segundo.
É, os EUA são muito bons em substituir pessoas por máquinas. Em transformar tudo num grande fast food, onde se entra, faz o pedido em inglês, mesmo se tratando de um país que fale outra língua. E, mesmo pagando – e caro –, as pessoas são obrigadas a limpar a mesa porque, se o estabelecimento for contratar funcionário pra fazer a limpeza, fica mais caro. E no final a gente sai de lá sem saber realmente o que comeu e com um buraco no estômago e na conta bancária.
A verdade é que os Estados Unidos e o mundo têm inveja de Cuba. Porque lá o presidente não faz discurso de terno e gravata e fala com o coração e não com a mão no bolso. Porque em Cuba o governo quer salvar o mundo e não ajudar a matá-lo. Porque em Cuba não importa de que diabo de partido você é. Porque em Cuba político vai por amor à pátria e não por um alto salário. Porque em Cuba Deus é um só, mesmo que o país seja possuidor de inúmeras religiões. Porque Cuba tem a salsa e o daiquiri e os Estados Unidos só têm a sua medíocre vaidade capitalista.


Silvia Valim é jornalista.

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Um comentário:

Anônimo disse...

Vi essa mesma reportagem na Caros Amigos, só que era mais longo.
Muito bom mesmo.
Tá de parabéns a jornalista.
Abraço
Pedro

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