Além do Cidadão Kane

sexta-feira, 25 de julho de 2008

MST denuncia Justiça por segredo de Estado no processo do RS

Na coletiva à imprensa, realizada nesta quinta-feira (24), em São Paulo, o advogado do MST, Aton Fon Filho, denunciou que o processo, movido por procuradores do Ministério Público gaúcho e baseado na Lei de Segurança Nacional, contra oito militantes do movimento não pode ser amplamente divulgado em função da determinação de que ele corra em segredo de Estado. Ele disse que recorrerá ao TRF-4 (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região no Rio Grande do Sul para obter a quebra de segredo.

Por Carla Santos*
Ocupações ao Incra de BH, SP e Rio nesta quinta.
''Queremos que a sociedade possa ter acesso ao conteúdo do processo. Há inúmeras questões que poderão ser esclarecidas sobre a tentativa de extinguir o movimento e criminalizá-lo se pudermos trazer à luz os depoimentos nele contidos. Não se faz justiça às portas fechadas'', disse.
No dia 3/12/07 o Conselho Superior do Ministério Público aprovou o relatório, elaborado pelo promotor Gilberto Thums (processo nº 16315-09-00/07-9), que concluiu no “ (...) sentido de designar uma equipe de Promotores de Justiça para promover ação civil pública com vistas à dissolução do MST e declaração de sua ilegalidade (...)”.
Como não bastasse a tentativa de declarar o MST ilegal, o Ministério Público (MP) ainda decidiu “(...) pela intervenção nas escolas do MST a fim de tomar todas as medidas que serão necessárias para a readequação à legalidade, tanto no aspecto pedagógico quanto na estrutura de influência externa do MST.”
Diante da condenação da sociedade ao relatório, que ofende o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, especialmente o artigo 22, nº 1, reconhecido pelo Governo brasileiro através do Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992, o MP recuou, mas seguem as oito ações civis contra os sem-terra de Carazinho (RS). A primeira audiência está marcada para 29 de julho.
''É uma ação que, estando voltada contra oito [sem-terra], na verdade atinge todo o MST porque os crimes [previstos na Lei de Segurança Nacional] são crimes por participar de organização que visa a derrubada do regime de direito vigente. Desse modo, se um único deles for condenado, significa que esse único participa de uma organização que se volta para derrubar o regime de direito vigente. Que organização é essa? O MST'', disse Fon Filho.
Justiça ideológica
“Essa causa não é do MST, mas de todo o povo brasileiro. O Ministério Público não pode se deixar guiar por ideologias. As pessoas acham que só a esquerda tem ideologias, mas também há uma ideologia da direita, capitalista. O MP tem que seguir os princípios éticos fundamentais, que estão na Constituição Brasileira”, defendeu Fábio Konder Comparato, jurista e professor aposentado da Faculdade de Direito da USP, presente à coletiva.
Para ele, a ofensiva do MP-RS simboliza o “delírio” contra os trabalhadores sem-terra. ''Mas não o delírio do descontrole, mas sim da cega defesa da indústria do papel no RS'' . Ele leu para os jornalistas presentes a Lei de Segurança Nacional (LSN), classificada de entulho da ditadura militar, e defendeu que, em nenhum aspecto, o MST a fere.
''Esta Lei prevê que é crime os que lesam a integridade territorial e a soberania nacional. Por acaso a integridade territorial do país está sendo ameaçada pelo MST? Todos os dias 12 quilômetros de terras brasileiras - cerca de 31 milhões de hectares - são destinados à estrangeiros. Cerca de 14% dos territórios da Amazônia - ou a soma dos territórios de SP, do RJ e do RS - são de proprietários desconhecidos, são pessoas jurídicas das quais nem se imagina a nacionalidade. Não creio que seja o MST a ameaça a integridade do território nacional.'', argumentou o jurista.
Comparato defendeu que o país precisa perceber que a defesa da Constituição inclui a luta por uma sociedade livre, justa e igualitária. ''O segredo de Estado não é admitido pela LSN. Ele existe para não expor a intimidade dos envolvidos. O processo em questão não expõe a intimidade de ninguém. A governadora Yeda Crusius (PSDB) pode ficar tranqüila. O problema é essa distorção ideológica do MP'', alfinetou.
O 'crime' da luta pela reforma agrária
“Quem acompanha a história do MST nesses 24 anos percebe o processo de perseguição política às famílias sem-terra. Esse processo também tem uma face jurídica e desta vez veio de forma orquestrada, pelo Ministério Público”, denuncia Andressa Caldas, da Justiça Global. Junto com a Terra de Direitos e outras 11 entidades, foram protocoladas denúncias junto à ONU (Organização das Nações Unidas) e OEA (Organização dos Estados Americanos).
“A tentativa de criminalização do MST é uma forma de esconder as verdadeiras contradições da realidade, fruto das desigualdades sociais. Nós vamos continuar nos mobilizando em defesa do povo brasileiro e pela Reforma Agrária. O papel da Justiça é defender o povo, defender o direito ao trabalho, o direito à terra. Queremos ter garantido nosso direito de produzir alimentos saudáveis para abastecer a população brasileira”, afirma José Batista de Oliveira, da coordenação nacional do MST.
O papel da mídia na criminalização dos movimentos socias também foi destacado durante a coletiva. ''No caso da greve dos Correios vi uma pressão da mídia para que os trabalhadores 'aprendessem' a fazer greve sem parar de trabalhar, um absurdo'', registrou José Batista. ''Estou insatisfeito com o papel de alguns grandes veículos de comunicação que dificilmente registram a situação da criminalização dos movimentos socias e do MST'', agregou Comparato.
Nesta semana, o Movimento está mobilizado em 11 estados, para exigir o assentamento de 140 mil famílias acampadas, além de um programa de agroindústria para os assentados. O MST denuncia a lentidão no processo de reforma agrária e condena a criminalização das lutas populares, em especial no Rio Grande do Sul e no Pará.

Original em Vermelho


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