Além do Cidadão Kane

domingo, 22 de novembro de 2009

Gaza, campo de extermínio lento

Por Thabet El Masri
entrevistado por Sílvia Cattori (*)

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O Dr. Thabet El Masri é diretor da unidade de Cuidados Intensivos do Hospital Shifa, um hospital público da faixa de Gaza. Em 12 de Outubro último concedeu uma entrevista a Silvia Cattori acerca do aumento do número de bebes nascidos com malformações. Este fenômeno deve ser relacionado com as bombas de fósforo e as munições com urânio empobrecido (depleted uranium) lançadas em Janeiro de 2009 pelo exército e a força aérea nazi-sionistas.

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Silvia Cattori: Em Junho passado, começou a ficar preocupado com o aumento do número de bebes nascidos com malformações. Estamos interessados em conhecer o resultado do estudo realizado sobre este inquietante fenômeno e queremos saber qual a sua avaliação médica. Pode dar-nos informação sobre o relatório de anomalias congênitas pré natais e pós natais constatadas passados dez meses dos ataques sobre Gaza, em termos de número de casos ocorridos e em comparação com os dados de 2008?

Thabet El Masri: Sim, pois eu segui, de forma contínua, o fenômeno do nascimento de bebes com malformação congênita. Registrei o número de bebes nascidos com malformações congênitas em Julho, em Agosto e em Setembro de 2009. Comparei estes dados com os números dos mesmos meses do ano de 2008. Eis os resultados: em Julho de 2009, houve no Hospital Shifa 15 casos desse tipo, contra 10 em 2008; em Agosto de 2009, houve 20 casos, contra 10 em 2008; em Setembro de 2009, 15 bebes nasceram malformados, contra 11 em 2008. O número médio de nascimentos no Hospital Shifa é cerca de 1100 por mês.

Silvia Cattori: Conhecido o relatório, causou muita emoção e inquietude. Imediatamente, muita gente atribuiu o aumento de malformações nos fetos abortados e nos recém-nascidos à utilização, pelo exército israelita, de obuses de fósforo branco. Será assim?

Thabet El Masri: Supomos que sim, mas não podemos confirmar que a utilização de armas químicas por Israel causou este aumento de malformações congênitas.

Silvia Cattori: Os bebes atingidos por malformações congênitas são todos originários de populações vivendo em campos de refugiados, populações particularmente submetidas a bombardeamentos israelitas? De que zonas são as mães?

Thabet El Masri: Os bebes portadores de malformações congênitas vêm de todo o lado da faixa de Gaza. Todavia, metade das mulheres que deram à luz bebes com malformações são originárias do campo de refugiados de Jabaliya.

Silvia Cattori: Na presente situação, que pode fazer para sossegar as mulheres grávidas que estão neste momento muito ansiosas?

Thabet El Masri: Efetivamente, nada. Não há nada que possamos fazer para garantir que os seus bebes serão normais. Como poderíamos nós impedir a presença de substâncias químicas que podem causar defeitos de nascença?

Silvia Cattori: Há em Gaza embriologistas capacitados para fazer testes genéticos?

Thabet El Masri: Infelizmente não estamos equipados para fazer testes genéticos para saber se as anomalias congênitas são devidas a fatores genéticos ou a substâncias químicas. No fim de contas, trata-se de um problema genético e as substâncias químicas podem muito bem ser responsáveis por estas mutações.

Silvia Cattori: Que é feito dos investigadores internacionais que em 2006 recolheram amostras para serem testadas em laboratórios europeus? Houve resultados?

Thabet El Masri: Esse é um grande problema! Se os fatores químicos são responsáveis, isso é muito difícil de provar. Como provar que são os produtos químicos que estão na origem das mutações? Como provar que os israelenses utilizaram substâncias proibidas?

Silvia Cattori: Compreendemos que, enquanto médico, o doutor esteja muito preocupado e que, na atual desesperada situação, tenha necessidade de uma ajuda internacional…

Thabet El Masri: Sim. Gostaria de sugerir algo que pudesse ajudar-nos, sem esgotar os nossos limitados recursos financeiros no domínio da pesquisa genética, que precisa de verbas avultadas. Dito de uma forma direta: seria extremamente útil convencer os israelenses a não voltarem a usar armas químicas como fizeram no Inverno passado.

Silvia Cattori: Que tipos de patologias tem observado nos bebes nascidos este Verão? Pode dar-nos exemplos de defeitos de nascença que constatou nesses bebes?

Thabet El Masri: Verificamos problemas do sistema nervoso central, hidrocefalia e anencefalia, e ainda outro tipo de malformações como cardiopatias congênitas e obstruções do tubo digestivo. Os problemas renais são muito freqüentes. As malformações visíveis são raras; os problemas são geralmente internos.

Está a ver que problemas temos pela frente! As mães ficam sem defesa, nós nem temos resposta para as suas inquietações. Elas sabem que estamos sós nesta situação. Só lhes resta rezar!

Silvia Cattori: Não tem contatos com o exterior?

Thabet El Masri: Não temos absolutamente nenhum contacto com o exterior.

Dei-lhe uma visão geral do problema principal. Como lhe disse, há uma probabilidade de que as substâncias químicas possam ser uma das causas da tendência de aumento de defeitos de nascença, pois estes aumentaram desde o assalto bélico de Dezembro e Janeiro passados. Contudo, esta conclusão é impossível de provar.

Silvia Cattori: Muito lhe agradecemos esta entrevista.

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(*) Jornalista suíça.

O original em inglês encontra-se em Silvia Cattori.net.

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Traduzido da versão francesa por Maria Rodrigues, da equipa TPG: Todos por gaza
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Publicado em Resistir


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