O financiamento dos dissidentes cubanos pelos Estados Unidos
SL: Wayne S. Smith, último embaixador dos Estados Unidos em Cuba, declarou que era «ilegal e imprudente mandar dinheiro aos dissidentes cubanos». Acrescentou que «ninguém deveria dar dinheiro aos dissidentes e menos ainda com o objetivo de derrubar o governo cubano». E explica: «Quando os Estados Unidos declara que seu objetivo é derrubar o governo cubano e depois afirmam que um dos meios para conseguir é proporcionar fundos aos dissidentes cubanos, estes se encontram de fato na posição de agentes pagos por uma potencia estrangeira para derrubar a seu próprio governo».
YS: Creio que se tem apresentado o financiamento da oposição pelos Estados Unidos como uma realidade, o que não é o caso. Conheço a vários membros do grupo dos 75 dissidentes presos em 2003 e duvido muito desta versão. Não tenho provas de que os 75 tenham sido presos por isso. Não creio nas provas apresentadas nos tribunais cubanos.
SL: Não creio que seja possível ignorar esta realidade.
YS: Por quê?
SL: O próprio governo dos Estados Unidos afirma que financia a oposição interna desde 1959. Basta consultar, além dos arquivos liberados, a secção 1705 da lei Torricelli de 1992, a secção 109 da lei Helms-Burton de 1996, e os dois informes da Comissão de Assistência para uma Cuba Livre de maio de 2004 e de julho de 2006. Todos estes documentos revelam que o presidente dos Estados Unidos financia a oposição interna em Cuba com o objetivo de derrubar o governo de Havana.
YS: Não sei mas…
SL: Se me permite lhe vou a citar as leis em questão. Assim, a secção 1705 da lei Torricelli estipula que «os Estados Unidos proporcionará assistência às organizações não governamentais adequadas para apoiar a indivíduos e organizações que promovam uma mudança democrática não violenta em Cuba».
A secção 109 da lei Helms-Burton também é muito clara: «O presidente (dos Estados Unidos) está autorizado a proporcionar assistência e oferecer todo tipo de apoio a indivíduos e organizações não governamentais independentes para unir os esforços com o objetivo de construir uma democracia em Cuba».
O primeiro informe da Comissão de Assistência a uma Cuba livre prevê a elaboração de um «sólido programa de apoio que favoreça a sociedade civil cubana». Entre as medidas preconizadas se destina um financiamento de 36 milhões de dólares, para «apoio da oposição democrática e para o fortalecimento da sociedade civil emergente».
O segundo informe da Comissão de Assistência a uma Cuba Livre prevê um aporte de 31 milhões de dólares para financiar, ainda mais, a oposição interna. Além disso, está previsto um financiamento de pelo menos 20 milhões de dólares anuais, com o mesmo objetivo, para os anos seguintes «até que a ditadura deixe de existir»
YS: Quem lhe disse que esse dinheiro chegou às mãos dos dissidentes?
SL: A Secção de Interesses norte-americanos o afirmou em um comunicado: «A política estadunidense, desde há muito tempo, é proporcionar assistência humanitária ao povo cubano, especificamente a famílias de presos políticos. Também permitimos que o façam as organizações privadas».
YS: Bom…
SL: Inclusive a Amnistía Internacional, que lembra a existência de 58 presos políticos em Cuba, reconhece que estes estão encarcerados «por haver recebido fundos ou materiais do governo estadunidense para realizar atividades que as autoridades consideram subversivas e prejudiciais para Cuba».
YS: Não sei se…
SL: Por outro lado, os próprios dissidentes admitem receber dinheiro dos Estados Unidos. Laura Pollán das Damas de Branco declarou: «Aceitamos a ajuda, o apoio, desde a ultra direita até a esquerda, sem condições». O opositor Vladimiro Roca também confessou que a dissidência cubana está subvencionada por Washington alegando que a ajuda financeira recebida era «total e completamente lícita». Para o dissidente René Gómez o apoio econômico por parte dos Estados Unidos «não é uma coisa que tenha que ocultar ou de que tenhamos que nos envergonhar».
Inclusive a imprensa ocidental o reconhece. A agência France Press informa que «os dissidentes, por sua parte, reivindicaram e assumiram essas ajudas econômicas». A agencia espanhola EFE refere aos «opositores pagos pelos Estados Unidos». Enquanto a agência de imprensa britânica Reuters, «o governo estadunidense proporciona abertamente um apoio financeiro federal para as atividades dos dissidentes, o que Cuba considera um ato ilegal». E poderia multiplicar os exemplos.
YS: Tudo isso é culpa do governo cubano que impede a prosperidade econômica de seus cidadãos, que impõe um racionamento à população. Há que fazer fila para conseguir produtos. Há que julgar primeiro ao governo cubano que tem levado a milhares de pessoas a aceitar a ajuda estrangeira.
SL: O problema é que os dissidentes cometem um delito que a lei cubana e todos os códigos penais do mundo condenam severamente. Ser financiado por uma potência estrangeira é um grave delito na França e no resto do mundo.
YS: Podemos admitir que o fato de financiar a uma oposição é uma prova de ingerência mas…
SL: Mas neste caso, as pessoas que você qualifica de presos políticos não são presos políticos pois cometeram um delito ao aceitar dinheiro dos Estados Unidos e a justiça cubana as condenou sobre esta base.
YS: Creio que este governo se imiscuiu muitas vezes nos assuntos internos de outros países financiando a movimentos rebeldes e à guerrilha. Interveio em Angola e…
SL: Sim, mas se tratava de ajudar aos movimentos independentistas contra o colonialismo português e o regime segregacionista da África do Sul. Quando a África do Sul invadiu a Namíbia, Cuba interveio para defender a independência desse país. Nelson Mandela agradeceu publicamente a Cuba por isso e foi a razão pela qual reservou sua primeira viaje a Havana e não a Washington ou a Paris.
YS: Mas muitos cubanos morreram por isso, longe de sua terra.
SL: Sim, mas foi por uma nobre causa, seja em Angola, no Congo ou na Namíbia. A batalha de Cuito Cuanavale em 1988 permitiu por fim ao apartheid na África do Sul. É o que disse Mandela! Não se sente orgulhosa disso?
YS: De acordo, mas no fim das contas, me desagrada mais a ingerência de meu país mais que outra coisa. O que faz falta é despenalizar a prosperidade.
SL: Incluso o fato de receber dinheiro de uma potencia estrangeira?
YS: A gente tem que ser economicamente autônoma.
SL: Se entendo bem, preconiza a privatização de certos setores da economia.
YS: Privatizar, não me agrada o termo porque tem uma conotação pejorativa, mas por em mãos privadas, sim.
Conquistas sociais em Cuba?
SL: É uma questão semântica então. Quais são, segundo você, as conquistas sociais deste país?
YS: Cada conquista tem tido um custo enorme. Todas as coisas que podem parecer positivas tem tido um custo em termos de liberdade. Meu filho recebe uma educação muito doutrinada e lhe contam uma história de Cuba que não corresponde em nada com a realidade. Preferiria uma educação menos ideológica para meu filho. Por outro lado, ninguém quer ser professor neste país porque os salários são muito baixos.
SL: De acordo, mas isso não impede que Cuba seja o país que tem o maior número de professores por habitante no mundo, com classes de 20 alunos no máximo, o que não é o caso da França, por exemplo.
YS: Sim, mas houve um custo para isso e por isso a educação e a saúde não são verdadeiras conquistas para mim.
SL: Não podemos negar algo reconhecido por todas as instituições internacionais. Com respeito à educação, a taxa de analfabetismo na América Latina é de 11,7% e de 0,2% em Cuba. A taxa de escolarização no ensino primário é de 92% na América Latina e de 100% em Cuba e para o ensino secundário de 52% e 99,7% respectivamente. São cifras do Departamento de Educação da UNESCO.
YS: De acordo, mas em 1959, ainda que Cuba vivesse em condições difíceis, a situação não era tão má. Havia uma vida intelectual florescente, um pensamento político vivo. Na realidade, a maioria dos supostos avanços atuais que se apresentam como resultados do sistema eram inerentes a nossa idiossincrasia. Esses resultados existiam antes.
SL: Não é verdade; e lhe vou citar uma fonte livre de toda suspeita: um informe do Banco Mundial. É uma citação bastante longa, mas vale a pena.
“Cuba está internacionalmente reconhecida por seus êxitos no campo da educação e da saúde, com um serviço social que supera o da maior parte dos países em vias de desenvolvimento e em certos setores comparável ao dos países desenvolvidos. Desde a Revolução cubana em 1959 e o estabelecimento de um governo comunista com partido único, o país tem criado um sistema de serviços sociais que garante o acesso universal à educação e à saúde, proporcionado pelo Estado. Este modelo tem permitido a Cuba alcançar uma alfabetização universal, erradicar certas enfermidades, acesso universal à água potável e ao saneamento público de base, uma das taxas de mortalidade infantil mais baixas da região e uma das mais longas expectativas de vida. Uma revisão dos indicadores sociais de Cuba revela uma melhora quase continua desde 1960 até 1980. Vários indícios importantes, como a expectativa de vida e a taxa de mortalidade infantil, seguiram melhorando durante a crise econômica do país nos anos 90... Na atualidade a assistência social de Cuba é uma das melhores do mundo em vias de desenvolvimento, como o documentam numerosas fontes internacionais incluindo a Organização Mundial da Saúde, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e outras agências da ONU , e do Banco Mundial. Segundo os indicadores de desenvolvimento do mundo de 2002, Cuba supera amplamente países da América Latina e do Caribe e a outros países com orçamentos semelhantes, nos mais importantes índices de educação, saúde e de saneamento público”.
Alem disso, os números o demonstram. Em 1959, a taxa de mortalidade infantil era de 60 por mil. En 2009 era de 4,8. Trata-se da taxa más baixa do continente americano do Terceiro Mundo; inclusive mais baixa que a dos Estados Unidos.
YS: Bom, mas…
SL: A expectativa de vida era de 58 anos antes da Revolução. Agora é de quase 80 anos e é similar a de muitos países desenvolvidos. Cuba tem agora 67.000 médicos frente aos 6.000 de 1959. Segundo o diário inglês The Guardian, Cuba tem duas vezes mais médicos que a Inglaterra para uma população quatro vezes menor.
YS: De acordo, mas em termos de liberdade de expressão houve uma redução em relação ao governo de Batista. O regime era uma ditadura, mas havia uma liberdade de imprensa plural e aberta, programas de radio de todas as tendências políticas.
SL: Não é verdade. A censura da imprensa também existia. Entre dezembro de 1956 e janeiro de 1959, durante a guerra contra o regime de Batista, a censura se impôs 630 dias sobre 759. E aos opositores se lhes reservava uma triste sorte.
YS: É verdade que havia censura, intimidações e mortos ao final.
SL: Então não pode dizer que a situação era melhor com Batista, já que se assassinava aos opositores. Já não é o caso hoje em dia. Pensa você que a data de primeiro de janeiro é uma tragédia para a história de Cuba?
YS: Não, não, em absoluto. Foi um processo que criou muita esperança, mas que traiu à maioria dos cubanos. Foi um momento luminoso para uma boa parte da população mas puseram fim a uma ditadura e instauraram outra. Mas não sou tão negativa como alguns.
Luis Posada Carriles, a lei de Ajuste cubano e a emigração
SL: O que pensa de Luis Posada Carriles, ex-agente da CIA responsável por numerosos crimes em Cuba e a quem os Estados Unidos se nega a julgar?
YS: É um tema político que não interessa as pessoas. É uma cortina de fumaça.
SL: Pelo menos interessa aos familiares das vítimas. Qual é seu ponto de vista a respeito?
YS: Não gosto das ações violentas.
SL: Condena seus atos terroristas?
YS: Condeno todo ato de terrorismo, inclusive os que se cometem atualmente no Iraque por uma suposta resistência iraquiana que mata aos iraquianos.
SL: Quem mata mais os iraquianos? Os ataques da resistência ou os bombardeios dos Estados Unidos?
YS: Não sei.
SL: Uma palavra sobre a lei de Ajuste Cubano que estipula que todo cubano que emigra legal ou ilegalmente para os Estados Unidos consegue automaticamente o status de residente permanente.
YS: É uma vantagem que não desfrutam os demais países. Mas o fato de que os cubanos emigrem para os Estados Unidos se deve a que a situação está difícil aqui.
SL: E também os Estados Unidos é o país mais rico do mundo. Muitos europeus também emigram para lá. Você reconhece que a lei de Ajuste cubano é uma formidável ferramenta de incitação à emigração legal e ilegal?.
YS: É, efetivamente, um fator de incitação.
SL: Não vê isso como uma ferramenta para desestabilizar a sociedade e ao governo?
YS: Neste caso podemos dizer também que o fato de outorgar a cidadania espanhola aos descendentes de espanhóis nascidos em Cuba é um fator de desestabilização.
SL: Não tem nada a ver pois há razões históricas para isso e, além disso, a Espanha aplica esta lei a todos os países da América Latina e não só a Cuba, enquanto que a lei de Ajuste Cubano é única no mundo.
YS: Mas há fortes relações. Joga-se beisebol em Cuba como nos Estados Unidos.
SL: Na República Dominicana também e, no entanto, não há uma lei de ajuste dominicano.
YS: Existe entretanto uma tradição de vizinhança.
SL: Então por que esta lei não se aprovou antes da Revolução?
YS: Porque os cubanos não queriam ir-se de seu país. Na época, Cuba era um país de imigração e não de emigração.
SL: É absolutamente falso já que nos anos 50 Cuba ocupava o segundo lugar entre os países americanos em termos de fluxo migratório para Estados Unidos, imediatamente atrás do México. Cuba mandava mais emigrantes para os Estados Unidos que toda a América Central e toda a América do Sul juntas, enquanto que atualmente Cuba só ocupa o décimo lugar apesar da lei de Ajuste Cubano e das sanções econômicas.
YS: Talvez, mas não havia essa obsessão de abandonar o país.
SL: As cifras demonstram o contrário. Atualmente, repito, Cuba só ocupa o décimo lugar no continente americano em termos de fluxo migratório para os Estados Unidos. Então a obsessão da qual você me fala é mais forte en nove países do continente pelo menos.
YS: Sim, mas naquela época os cubanos iam e regressavam.
SL: É o mesmo caso na atualidade, já que a cada ano os cubanos do exterior regressam em férias para cá. Além disso, antes de 2004 e das restrições que impôs o presidente Bush que limitaram as viagens dos cubanos dos Estados Unidos a 14 dias cada três anos, os cubanos constituíam a maioria que dos Estados Unidos viajava mais freqüentemente a seu país de origem, muito mais do que os mexicanos, por exemplo, o que demonstra que os cubanos dos Estados Unidos são em sua imensa maioria emigrados econômicos e não exilados políticos já que regressam a seu país de visita, algo que não faria um exilado político.
YS: Sim, mas pergunte-lhes se querem voltar a viver aqui outra vez.
SL: Mas é o que você fez, não? Além disso, em seu blog você escreveu em julho de 2007 que seu caso não era um caso isolado. A cito: “Faz três anos […] em Zurich […], decidi voltar a viver em meu país. Meus amigos acharam que lhes fazia uma piada, minha mãe se negou a aceitar que su filha já não vivia na Suíça do leite e do chocolate”. Em 12 de agosto de 2004 você se apresentou na agência de imigração provincial de Havana para explicar seu caso. Você escreveu: “Tremenda surpresa quando me disseram, fique no fim da fila dos ‘que regressam’ […]. Assim foi que encontrei, rapidamente, outros ‘loucos’ como eu, cada um com sua truculenta história de retorno”. Então existe este fenômeno de regresso ao país.
YS: Sim, mas são pessoas que regressam por razões pessoais. Há alguns que tinham dívidas no exterior, outros que não suportavam a vida fora. Enfim, uma imensidade de razões.
SL: Então, apesar das dificuldades e das vicissitudes cotidianas, a vida não é tão terrível aqui já que alguns regressam. Você pensa que os cubanos têm uma visão demasiado idílica da vida no exterior?
YS: Isso se deve à propaganda do regime que apresenta de maneira demasiado negativa a vida lá fora e isso tem trazido um resultado contrario para as pessoas, que idealizam demasiado o modo de vida ocidental. O problema é que em Cuba, a emigração de mais de onze meses é definitiva quando alguém poderia viver dois anos fora e regressar por um tempo e ir-se de novo etc.
SL: Então, se entendo bem, o problema em Cuba é mais de ordem econômico já que as pessoas desejam abandonar o país só para melhorar seu nível de vida.
YS: Muitos gostariam viajar ao exterior e poder regressar logo, mas as leis migratórias não o permitem. Estou certa de que se fosse possível muita gente emigraria dois anos e regressaria logo para ir-se de novo e regressar, etc.
SL: Em seu blog houve comentários interessantes a respeito. Vários emigrados falaram de suas desilusões com o modo de vida ocidental.
YS: É muito humano. Você se apaixona por uma mulher e três meses depois perde suas ilusões. Compra-se um par de sapatos e ao cabo de dois dias já não gosta mais deles. As desilusões fazem parte da condição humana. O pior é que as pessoas não podem regressar.
SL: Mas as pessoas regressam.
YS: Sim, mas só de férias.
SL: Mas têm o direito de ficar todo o tempo que quiserem, vários anos inclusive, salvo que perdem algumas vantagens vinculadas a sua condição de residente permanente como a ‘libreta’, a prioridade para o recebimento de casa, etc.
YS: Sim, mas as pessoas não podem ficar vários meses aqui, pois têm sua vida fora, seu trabalho, etc.
SL: Isso é outra coisa e é o mesmo para todos os emigrados do mundo inteiro. Em todo caso, podem perfeitamente regressar a Cuba quando queriam e ficar ali todo o tempo que quiserem. A única coisa é que se ficarem mais de onze meses fora do país perdem algumas vantagens. Por outro lado, me custa compreender, se a realidade é tão terrível aqui, alguém que tem a oportunidade de viver fora, en um país desenvolvido, por que desejaria regressar a viver de novo em Cuba?
YS: Por múltiplas razões, por seus laços familiares, etc.
SL: Então a realidade não é tão dramática.
YS: Não diria isso, mas alguns dispõem de melhores condições de vida que outros
SL: Quais são segundo você os objetivos do governo dos Estados Unidos a respeito de Cuba?
YS: Os Estados Unidos desejam uma mudança de governo em Cuba, e é o que eu desejo também.
SL: Então comparte um objetivo comum com os Estados Unidos
YS: Como muitos cubanos.
SL: Não estou convencido disso. Mas, por quê? Porque é uma ditadura? O que quer Washington de Cuba?
YS: Creio que se trata de una questão geopolítica. Também está a vontade dos exilados cubanos, que se toma em conta, e que quer uma nova Cuba, o bem-estar dos cubanos.
SL: Com a imposição de sanções econômicas?
YS: Tudo depende a quem se refere. Quanto aos Estados Unidos, creio que querem impedir que exploda a bomba migratória.
SL: Ah sim? Com a lei de Ajuste Cubano que incita aos cubanos a que abandonem o país? Não é sério. Por que não anulam esta lei então?
YS: Creio que o verdadeiro objetivo dos Estados Unidos é acabar com o governo de Cuba para dispor de um espaço mais estável. Tem-se falado muito de David contra Golias para falar do conflito. Mas o único Golias para mim é o governo cubano que impõe um controle, a ilegalidade, os baixos salários, a repressão, as limitações.
SL: Você não pensa que a hostilidade dos Estados Unidos tem contribuído com isso?
YS: Não só penso que tem contribuído com isso com também que se tem convertido no principal argumento para dizer que vivemos em uma fortaleza sitiada e que toda dissidência é traição. Creio, na verdade, que o governo cubano teme que este confronto desapareça. O governo cubano deseja a manutenção das sanções econômicas.
SL: De verdade? Porque é exatamente o que diz Washington de modo um pouco contraditório porque se fosse o caso, deveria levantar as sanções e deixar assim o governo cubano frente a suas próprias responsabilidades. Já não existiria a desculpa das sanções para justificar os problemas em Cuba.
YS: Cada vez que os Estados Unidos têm tentado melhorar a situação, o governo cubano tem tido uma atitude contraproducente.
SL: Em que momento os Estados Unidos tentou melhorar a situação? Desde 1960 só se tem reforçado as sanções, com a exceção do período Carter. Fica difícil então manter este discurso. Em 1992 os Estados Unidos votaram a lei Torricelli com caráter extraterritorial; em 1996, a lei Helms-Burton, extraterritorial e retroativa; em 2004, Bush adotou novas sanções e as ampliou em 2006. Não podemos dizer que os Estados Unidos têm tentado melhorar a situação. Os fatos demonstram o contrário. Além disso, se as sanções são favoráveis ao governo cubano e só se trata de uma desculpa por que não eliminá-las? Não são os dirigentes quem sofrem devido às sanções, mas o povo.
YS: Obama deu um passo nesse sentido, insuficiente talvez, mas interessante.
SL: Só eliminou as restrições que Bush impôs aos cubanos e que lhes proibia viajar a seu país mais de 14 dias cada três anos, na melhor das hipóteses, e com a condição de que tivesse um membro direto de sua família em Cuba. Inclusive redefiniu o conceito de família. Assim, um cubano da Flórida que só tivesse um tio em Cuba não poderia viajar a seu país, pois não era considerado como membro «direto» da família. Obama não eliminou todas as sanções que impôs Bush e nem sequer regressamos ao status que havia com Clinton.
YS: Creio que as duas partes devem baixar o tom sobre tudo, e Obama o tem feito. Depois Obama não pode eliminar as sanções, pois não tem um acordo do Congresso.
SL: Mas pode aliviá-las consideravelmente assinando simples ordens executivas, o que se nega a fazer no momento.
YS: Está ocupado com outros temas, como o desemprego e a reforma da saúde.
SL: No entanto teve tempo de responder a sua entrevista.
YS: Sou uma pessoa afortunada.
SL: A posição do governo cubano é a seguinte: não temos que dar nenhum passo em direção aos Estados Unidos, pois não impomos sanções aos Estados Unidos.
YS: Sim, e o governo disse também que os Estados Unidos não devem pedir mudanças internas porque é ingerência.
SL: É o caso, não?
YS: Então se eu peço uma mudança também é ingerência?
SL: Não, porque você é cubana e por isso tem direito a decidir o futuro de seu país.
YS: O problema não é quem pede as mudanças, mas as mudanças em questão.
SL: Não estou seguro porque como francês não gostaria que o governo belga ou alemão se imiscuísse nos assuntos internos da França. Como cubana, você aceita que o governo dos Estados Unidos lhe diga como deve dirigir seu país?
YS: Se o objetivo é agredir o país, é evidentemente inaceitável.
SL: Você considera as sanções econômicas como uma agressão?
YS: Sim, as considero como uma agressão que não tem tido resultados e que é uma excrescência da guerra fria, que não tem nenhum sentido, que afeta ao povo e que tem reforçado o governo. Mas repito que o governo cubano é responsável por 80% da crise econômica atual e 20% é pelas sanções econômicas.
SL: Outra vez, lhe repito, é exatamente a posição do governo dos Estados Unidos e os números demonstram o contrario. Se fosse o caso não creio que 187 países do mundo se dessem ao trabalho de votar uma resolução contra as sanções. É a décima oitava vez consecutiva que uma imensa maioria dos países da ONU se pronuncia contra este castigo econômico. Se fosse secundário não creio que se incomodariam.
YS: Mas não sou uma especialista em economia, é meu sentimento pessoal
SL: O que preconiza você para Cuba?
YS: Creio que há que liberalizar a economia. Claro que não se pode fazer de um dia para outro porque provocaria uma quebra e disparidades sociais que afetariam aos mais vulneráveis. Mas há que fazê-lo gradualmente e o governo cubano tem a possibilidade de fazê-lo.
SL: Um capitalismo ‘sui generis’, como disse você.
YS: Cuba é uma ilha sui generis. Podemos criar um capitalismo sui generis.
SL: Yoani Sánchez, graças por seu tempo e sua disponibilidade.
YS: Graças a você.
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Salim Lamrani é professor encarregado de cursos na Universidade Paris-Sorbonne - Paris IV e na Universidade Paris-Est Marne-la-Vallée e jornalista francês, especialista nas relações entre Cuba e Estados Unidos. Acaba de publicar Cuba:
Ce que les médias ne vous diront jamais (Paris: Editions Estrella, 2009). Contacto:
lamranisalim@yahoo.fr
Publicado em
Rebelión
Topo
Traduzido do espanhol por
Rosalvo Maciel
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