Dax Toscano Segovia*
“Calar em silêncio, esconder-se em surdina, ou permanecer cômoda e ociosamente sentado em frente a um computador no local de trabalho, não é digno de quem afirma lutar por um mundo melhor. A solidariedade e o apoio aos revolucionários colombianos, e apesar dos riscos que tal atitude comporta, por causa das perseguições arbitrárias movidas pelo regime narcoparamilitar orientado por Uribe, tem de afirmar-se de viva voz, como no tempo dos revolucionários vietnamitas e argelinos, por exemplo, e como se faz hoje em dia, com o povo palestino, vítima de alguns dos mais abomináveis crimes que é possível praticar, da parte do estado sionista de Israel.”
O mês de Março de 2008 carrega um significado muito especial pela profunda dor para o movimento das FARC e para todas as forças revolucionárias a atuar na América Latina e de todo o mundo, infligida pelas mortes dos comandantes Raúl Reyes, Iván Ríos e Manuel Marulunda Vélez.
Raúl foi assassinado a 1° de Março desse mesmo ano, num bombardeamento do acampamento guerrilheiro onde prestava serviço e que se instalara em Angostura, na zona de Putumayo, ataque aliás que provocou ainda a morte de outras vinte e quatro pessoas, grupo em que se encontraram cinco estudantes de nacionalidade mexicana que permaneciam no referido local. Lucía Morett foi a única sobrevivente desse grupo de estudantes. Atualmente, é perseguida por membros do governo narcoparamilitar colombiano e por representantes da justiça equatoriana, que decidiram incriminá-la pelo fato de ter visitado o acampamento guerrilheiro de Raúl.
O projeto e a execução da «Operação Fênix» foram da responsabilidade das forças de segurança colombianas, as mesmas que puderam contar para o efeito, com o apoio de especialistas militares e de espionagem estadunidenses e israelitas. Quadros dos serviços secretos do exército e da polícia equatoriana contribuíram igualmente em operações de infiltração no terreno para posteriormente ajudar a descobrir a localização exata do acampamento do comandante das FARC-EP. O oficial de polícia Manuel Silva e o coronel do exército Mario Pazmiño foram figuras chave nesta vergonhosa tarefa de trabalhar diretamente para os serviços de investigação policial colombianos, e ao serviço do governo equatoriano.
Esta campanha foi imbuída de crueldade, devidamente aproveitada pela comunicação social colombiana que, simultaneamente, se regalava com a mórbida profanação do assassinado Raúl Reyes através do abuso da exibição das fotografias dos cadáveres. Juan Manuel Santos, antigo ministro da defesa da Colômbia, exibia um sorriso macabro ao comunicar a fatídica notícia e apresentou a morte de Raúl como um troféu desportivo pessoal.
Ainda mal refeita da dor provocada por esta recente perda, o movimento das FARC foi forçado a enfrentar o assassinato do comandante Iván Ríos, igualmente membro do secretariado das FARC-EP, no dia 3 de Março de 2008. Iván foi vítima de Pedro Pablo Montoya, também conhecido por «Rojas», um indivíduo cobarde a quem a promessa de muito dinheiro e a garantia das vantagens que o fato de ser traidor em favor da política interna de Uribe lhe trariam e que são oferecidas aos traidores e assassinos do povo colombiano, subiram à cabeça, acabando por causa disso, por disparar na cabeça do comandante assim como na sua companheira, enquanto ambos dormiam no seu próprio acampamento, e para logo a seguir decepar friamente uma das suas mãos e levá-la consigo, como prova a apresentar ao exército colombiano, para reclamar a sua recompensa de 5 mil milhões de pesos que, previamente, lhe fora prometido. Mais uma vez Uribe, Santos e Padilla nem tentaram disfarçar a sua satisfação por este novo atentado orquestrado contra as FARC-EP. As afirmações destes mafiosos através das suas correias de transmissão informativas atropelavam uns e outros, acenando já com uma desvairada euforia com a derrota das FARC numa questão de pouco tempo.
A prepotência do regime narcoparamilitar de Álvaro Uribe Vélez atingiu extremos impensáveis quando, durante o mês de Maio, as FARC-EP confirmaram a morte do seu comandante supremo, Manuel Marulanda Vélez, com 78 anos de idade e ocorrida a 26 de Março de 2008, como conseqüência de uma paragem cardíaca. Estimulado por essa notícia, o criminoso Juan Manuel Santos decidiu dar ordens ao exército colombiano para se ir resgatar o cadáver de Marulanda, chegando mesmo a oferecer uma quantia milionária em dinheiro, a quem ajudasse a localizar o corpo do malogrado comandante.
Estes dias foram vividos com intenso sofrimento e muita dor para o movimento da guerrilha das FARC-EP. No entanto, apesar da violenta campanha mediática financiada pelo uribismo que propagandeou a suposta desmoralização e desorganização dos revolucionários, os combatentes das FARC-EP não perderam o rumo traduzido, desde as suas origens, numa luta pela construção de uma Colômbia nova, ao mesmo tempo em que, simultaneamente, tomavam as medidas necessárias para se reestruturarem face às baixas e dificuldades sofridas e sentidas como corolário lógico da guerra, em que todo o povo colombiano se encontra envolvido, fruto da política criminosa da oligarquia deste nosso país e do imperialismo estadunidense. O comandante Alfonso Cano foi, por conseguinte, escolhido para novo líder das FARC-EP.
Os fatos ocorridos neste funesto mês de Março do ano de 2008 para os revolucionários das FARC-EP mas também para todas e todos os revolucionários de todo o mundo, não poderá ser evocado com melancolia ou sentimentalismos que não ajudam à nossa indispensável ação transformadora do sistema político e ordem vigentes, porque é precisamente isso que pretende atingir quem detém o poder através de inúmeros mecanismos de subversão e de alienação, entre os quais figuram a intimidação através da insinuação do medo da morte e face ao sucedido em situações específicas no passado, e que tiveram reflexos negativos para as organizações revolucionárias e os seus heróicos combatentes.
O revolucionário basco Iñaki Gil de San Vicente afirmou que «um povo vive na medida em que as pessoas que morreram para que esse povo pudesse viver, continuem vivas nesse mesmo povo». Não basta, por conseguinte, recordar as nossas heroínas e os nossos heróis em cada aniversário das suas mortes, ou tão somente celebrar atos em sua homenagem nos dias em que faleceram. Tal atitude só provocaria a mumificação ou petrificação dos seus gloriosos atos perpetrados, dos seus ideais. As recordações estéreis são também evocadas por quem detém o poder para aproveitamento desses momentos com o objetivo de, desse modo, esvaziar de conteúdo todo o vigor e entusiasmo dos combatentes revolucionários mortos ou então para continuar a denegrir ou a insultar o exemplo dado como revolucionário. Assim foi feito com a imagem do Che ao longo de 43 anos!
«Um povo vive na medida em que essa memória esteja sempre presente, se transforme em ação sistemática, seja vivida na prática do dia a dia, e não se limite a não ser mais do que uma recordação num obituário de um jornal», exprimiu Iñaki. E acrescentou que um povo só pode viver «na medida em que seja capaz de manter nas ruas, nas lutas, na mobilização, todos os contributos dados por todos aqueles e aquelas que lutaram e morreram e que não hesitaram quando enfrentaram todo o tipo de perigos, por acreditarem nas suas reivindicações para eles próprios e para as gerações vindouras, porque a memória não pertence somente ao passado, mas é isso sim, uma arma carregada de futuro, um instrumento para a libertação, para inspirar a acção no presente».
Marx anotou na sua tese sobre Feuerbach a necessidade de não só saber interpretar a realidade, mas também de lutar para transformá-la.
Para o autor de «O Capital», é imprescindível que não se aja somente (ainda que obviamente não se deva deixar de fazê-lo) repetindo palavras de ordem ou usando boinas ou camisolas com os retratos dos revolucionários ou decorando com cartazes com fotografias dos combatentes admirados as paredes da residência ou do local de trabalho.
A prática revolucionária implica absorver conhecimentos teóricos adequados para saber interpretar a realidade, não só para conseguir explicá-la a terceiros ou ir aprofundando e atualizando esse mesmo conhecimento, assim como para melhorar ou transformar no caso dessa mesma realidade ser de miséria e de exploração para a maioria da população.
Mas na verdade, não se trata aqui, de uma ação individualista, levada a cabo solitariamente, desligada de um coletivo político. Antes pelo contrário, os povos e as suas diferentes organizações é que devem liderar o seu próprio destino, e em conseqüência desta necessidade, devem empreender as tarefas políticas e revolucionárias para se lutar contra os inimigos do progresso da humanidade, ou seja, o imperialismo, o sionismo, a alta burguesia mundial e as oligarquias para, desse modo, conquistar uma sociedade que seja diferente do capitalismo.
Neste processo, os povos não deverão esquecer-se, nem perdoar a todos aqueles que infligiram dor ou sofrimento. Os atos criminosos cometidos por figuras como Uribe, Santos, Padilla, Bush e a sua parafernália militar e paramilitar, não poderão nunca ficar somente no passado, mas deverão, isso sim, ser lembrados em nome da memória dos coletivos políticos, com o propósito, precisamente, de impulsionar a luta revolucionária que um dia irá pôr cobro à política criminosa e guerreira defendida pela oligarquia e pelo imperialismo. Do mesmo modo, há que manter vivos cada um dos feitos cometidos pelos criminosos ao serviço de quem detém o poder na sociedade capitalista, para que, mais cedo ou mais tarde, prestem contas pelos seus crimes em tribunais revolucionários.
Ao longo destes últimos cinqüenta anos, as FARC-EP provaram, com a prática seguida pela organização e pelos seus combatentes como Raúl, Iván mas também do velhote muito acarinhado, o comandante Manuel, ser coerentes com os princípios defendidos pelos próprios para proteger o povo, ou seja lutar do seu lado, com firmeza e coragem, contra o imperialismo e pugnando pelo internacionalismo revolucionário, agora com ainda mais brio, depois de ter recuperado a espada libertadora de Simón Bolívar.
Ao cumprirem-se dois anos após o assassínio de Raúl Reyes e de Iván Rios e da morte natural do comandante supremo, Manuel Marulunda Vélez, os revolucionários devem demonstrar a sua solidariedade militante, ativa e sincera com as FARC-EP. O medo, as dúvidas não podem colher naqueles que lutam pela construção de um mundo inteiro alternativo ao modelo imposto pelo capitalismo neo-liberal.
A oligarquia santanderista e o imperialismo desejam que os povos do mundo inteiro generalizem e validem as mentiras que eles próprios veiculam constantemente sobre o movimento revolucionário colombiano.
É triste escutar muitas altas figuras, supostamente de esquerda, assim como organizações políticas aparentemente progressistas, repetir os argumentos estafados da propaganda destrutiva da oligarquia colombiana e do imperialismo estadunidense sobre as FARC-EP. Essas pessoas e esses movimentos que, na verdade, nunca se sentiram forçados a segurar o touro pelos cornos, não merecem qualquer tipo de consideração da parte dos povos que têm de lutar contra os seus inimigos, contra os seus exploradores.
Ninguém duvida que a propaganda fascista também provocou um efeito sedutor em grande parte das populações, que diariamente são intoxicadas com mentiras a respeito do movimento guerrilheiro colombiano.
Em nome desse movimento, há que ir desmontando esses argumentos negativos e dar a conhecer a cada pessoa, através de vários meios possíveis, as verdadeiras intenções das FARC-EP. Esclarecer sobre a verdade contra as mentiras dos oligarcas e dos imperialistas, é uma tarefa prioritária de todos os revolucionários. A direita está bem unida. A atestá-lo, Uribe e a sua marionete Gabriel Silva, atualmente ministro da defesa da Colômbia, deram ordens às suas embaixadas para que, com a ajuda destas, se lançasse uma campanha agressiva com o objetivo de denegrir as FARC-EP, assim que se desse a conhecer na Argentina o documentário «As FARC-EP, os revolucionários do século XXI», onde a guerrilha colombiana é apresentada ao público, nas suas verdadeiras dimensões, como força com implantação popular e valor político-militar, ao serviço dos pobres.
Calar em silêncio, esconder-se em surdina, ou permanecer cômoda e ociosamente sentado em frente a um computador no local de trabalho, não é digno de quem afirma lutar por um mundo melhor. A solidariedade e o apoio aos revolucionários colombianos, e apesar dos riscos que tal atitude comporta, por causa das perseguições arbitrárias movidas pelo regime narcoparamilitar orientado por Uribe, tem de afirmar-se de viva voz, como no tempo dos revolucionários vietnamitas e argelinos, por exemplo, e como se faz hoje em dia, com o povo palestino, vítima de alguns dos mais abomináveis crimes que é possível praticar, da parte do estado sionista de Israel.
Esta solidariedade também dever-se-á estender a todos aqueles que são perseguidos por denunciarem as violações dos direitos humanos cometidas pelo regime fascistóide colombiano e todos os que defendem os revolucionários, como sucede com os jornalistas Jorge Enrique Botero e Dick Emanuelsson, entre muitos outros e outras comunicadores coerentes com preocupações sociais.
Esse é o melhor tributo que se poderá prestar a Manuel, Raúl, Iván, Martín Caballero, Efraín Guzmán, mas também para todos os revolucionários que foram capturados e confinados a cárceres de prisões colombianas ou estadunidenses pelo simples delito de lutarem pela construção de uma Colômbia nova, como Sonia, Simón Trinidad ou Iván Vargas.
Bolívar vive! A luta prossegue!
Juramos vencer por isso venceremos!
* Jornalista equatoriano
Tradução de João Hinard de Pádua
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