Além do Cidadão Kane

domingo, 21 de dezembro de 2008

Mulheres protestam contra criminalização do aborto durante a XI CNDH

Em protesto à estratégia de criminalização e perseguição das mulheres com a criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do aborto e o processo envolvendo cerca de 10 mil mulheres do Mato Grosso do Sul, indiciadas pelo crime de aborto, os movimentos de mulheres denunciaram - diante de entidades nacionais dos direitos humanos, que participavam da XI Conferência Nacional de Direitos Humanos (CNDH) – as violações aos direitos humanos das mulheres.

Os movimentos de mulheres vivem intensa perseguição e criminalização das mulheres, reforçada e legitimada pela recente criação da CPI do aborto pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia, e o processo envolvendo quase 10 mil mulheres em Campo Grande-MS, pela suposta prática de aborto, tendo suas vidas e intimidades expostas. Essas atitudes reforçam a estratégia de criminalização e perseguição às mulheres e aos movimentos sociais, configurando uma verdadeira violação aos direitos humanos e contrariando o que preconiza a Declaração Universal dos Direitos Humanos.



Relatório aponta violações sofridas por 10 mil mulheres investigadas pela prática de aborto em MS



Entidades entregam ao ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, e a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), durante a XI CNDH, relatório que aponta violações sofridas por 10 mil mulheres investigadas pela prática de aborto
O relatório “Processos judiciais envolvendo abortamento: Negação dos direitos reprodutivos das mulheres em Mato Grosso do Sul”, que mostra as irregularidades na ação policial com a apreensão e manuseio dos prontuários médicos e o posterior processamento das mulheres em Campo Grande. O relatório será lançado nesta terça-feira, 16 de dezembro, às 16h30h, em Brasília. No processo são violados o direito à privacidade, o direito à saúde, à liberdade, e ao devido processo legal, entre outros direitos, previstos na Constituição Federal e nos tratados de direitos humanos ratificados pelo Brasil.
Os agentes policiais não respeitaram a privacidade das mulheres, não impediram a exposição indevida do conteúdo das fichas médicas e o seu manuseio por pessoal não qualificado. A legislação brasileira prevê procedimento específico para a investigação de registros médicos de pacientes, exigindo que as autoridades judiciais apontem um especialista para manusear os prontuários, com o objetivo de preservar o sigilo médico. Ignorando este procedimento, a polícia utilizou os registros médicos apreendidos de forma ilegal para investigar criminalmente milhares de mulheres suspeitas de terem se submetido a abortamentos ilegais.
Estes acontecimentos afetaram as vidas de milhares de mulheres que, hoje, estão sob investigação. Setenta delas já receberam sua sentença, e outras mais são acusadas diariamente. Muitas que ainda não foram processadas vivem com medo de serem investigadas criminalmente, podendo ter a sua vida privada revelada para suas famílias, seus colegas de trabalho ou o público de forma geral. Atualmente, a polícia planeja investigar cerca de duas mil mulheres cujos casos ainda não estariam prescritos.O relatório foi organizado pelo Ipas Brasil a partir de visitas de campo a Campo Grande e baseia-se em entrevistas com pessoas-chave envolvidas no caso, em documentos oficiais e na imprensa, pesquisados e sistematizados por um grupo de entidades e redes que atuam pela promoção e defesa dos direitos reprodutivos: Antígona/CLADEM – Comitê Latino Americano e do Caribe pela Defesa dos Direitos da Mulher, CCR - Comissão Cidadania e Reprodução, CFEMEA, Ipas Brasil, Themis, Rede Feminista de Saúde Direitos Sexuais e Reprodutivos e Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro.

Questão de saúde pública tratada como questão de polícia



A interrupção da gravidez é um grave problema de saúde pública e de direitos humanos no Brasil. Apesar de o Código Penal brasileiro criminalizar o procedimento, estima-se que ocorram 1.054.243 abortamentos a cada ano no país. O abortamento inseguro está entre as principais causas de mortalidade materna. Aproximadamente 250.000 mulheres são atendidas anualmente nos hospitais brasileiros com complicações decorrentes de abortamentos inseguros.
A criminalização do aborto tem um efeito perverso na saúde pública e não previne a sua prática. O caso de Mato Grosso do Sul é emblemático e demonstra que o Estado deve buscar resposta fora da esfera penal para lidar com a questão.

Original em CFEMEA


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