Além do Cidadão Kane

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Crise: reportagem revela medo e trapaça na GM de São Caetano

Na GM brasileira – que tem fábricas na cidade do ABC, em São José dos Campos e em Gravataí (RS) – os efeitos da crise já têm sido sentidos pelos funcionários, não porque tem havido uma diminuição brusca no consumo, mas porque as montadoras têm tentado se aproveitar do momento para aumentar seus lucros. “Quem fez a crise não foi o povo, mas quem paga somos nós”, diz Marcelo Toledo, primeiro-secretário do Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de São Caetano do Sul, em São Paulo.
Por Priscila Lobregatte, para a Classe Operária.

No sistema capitalista, quando qualquer crise surge, os trabalhadores são sempre os primeiros a sofrer com seus efeitos. Na atualidade, as coisas não são diferentes. Epicentro da atual onda de temor na economia mundial, os Estados Unidos, por exemplo, assistiram executivos de grandes empresas abocanharem milhões de dólares pouco antes de a crise estourar.

No caso do banco de investimentos Lehman Brothers, um dos símbolos da irresponsabilidade dos setores financeiros, 20 mil funcionários foram demitidos em todo o mundo. Enquanto isso, um de seus executivos embolsou mais de US$ 100 milhões.

Os efeitos da crise ainda não chegaram ao Brasil com a mesma força que pegou outros países. Mas 2009 pode amargar um cenário negativo especialmente pelo medo geral da população em comprar diante de um quadro incerto.

Ademir Justino Cassemiro, conhecido como “Cabeça”, está a dois anos na GM. O metalúrgico questiona o uso do dinheiro vindo dos governos federal e de São Paulo (R$ 8 bilhões ao todo) para financiar as vendas de carros.

“A GM não está financiando nada. Está retendo esse dinheiro e ainda reduziu o prazo de financiamento para 36 meses. Eles querem aumentar seu lucro”. Paulo César, o “Pão Doce”, também funcionário da GM, concorda. “A quem interessa importar essa crise para cá? Ao patronato. Ele a usa como desculpa para diminuir salários e direitos trabalhistas”.

“Eles querem cortar empregos dos operários, mas não pensam em fazer o mesmo na área administrativa. Mesmo nesse período de instabilidade, deve haver crescimento na venda de carros. Quer dizer, para eles, a coisa ainda não está tão ruim assim”, diz Barba, ou José Divino, há 23 anos na GM.

Divino tem razão. Estima-se que as montadoras no Brasil devem aumentar suas vendas em 24% neste ano. Em 2007, este índice também foi recorde, então de 27,8%. Esses números explicam também o fato de esse ramo ter sido responsável por mais da metade dos lucros enviados para fora do Brasil, ou seja, para as matrizes que ficam em outros países. De acordo com o Banco Central, foram mais de US$ 1,2 bilhão em 2007.

Para Marcelo Toledo, é preciso que os governos exijam contrapartidas para empréstimos tão altos, como, por exemplo, a garantia de manutenção dos empregos dos operários. E questiona: “as montadoras têm batido recordes sucessivos de vendas e a GM do Brasil é uma empresa saneada, ou seja, não há motivos para querer prejudicar os trabalhadores argumentando ser a crise a culpada”.

Situação de risco

A GM brasileira ainda não sofreu o baque da matriz, que está prestes a quebrar. No dia 20 de novembro, a empresa americana teve seu valor de mercado avaliado em apenas 1 bilhão de dólares – menos do que valia em 1938, quando o mundo ainda passava pela Grande Depressão iniciada em 1929.

Porém, os funcionários brasileiros temem pelo que pode acontecer aqui se for decretada a falência lá. Afinal, quando uma empresa desse porte passa por problemas econômicos, suas filiais e toda a rede de pequenas empresas que lhes prestam serviços podem sofrer os efeitos.

Só neste ano, a filial de São Caetano teve uma semana de paralisação remunerada, dez dias de férias coletivas e seis day off (dia paralisado). Nestes dois últimos casos, os trabalhadores não recebem nada e ainda têm esses dias descontados de suas férias e do banco de horas. “A empresa só arcou com a licença remunerada”, explica Marcelo.

Ele lembra que para cada empregado direto da GM existem outros quatro na cadeia produtiva. Por isso, empresas como Scorpions, Oversound, Salmazo e A.Pedro – todas ligadas ao ramo metalúrgico em São Caetano – também entraram na dança das férias coletivas e no caso da última, houve redução de 50% no quadro de seus 300 funcionários.

“E a Barili está querendo pagar o 13º dividido em quatro vezes e para aqueles que não aceitam, a empresa ameaça com demissão”, denuncia Marcos Parra, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano.

Segundo Toledo, os trabalhadores do terceiro turno (da meia noite às 6 da manhã) estão em situação mais instável. Isso porque em 2008 foram criados 1.600 postos neste horário a fim de que a GM conseguisse cumprir sua meta de produzir 460 mil carros até o final do ano.

Para não sobrecarregar os funcionários com horas extras e ajudar na geração de novos postos, o sindicato conseguiu negociar esse novo horário. Porém, os contratos são anuais. Com o fantasma da crise, estes trabalhadores temem ficar sem seus empregos a partir de janeiro.

No sistema capitalista, quando qualquer crise surge, os trabalhadores são sempre os primeiros a sofrer com seus efeitos. Na atualidade, as coisas não são diferentes. Epicentro da atual onda de temor na economia mundial, os Estados Unidos, por exemplo, assistiram executivos de grandes empresas abocanharem milhões de dólares pouco antes de a crise estourar.

No caso do banco de investimentos Lehman Brothers, um dos símbolos da irresponsabilidade dos setores financeiros, 20 mil funcionários foram demitidos em todo o mundo. Enquanto isso, um de seus executivos embolsou mais de US$ 100 milhões.

Fotos: Priscila Lobregatte
Original em Classe Operaria

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