Além do Cidadão Kane

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Emir Sader: por que a mídia privada não consegue ver o FSM?


Mais uma vez a mídia privada não consegue ver o FSM (Fórum Social Mundial). Os leitores que dependerem dela ficarão sem saber o que acontece aqui em Belém. Por quê? O que impede uma boa cobertura, se a riqueza de idéias, a diversidade de presenças, a força dos intercâmbios — como não se encontra em lugar algum do globo — estão todos aqui? Há jornalistas, algum espaço é dedicado pela imprensa ao evento, mas o fundamental passa despercebido.

Por Emir Sader, na Carta Maior

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O fundamental não tem preço — diz um dos lemas melhores do FSM. Enquanto o neoliberalismo e o seu reino do mercado tentam fazer com que tudo tenha preço, tudo se venda, tudo se compre, ao estilo shoping-center, o FSM se opôs desde o seu começo a isso, opondo os direitos de todos ao privilégio de quem tem poder de compra, incrementando sempre mais as desigualdades.

Um jornalista da FSP [Força Serra Presidente (forma como Sader se refere à Folha de S.Paulo)] se orgulha de ter ido a todos os Foros de Davos e, conseqüentemente, a nenhum Fórum Social Mundial. A espetacular marcha de abertura do FSM retratada com belíssimas fotos por Carta Maior, foi inviabilizada pela mídia mercantil.

A cobertura se faz com a ótica com que essa imprensa se comporta, com os óculos escuros que a impedem de ver a realidade. O FSM, como tudo, é objeto das fofocas sobre eventuais desgastes do governo Lula — a obsessão dessa mídia. Não cobrem o dia do Fórum Pan-Amazônico, não deram uma linha sobre o Fórum da Mídia Alternativa, não ouvem os palestinos, nem os africanos ou os mexicanos. Nada lhes interessa. No máximo aguardam para ver se Brad Pitt e Angelina Jolie vão vir.

Seu estilo e sua ótica está feita para Davos, para executivos, ex-ministros de economia. Lamenta a imprensa que a América Latina, a África e a China estejam tão pouco representados em Davos. Mas o que teriam a fazer por lá? Não se perguntam, nem querem saber. Seus jornalistas não são orientados senão para seguir os passos de Lula e seus ministros.

Temas como os diagnósticos da crise e as alternativas, a guerra e as alternativas de paz, as propostas de desenvolvimento sustentável — fundamentais no FSM — estão fora da pauta. Nem falar da crise da própria mídia tradicional e das propostas de construção de mídias públicas e democráticas.

A mídia mercantil é um caso perdido para a compreensão do mundo contemporâneo. Não por acaso a crise atual a afeta diretamente. Não tardará para que comecem as quebras de empresa de jornalismo por aqui também. E eles serão vitimas da sua própria cegueira, aquela que lhes impede de ver os projetos do futuro da humanidade, que passeiam pelas veredas de Belém.


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