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A situação dos palestinos na Faixa de Gaza, sob o poder da tecnologia bélica do Estado de Israel e de seu militarismo expansionista, expressa, de maneira cabal, a condição de suas vítimas: o crime justificado pela lógica da “guerra justa” e da destruição em nome da segurança e da paz. Ao limbo jurídico no qual, hoje, Israel exerce a soberania, a Idade Média denominou “estado de exceção”. Se, historicamente, os Estados nacionais se fundaram em algum tipo de violência, também é verdade que só se mantiveram e prosperaram porque acederam à legitimidade. Na dificuldade em consegui-la, o Estado de Israel exerce o poder ab-solutus e o terror, acima do concerto das Nações.
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A partir da Primeira Guerra Mundial - com o fim dos campos de batalha e o bombardeio de populações civis desarmadas - , o mundo inteiro tende a se converter em trincheira, cada indivíduo transformado em um puro objeto sem defesa, simples alvo em uma zona de tiro.
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Na contramão da violência nua, os bens culturais materializam os esforços da humanidade para se humanizar. Assim, os lugares de memória, escolas, universidades e museus.
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O Museu Arqueológico de Bagdá era o guardião da primeira história do homem, lá onde, segundo o relato bíblico, tudo começou. Entre o Tigre e o Eufrates, viveram Adão e Eva. Aí se gestaram a civilização e a vida. O museu não foi conquistado pelas forças militares norte-americanas, por um comando que, admirando seus bens, usurpava-os para si. Dele só restaram escombros.
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Na pulsão anti-genealógica do capitalismo contemporâneo - anti-intelectual e contra-humanista - não se reconhece dívida simbólica com o passado de quem o tem. E na impossibilidade de fazer da história do Outro um bem comum compartilhado, houve ainda o bombardeio da Universidade Palestina da Faixa de Gaza e da Escola cuidada pela ONU.
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Desde a Academia de Platão, do Liceu de Aristóteles e do Pórtico dos estóicos, Escola e Universidade constituíram um espaço de autonomia e liberdade a que demagogos do povo, polícia e exércitos não tinham acesso. Produzindo a vida do Espírito, sua função é a de desenvolver conhecimentos, aprimorar os costumes, elevar o indivíduo e sublimar o povo. Com a percepção aguda da brevidade da vida e da fragilidade das coisas humanas, escolas, universidades e museus são os guardiães que transmitem,ao longo das gerações, tudo o que é preciso lembrar e interrogar, e o que é digno de renome e fama.
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No exercício da razão do mais forte revela-se, porém, a vontade dos poderosos em destruir, além da vida biológica, a vida do espírito; e o desejo do povo de viver em paz. A paz - estado de tranqüilidade moral - só acontecerá, como anotou Simone Weil, quando os homens deixarem de enaltecer a força, valorizar a violência e humilhar os vencidos. “Duvido que seja para já”.
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(*) Olgária Mattos é filósofa, professora titular da Universidade de São Paulo
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