por Fátima de Oliveira - Médica
Desde 1990, o 28 de setembro é Dia pela Descriminalização do Aborto na América Latina e Caribe. No Brasil, em 1983, a data é Dia Nacional de Luta pela Legalização do Aborto, tendo como referência a assinatura da Lei do Ventre Livre (28/9/1871).
Tenho a opinião que decidir abortar é abrir mão, livre e conscientemente, de uma gravidez indesejada ou inoportuna. O aborto é um direito reprodutivo que se expressa bem na frase: Aborto a mulher decide, a sociedade respeita e o Estado garante. Posturas religiosas contrárias ao direito ao aborto alegam defesa da vida, mas torturam mulheres, no caso da anencefalia, e as empurram para o aborto clandestino e inseguro e até para a morte. É uma piração defender a vida desconsiderando vidas plenas, as das mulheres, e relegá-las a plano nenhum sacralizando uma potencialialidade de vida, a do embrião. Compartilho alguns trechos do meu romance A Hora do Angelus (Mazza Edições, 2005, www.mazzaedicoes.com.br), cujo subtítulo é Amores, abortos e abandonos nos subterrâneos da Igreja, que, ao fim e ao cabo, conta, com erotismo, histórias de amores de padres e também revela o quanto são comuns os abortos dos padres. Digo no prefácio que o romance é uma narrativa crua de como padres se desvencilham das gravidezes indesejadas de autoria de seus espermatozóides. Leia um diálogo de A Hora do Angelus entre um cardeal e a mulher com quem ele vivência tórridos momentos de amor: Essa opção da Igreja de lutar contra o aborto é inútil, na medida em que ela luta mesmo é para que as mulheres não tenham acesso ao aborto seguro. O problema para a Igreja não são os abortos, mas os leitos obstétricos para o aborto, pois a simples existência deles, em qualquer lugar, desmoraliza a sua posição contrária. Raciocínio interessante, cardeal, que precisa ser melhor explorado. Portanto, essa batalha contra o aborto ela já perdeu, mas só se dará conta disso quando perder a dos leitos obstétricos para o aborto também. Eis o centro da luta que vocês desenvolvem, mas isso precisa ficar mais explícito. É preciso cada vez mais, e é tão importante quanto a luta pelas leis sobre direito ao aborto, preparar caminhos para a definição de leitos obstétricos para o aborto, ainda que indiretamente. Você me entende? O aborto, nos tempos atuais, assim como a gravidez, e especialmente uma gravidez indesejada, não pode mais ter esse poder de antigamente de mudar projetos e cursos de vida contra a vontade das pessoas. O poder até de destruir a vida de mulheres e de homens. Aceitar que assim seja é se portar contra o projeto civilizatório dos tempos atuais.
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