Além do Cidadão Kane

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Tem bispo que diz que não houve Holocausto. Tem jornal que diz que não houve Ditadura.

Postado originalmente no blog do IZB

A Folha de S. Paulo de hoje, domingo (22 de fevereiro), tenta ignorar o absurdo cometido pela direção do jornal no editorial publicado quatro dias atrás, quando denominou a ditadura militar (1964 a 1985) de ditabranda, num claro desrespeito à memória histórica do povo brasileiro. Nenhuma carta publicada na seção de cartas (painel do leitor) do jornal a respeito do tema, apesar de ter sido o que mais recebeu cartas durante a semana, 105 mensagens, segundo o próprio painel.

Sobre o assunto, apenas um parágrafo na coluna do Ombudsman na qual ele escreve que a folha faltou com a cordialidade que se deve ter no trato com os leitores. Referia-se a forma grosseira e arrogante, de um primarismo ideológico de fazer inveja a um Reinaldo Azevedo, com a qual a Redação da folha tratou os professores Fábio Konder Comparato e Maria Victoria Benevides.

Por outro lado, se o jornal parece querer colocar uma pedra sobre o assunto, as manifestações pela internet, blogues e sites parecem dizer o contrário. O editorial da folha e o tratamento desqualificado dado aos professores geraram uma justa indignação em amplos setores que já começam a se manifestar e tudo indica que a movimentação de repúdio à folha deva crescer. Óbvio que também geram o que de pior existe na nossa sociedade, e infelizmente não são poucos, os sentimentos proto-fascistas, daqueles que querem passar uma borracha na história, negar a verdade e principalmente, esconder os crimes de muita gente que ainda anda por aí, livres, mas que torturam e mataram nos porões da ditadura com a anuência dos líderes do regime.

Vários intelectuais lançaram um manifesto em repúdio à folha e em solidariedade aos professores (reproduzimos abaixo). Esse manifesto pode ser assinado eletronicamente, é possível também deixar uma mensagem e registrar sua indignação contra o jornal.
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Reproduzimos abaixo algumas dessas mensagens dos signatários do manifesto, reveladoras do papel que a folha cumpriu no apoio à ditadura militar e outras questões mais; muitas escritas por pessoas que sofreram na pele a repressão, foram vítimas das vacas fardadas e civis e como diz o Celso Lungaretti, nunca foram apresentadas a essa ditabranda. Ao final reproduzimos um post do blog Vi o Mundo, do Azenha, uma prova inconteste do que foi a ditadura brasileira.
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Divulgue o manifesto, ajude crescer o coro das manifestações contrárias a essa tentativa absurda de burlar a história, de enganar o povo, de negar a verdade, de acobertar criminosos.
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A questão central que se coloca é saber se restará alguma dignidade ao jornal e sua direção voltará atrás se retratando num editorial que peça desculpas ao povo brasileiro e às vítimas da ditadura ou o caminho será o mesmo da nota da redação que agrediu Comparato e Benevides, ou seja, pisar no acelerador, se aliar ao pensamento mais torpe, fazer companhia à Veja como um panfleto reacionário e negar a história.
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Ao menos resta a esperança, afinal se até mesmo o Vaticano, liderado por um Papa conservador, quando pressionado, agiu com firmeza e exigiu que o bispo britânico Richard Williamson se desculpasse publicamente por ter negado o Holocausto, quem sabe reste à folha algum pudor.
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(Redação do Blog do IZB).
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(íntegra do manifesto)
REPÚDIO E SOLIDARIEDADE

Ante a viva lembrança da dura e permanente violência desencadeada pelo regime militar de 1964, os abaixo-assinados manifestam seu mais firme e veemente repúdio a arbitrária e inverídica revisão histórica contida no editorial da Folha de S.Paulo do dia 17 de fevereiro de 2009. Ao denominar ditabranda o regime político vigente no Brasil de 1964 a 1985, a direção editorial do jornal insulta e avilta a memória dos muitos brasileiros e brasileiras que lutaram pela redemocratização do pais. Perseguições, prisões iníquas, torturas, assassinatos, suicídios forjados e execuções sumárias foram crimes corriqueiramente praticados pela ditadura militar no período mais longo e sombrio da história polí­tica brasileira. O estelionato semântico manifesto pelo neologismo ditabranda e, a rigor, uma fraudulenta revisão histórica forjada por uma minoria que se beneficiou da suspensão das liberdades e direitos democráticos no pos-1964.

Repudiamos, de forma igualmente firme e contundente, a Nota de redação, publicada pelo jornal em 20 de fevereiro (p. 3) em resposta as cartas enviadas a Painel do Leitor pelos professores Maria Victória de Mesquita Benevides e Fabio Konder Comparato. Sem razões ou argumentos, a Folha de S.Paulo perpetrou ataques ignominiosos, arbitrários e irresponsáveis a atuação desses dois combativos acadêmicos e intelectuais brasileiros. Assim, vimos manifestar-lhes nosso irrestrito apoio e solidariedade ante as insólitas críticas pessoais e políticas contidas na infamante nota da direção editorial do jornal.

Pela luta pertinaz e consequente em defesa dos direitos humanos, Maria Victoria Benevides e Fábio Konder Comparato merecem o reconhecimento e o respeito de todo o povo brasileiro.

Assinam:
Antonio Candido, professor aposentado da USP
Margarida Genevois. Fundadora da Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos
Goffredo da Silva Telles Júnior, professor emérito da USP
Maria Eugenia Raposo da Silva Telles, advogada
Andréia Galvão, professora da Unifesp
Antonio Carlos Mazzeo, professor da Unesp
Augusto Buonicore, doutorando da Unicamp
Caio N. de Toledo, professor da Unicamp
Cláudio Batalha, professor da Unicamp
Eleonora Albano, professora do IEL, Unicamp
Emir Sader, professor da USP
Fernando Ponte de Souza, professor da UFSC
Heloisa Fernandes, socióloga
Ivana Jinkings, editora
Marcos Silva, professor titular da USP
Sérgio Silva, professor da Unicamp
Patricia Vieira Tropia, Universidade Federal de Uberlandia
Paulo Silveira, sociólogo
Clique aqui para assinar o manifesto
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