POR ELSA CLARO — especial para o Granma Internacional
POUCO antes da invasão ao Iraque em março de 2003, um milhão de iraquianos, na sua maioria crianças, morreu por desnutrição e doenças curáveis. A escassez de alimentos e de remédios, devido a 12 anos de sanções instigadas pelos Estados Unidos, deixou esse saldo fatal.
Diferentes organismos humanitários denunciaram aquele martírio contra pessoas civis, um fato realmente censurável. Mas atualmente, após cinco anos de ocupação, a situação piorou.
Quatro milhões de crianças precisam de atendimento urgente. Recentemente, o Oxfam Internacional, grupo que, junto a outros de caráter humanitário, denunciou que 70% dos iraquianos não têm acesso à água potável já que deixaram de purificá-la e não se fez mais tratamento das águas servidas.
Se durante o mandato de Saddam Hussein a falta de remédios era considerável, atualmente a falta deles aumenta, e o pessoal médico diminui. Uns foram assassinados e outros emigraram. Os que ficaram não são suficientes nem têm os remédios de que necessitam.
Há cinco anos, com o petróleo que permitiam vender não obtinham receitas suficientes, mas garantia condições mínimas de vida. Atualmente, a maior parte dos iraquianos depende de ajudas caridosas.
Numa reunião recente da Comissão Européia, de onde saíram 800 milhões de euros para reconstruir o Iraque, se concluiu que na nação árabe havia necessitados e reconheceu não saber aonde foi parar essa ajuda.
Quanto a dinheiro perdido ou usados suspeitosamente há muitas histórias nesta guerra injustificável. Paul Bremen, responsável pela administração do Iraque em maio de 2003, afirma em suas memórias que fazia percursos muito bem trajado (com botas de trabalho e num carro blindado, para estar a tom) depois de seus exercícios matinais, mas é incapaz de justificar não menos de US$9 bilhões dos 12 que lhe entregaram (à vista) para a restauração que ainda não fez. Os auditores do Congresso norte-americano sabem de quantias que também sumiram, das quais preferem nem falar.
Bagdá está cheia de arames farpados, muros entre comunidades que viviam em harmonia e nas quais agora existe uma rivalidade confessional insólita e destrutiva. Esta foi uma tarefa dos ocupantes que, ao serem enfrentados pela resistência interna, procuraram dividir a população, e conseguiram.
Se algum "mérito" têm é o de ter provocado um desastre para os dominados, mas pode que também seja para os próprios invasores, que tornaram Bagdá a cidade mais perigosa do mundo, graças a essa política de enfrentar pessoas por ideologia, etnia ou crença religiosa.
Enquanto Bush e Cheney ou o enganado John McCain afirmavam há pouco que vão ganhar a guerra porque os níveis de segurança aumentaram, e um monte de tolices desmentidas pelas notícias diárias, há 4,5 milhões de iraquianos deslocados, e o desemprego atinge entre 45 e 70%, segundo estatístcas do governo iraquiano, e nem sequer se aproximaram da produção de petróleo existente antes de que o território fosse atacado.
Do ponto de vista militar, o grupo de neoconservadores que animaram Bush a esta guerra, consideravam que tudo seria rápido e satisfatório, e a respeito do assunto econômico pensaram que em pouco tempo conseguiriam um de seus propósitos fundamentais: ter o controle do petróleo através duma administração local sujeita a Washington que lhes permitisse superlotar o mercado e provocar a diminuição abrupta dos preços. Situação ótima para eles, que são os maiores consumidores de combustíveis.
Mas, nem tudo é tão fácil. Quando Bremen desembarcou em Bagdá com poderes absolutos, tinha por objetivo estabelecer uma economia de mercado em regra, por isso ordenou a privatização de 200 empresas estatais e resoluções destinadas a facilitar que firmas estrangeiras se apoderassem de bancos, minas e fábricas iraquianas, ignorando as leis internacionais que proíbem uma potência ocupante de dispor dos bens do país conquistado. Por tal motivo, qualquer ato de venda era ilegal.
Se alguma coisa conseguiu este procônsul foi deixar funcionários e pessoal treinado fora de seus postos, tanto em ministérios quanto em escolas, desarticulando de vez as instituições básicas e alterando o curso normal dos assuntos públicos e inclusive a ordem interna, pois a mesma coisa fez com o exército e a polícia.
Nesse momento, o seu antecessor, o general aposentado Jay Garner, tinha assistido ao saque de importantes e antigos bens patrimoniais do Iraque, mas Bremen, foi o máximo responsável pelo caos, pelo esbanjamento, pela corrupção, e por um modo de agir que se tornou permanente, pois ainda existe, pois, do ponto de vista financeiro, ainda carecem de controles para justificar os bilhões que esta atrocidade têm custado. (Joseph Stiglitz and Linda Bilmes, "The Three Trillion Dollar War").
Num discurso comemorativo (?) deste lustro, George W. Bush disse no Pentágono que a guerra do Iraque "é uma guerra nobre, necessária e justa" (!). Por sua parte, Richard Cheney disse no Iraque que a invasão foi um "esforço bem-sucedido".
Ao que parece, nenhum dos dois se lembrou dos quase 4 mil soldados estadunidenses mortos, entre os quais não figuram, logicamente, os mercenários, aos quais pagam, mas recebem honras, nem também não dos mais de 500 soldados que se suicidaram no próprio cenário bélico, ou dos milhares que ficaram mutilados. Muito menos se lembraram de um milhão de civis iraquianos que morreram, nem das pessoas que nessa nação ocupada perderam algum familiar.
A Casa Branca encetou esta guerra com mentiras e continuam mentindo. Segundo Bush, não está arrependido de nada. Inclusive tentará impedir qualquer manobra para diminuir as tropas nos meses que ainda lhe restam no Sala Oval.
Ele nem seus lacaios vão admitir que, além do petróleo, buscavam confirmar-se como potência dominante na região, anulando, para começar, um dos opositores árabes aos excessos sionistas, particularmente contra os palestinos.
Estes não são os únicos motivos geoestratégicos que funcionaram para iniciar e manter esta guerra e possivelmente também não seja o único empenho de Washington na zona. A maior prova de que as coisas não vão muito bem é precisamente que não tenham empreendido outras agressões, que mesmo que o neguem, estiveram a ponto de ocorrer.
ECLOSÃO EM BASRA
Contradizendo as garantias repetidas por Bush sobre a segurança alcançada no Iraque, teve lugar um atentado contra um dos principais oleodutos de Basra, cidade do sul que injeta 80% das receitas pela venda de petróleo.
O primeiro-ministro do Iraque, Nuri al-Maliki, ordenou o toque de recolher na zona, comprometendo-se a manter a ofensiva contra os xiitas novamente insubordinados, depois que, em agosto passado, o clérigo Moqtada Sadr decretou o cessar-fogo, que terminou nos finais de março e que pôde ser, segundo os analistas, uma das causas para a relativa "tranqüilidade" de que tanto fizeram alarde Cheney e Bush.
Outras fontes atribuem essa relativa calma a ordens dadas pelo general Petraus para que as tropas norte-americanas somente saiam de seus quartéis em casos específicos, evitando os confrontos. Ainda assim, houve um ataque contra a fortificada Zona Verde, onde está a nova embaixada norte-americana que, segundo testemunhas, tem extensão similar à do Vaticano.
Além de uma centena de vítimas e dezenas de feridos, também houve manifestações em Bagdá exigindo a demissão do primeiro-ministro Nuri al-Miliki, qualificado como agente estadunidense.
Na Cidade Sadr, uma multidão também se manifestou contra o primeiro-ministro, alegando que "não representa o povo, mas Bush e Cheney".
Houve uma grande arremetida para deter a eclosão em Basra e evitar o contágio das áreas próximas. Por enquanto, se ignorava se a operação é casual ou se seria o inicio da ofensiva da resistência, mas se fala em meios especializados de um Plano B da administração estadunidense para reviver o que evidentemente não funciona bem. O tema fica pendente.
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