Além do Cidadão Kane

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

O MST E OS LARANJAS

Laerte Braga

Qualquer que seja a dimensão da conjuntura e os fatos políticos que dela advêm o que permanece viva e presente em cada momento da vida é a luta de classes. Vejo com freqüência se dizer que é preciso deixar de lado conceitos da ortodoxia marxista e buscar enxergar a realidade de um mundo novo.

A leitura do Manifesto do Partido Comunista, publicado pela primeira vez em 1848 dá a nítida sensação que foi escrito hoje, poucos minutos atrás. Não há uma infirma mudança naquela realidade. Nem tampouco necessidade de releitura de conceitos marxistas.


De um modo geral esse tipo de argumento, como a “morte da História”, serve aos propósitos da classe dominante. Nada além disso.

Se alguém disser que a realidade de tempo e espaço é diversa, direi que apenas na sofisticação a que se permitem as elites a partir de tecnologias geradoras de formas de dominação mais perversas e brutais, ainda que não se consiga – muitos – deixar de olhar um letreiro da cadeia Mcdonalds, de sintonizar a GLOBO, qualquer outra rede, no pressuposto de um sanduíche ou do sucesso.

Criou-se de fato a “sociedade do espetáculo”. Com linguagem própria e meios que transferiram a adoração feita nos altares onde a reverência e a submissão se manifestavam no beijo do anel, para as imensas lojas de shoppings e um “deus” chamado mercado.

Não existe progresso se esse for de apenas uma classe. Aí é privilégio.

Eu não tenho dúvidas que os apresentadores e comentaristas de telejornais no Brasil, como em nações onde a luta de classes se mostra mais aguda, são atores. Dispõem-se a qualquer papel e à diferença de atores/atores (digamos assim) está no fato que não voltam nunca a ser pessoas. Bonner é Bonner em cada momento que representa a vida. William Haak e William Haak em cada instante do papel que cumpre. Não têm identidade.

Robôs? Numa certa medida sim. Perderam almas, não sabem o significado de compromissos éticos com a verdade, mas adaptam-se aos papéis que encenam com impressionante adoração pelo “deus” que lhes paga.

O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) ocupou uma “fazenda” da CUTRALE, plantadora de laranjas e produtora de sucos. O INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) informou que a “fazenda”, de nome Santo Henrique, pertence à União. São terras públicas griladas por uma empresa. Estão numa área conhecida como Núcleo Colonial Monção. O Estado depende de uma ordem judicial para recuperar a posse dessas terras recebidas em 1909 como parte de pagamento de dívidas da Companhia de Colonização São Paulo e Paraná.

Só contra a empresa CUTRALE o INCRA tem pelo menos cinqüenta ações na Justiça no município de Ourinhos, SP.

As decisões judiciais contra o MST saem em 48 horas via de regra. Contra empresas que grilam terras públicas só Deus, esse o outro, não o mercado, sabe.

A mídia vende a idéia de ato criminoso por parte do MST. Não toca na grilagem de terras públicas pelas empresas.

Nem passa perto das dívidas dos grandes latifúndios com o Banco do Brasil e agências de fomento da União. Nunca foram pagas, são sempre roladas. Ignora os resultados obtidos nas pequenas propriedades rurais e os benefícios gerados a partir daí. Nem pensa em mostrar os resultados da pesquisa do IBGE que mostra a concentração crescente de terras no Brasil em mãos de poucos proprietários (pessoas físicas ou jurídicas)

É que esses pagam os salários dos atores/apresentadores. Os donos.

Quando a senadora Kátia Abreu, envolvida em desvio de verbas públicas para a agricultura e despejadas em sua campanha eleitoral vocifera contra o MST encontra abrigo na mídia.

Já os desvios, as dívidas da senadora por conta dos financiamentos públicos... É desse dinheiro que sai o esgar de ódio de gente como Bonner, Haack, Boechat, Miriam Leitão, Alexandre Garcia. Levam vantagem sobre atores.

Marcelo Mastroiani não conseguia dizer um não a contento do diretor, no caso Federico Felini. O gênio chamou-o a um canto e lhe ensinou a “técnica”. “Trave a bunda, dê três pulos e diga não”. Saiu como queria Felini. Mastroiani voltou ao normal nos sorrisos que se seguiram à tomada.

Deixou o ator na película e saiu gente.

Apresentadores/atores não conseguem isso. Vivem em tempo integral o papel de veicular a mentira, o ódio, de servir à classe dominante.

O MST não cometeu nenhum ato criminoso. Criminosos são os grileiros, no caso a CUTRALE.

O distinto cidadão não sabe a porcaria que come ou bebe no “milagre” dos transgênicos, ou dos produtos que promovem “saúde”, emagrecimento rápido, que o colocam no mercado, dentro dos padrões em que é consumido e consome segundo a vontade desse “deus”.

Toma ACTVIA todo dia e acredita piamente que o que é veiculado pela tevê é “saúde”. Não faz a menor idéia do que seja essa “saúde”.

Nem percebe que vai sendo transformado em objeto num mundo cada vez mais brutal e violento. Seja na decisão judicial que reintegra uma empresa na posse do que não é dela, ou que pune trabalhadores.

Importante é prestar atenção no JORNAL NACIONAL, no JORNAL DA BAND. Seguir a risca os ensinamentos de D. Ana Maria Braga e acreditar piamente que “milhões” de pessoas morreram no mundo de gripe suína segundo outra dona, essa Dona Miriam Leitão.

Nem sequer busca saber que a gripe suína chegou aos seres supostamente humanos a partir do descuido, digamos assim, de uma grande empresa criadora de porcos no México, as GRANJAS CARROL. E que o lucro foi dos laboratórios fabricantes do medicamento curativo ou salvador.

É que recebe diariamente doses cavalares de verdade absoluta e única da mídia. Nessa moeda só existe a cara deles, não há coroa.

Há uma pequena confusão sobre o artigo que deve preceder a palavra laranja, no plural ou no singular. Se feminino, referindo-se à fruta, ou se masculino, se definindo o caráter dos que veiculam tanta mentira pelos meios de comunicação. Tevê e rádio principalmente pelo seu largo alcance.

Nada disso é do nada, assim da cartola mágica da senadora Kátia Abreu.

Há dias o governo Lula prometeu que seria assinado o decreto que atualiza os chamados índices de produtividade. Aqueles que determinam, em última instância, o que é terra produtiva e o qual não é. Ouriçaram-se os latifundiários. Não têm compromisso com produção que não seja de transgênicos et por cause, dos financiamentos públicos que não vão pagar nunca, como nunca pagaram. Conhecem trabalho escravo, sabem de cor e salteado, de trás para a frente, é prática cotidiana deles.

Por largo período se impediu a divulgação de uma cartilha explicando ao consumidor o que é produto orgânico, produto que contenha orgânicos e produto não orgânico, transgênico, que, como prevê a lei, todos terão selo identificador a partir de 2010.

Não interessa que o distinto público saiba o que está ingerindo. O distinto público tem que assentar-se à frente da telinha, jurar fidelidade a “santa” Miriam Leitão e entupir-se de saúde nos potinhos de ACTVIA, mesmo que repletos de todas as podridões transformadas em sabor morango.

E achar que os criminosos são os trabalhadores rurais. Os latifundiários são geradores de progresso.

O deles.

Não existe alternativa de luta num modelo falido. Num institucional podre e comido por dentro e por fora na sua estrutura. No seu âmago. Alguém acredita num judiciário com Gilmar Mendes? Num senado com Artur Virgílio, ou Tasso Jereissati? Ou José Sarney? Num funcionário da Fundação Ford querendo ser presidente da República, falo do governador José Serra de São Paulo (propriedade privada da FIESP/DASLU)?

É esse tipo de gente que forma e representa a classe dominante, limpa, lavada com OMO e que usa COLGATE para branquear os dentes.

O artigo que define laranja é masculino. E no plural. São laranjas, mas não frutas. Tão somente criminosos que servem à classe dominante.

As pontas do crime organizado em modelo político e econômico.

O MST é uma resistência a todo esse processo perverso. Tanto se manifesta nos noticiários das tevês, rádios ou nas insinuações falsas de jornais marrons, como na borduna que oprime trabalhadores aqui, ou em Honduras, em qualquer parte do mundo. Inclusive nos EUA, onde 90 milhões de pessoas vivem à margem dos “benefícios” do chamado Estado.

Mais ou menos como aqueles navios antigos que um timoneiro ia batendo o ponto marcado para os remadores, enquanto os senhores se refestelavam nos festins do poder. Quando um remador/escravo se rebelava era atirado ao mar. Quando morria à míngua e de tanto ser explorado também jogado ao mar.

Neste momento estamos sendo jogados ao mar. E tratam de primeiro jogar o MST. Transformá-lo naquilo que eles são: criminosos. Classe dominante, logo a que explora.

Em caso de depressão corra a uma agência de turismo, compre uma passagem para Chicago. No dia 18 deste mês de outubro vai ser leiloada por 12 mil dólares a mecha de cabelos de Elvis Presley. Foi guardada por um amigo dos tempos em que o cantor prestou serviço militar na Alemanha, no esquema Elvis canta para a democracia.
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Original em Pátria Latina

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