Além do Cidadão Kane

sábado, 16 de maio de 2009

Obama: Primeiras promessas não cumpridas

Roberto Montoya

Depois dos primeiros maratonianos 100 dias nos quais o novo presidente dos EEUU parecia decidido a dar uma volta de 180º a numerosas políticas que marcaram o perfil da Administração Bush, Obama começou a recuar em alguns de seus chamativos anúncios.

Entre suas primeiras medidas de Governo, Obama anunciou a proibição total da tortura, deixando aberta a possibilidade de processar judicialmente aos responsáveis por autorizá-la e praticá-la desde o 11 de setembro; o fechamento das prisões utilizadas pela CIA no exterior; o fechamento da prisão de Guantánamo e a suspensão por três meses dos julgamentos militares, para estudar uma alternativa a eles.

Seu Departamento de Defesa, no entanto, lutaria pouco depois nos tribunais para impedir que a Associação Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) conseguisse a desclassificação de dezenas de fotografias sobre abusos e torturas a prisioneiros no Afeganistão e Iraque por parte de militares e agentes estadunidenses... e perdeu.

Boicote a uma investigação independente

Em abril passado o próprio Pentágono anunciava ter aceitado o fato e que em 28 de maio faria públicas as fotografias. O mal-estar cresceu — não só nas fileiras republicanas como também no seio das Forças Armadas—, e as diferenças se refletiram no próprio Gabinete. Finalmente, o flamante presidente deu marcha a ré e nesta quarta-feira se anunciava que havia dado instruções para recorrer da decisão judicial e tentar evitar a revelação dessas imagens, por temor de que afetaria a segurança de seus soldados nesses dois países.

O Governo boicota também as intenções da esquerda democrática e organizações defensoras dos direitos civis para que se abra uma investigação independente e se persiga aos responsáveis pelas torturas.

A recente nomeação do tenente-general Stanley McChrystal como comandante-em-chefe das tropas dos EEUU e da OTAN para Afeganistão tampouco parece que possa melhorar a imagem de seu país na zona. Durante sua chefia no Comando Conjunto das Forças Especiais (JSOC), estas protagonizaram os maiores escândalos de torturas no Iraque e Afeganistão, merecendo os elogios de Rumsfeld, Bush y Cheney.

Os afegãos tampouco podem ver as virtudes da "nova estratégia" nesse país, após sofrer nos últimos meses os letais efeitos de novos "danos colaterais" entre a população civil provocados pelos massivos bombardeios. Em relação à Guantánamo tampouco fez grandes avanços a Administração Obama.

Volta dos 'julgamentos' militares

As análises dos últimos dias sugerem que na próxima semana o presidente poderia anunciar o reinicio dos agora congelados julgamentos militares ('military commissions') dos prisioneiros, com pequenas variações sobre o sistema utilizado desde 2002. e quanto ao fechamento da prisão em um ano, o tema se complica ante a resistência tenaz do Partido Republicano - o senador Kit Bond, de Missouri, disse que "os estadunidenses não querem esses terroristas em nossos bairros"- e a resistência da maioria dos estados a que sejam trasladados a prisões dos EEUU.

Obama tenta solucionar o problema fora de suas fronteiras. Tem conseguido entregar alguns dos prisioneiros a seus países de origem, mas em muitos outros casos não o pode fazer pela falta de garantia total sobre suas vidas. Alguns países europeus têm aceitado a contragosto acolher um número muito limitado desses presos, mas prevalece a negativa a ter que solucionar um tema criado pelos próprios EEUU.

Obama já tem um problema, e serio. Depois de deslumbrar o mundo — ou a una parte dele, ao menos — com sua nova disposição e suas audazes medidas, começa a dar marcha a ré precisamente em mudanças importantes anunciadas com grande espalhafato sobre alguns dos aspectos mais sinistros da Administração Bush: sua concepção da "guerra contra o terror", sua violação sistemática dos direitos civis e dos direitos humanos.

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Publicado em El Mundo/Rebelión

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Tradução: Rosalvo Maciel

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