Além do Cidadão Kane

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Gol do Brasil na crise de Honduras

O Brasil sai com um trunfo e um triunfo na mão, contra todos os fantasmas que se ergueram no caminho, alegando que o Itamaraty estava deixando sua tradicional posição “equilibrada” para se envolver numa disputa que não era sua. “O Brasil estava certo”, é o que se pode ler nas entrelinhas de qualquer noticiário. Foi a intervenção brasileira, acolhendo Zelaya, que abriu a oportunidade e ao mesmo tempo forçou os Estados Unidos a agirem.
Por Flávio Aguiar
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Foi o Secretário (equivalente a Ministro no Brasil) Thomas Shannon Jr. sair do banco de reservas e entrar em campo para Micheletti, o presidente golpista em Honduras, afinar e aceitar alguma forma de acordo. Pudera: além de levar para a área de Micheletti o risco dos EUA não reconhecerem a eleição de novembro sem um acordo com Zelaya, Shannon levava também por debaixo do pano a ameaça de que isso redundasse na retirada dos milhões de dólares da ajuda norte-americana ao país, cujo governo ficaria então, literalmente, pendurado no pincel e sem escada para descer, ameaçando esborrachar-se.
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Mas não nos iludamos. Neste jogo perigoso o gol não foi norte-americano. O gol foi do Brasil, na verdadeira folha seca que foi, em curva pelo lado da barreira, como fazia Waldir Pereira, o imortal Didi, o acolhimento de Zelaya na nossa embaixada em Tegucigalpa. Os norte-americanos escaparam isso sim de marcar um gol contra, ameaçados que estavam de uma conivência velada com os golpistas por omissão, o que arruinaria de vez a política do presidente Barack Obama para a América Latina, além de mergulha-lo no descrédito.
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Esse descrédito não seria apenas externo. Seria interno também. A partir de um fracasso de Obama na questão, os republicanos e seus lobistas mais à direita fariam gato e sapato com tudo o que o novo governo tentasse fazer, em qualquer frente, inclusive na área da saúde.
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Aparentemente foi mais complicado negociar internamente no próprio governo norte-americano do que soltar a pelota na área de Micheletti e mandar escrever, senão o pau ia comer na pequena área.
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Por seu lado, o Brasil sai com um trunfo e um triunfo na mão, contra todos os fantasmas que se ergueram no caminho, alegando que o Itamaraty estava deixando sua tradicional posição “equilibrada” para se envolver numa disputa que não era sua, como se democracias e ditaduras nas vizinhanças não nos dissessem respeito.
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Junto com a aprovação da entrada da Venezuela na Comissão de Relações Exteriores do Senado, esse acordo em Tegucigalpa, possibilitando que Zelaya deixe a embaixada para o Palácio Presidencial, ou pelo menos encaminhando a questão nesse sentido, é uma grande vitória para o governo e sua política interna e externa. “O Brasil estava certo”, é o que se pode ler nas entrelinhas de qualquer noticiário. Foi a intervenção brasileira, acolhendo Zelaya, que abriu a oportunidade e ao mesmo tempo forçou os Estados Unidos a agirem.
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Se os golpistas, apesar das repetidas juras de Micheletti em sentido contrário, atentassem contra a embaixada, os Estados Unidos e sua omissão seriam co-responsáveis pelo que viesse a ocorrer. E ficou mais uma vez comprovado que o Brasil tornou-se um jogador indispensável dentro dessas quatro linhas, que é a complicada quadratura do círculo da política regional e mundial.
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quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Lula irá a Londres receber prêmio por contribuição à América Latina

Prêmio destaca "notável trajetória pessoal" do presidente

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva viajará na próxima quarta-feira a Londres, onde receberá um prêmio do Instituto Real de Assuntos Internacionais por sua contribuição à América Latina, informaram hoje fontes oficiais.

O Prêmio Chatham House 2009 será entregue a Lula na quinta-feira da próxima semana durante uma cerimônia para a qual foram convidadas autoridades do governo britânico, disseram à Agência Efe porta-vozes da Presidência brasileira.

Segundo o instituto, o prêmio reconhece a contribuição de Lula à melhora das relações exteriores, à estabilidade e à integração da América Latina, e sua liderança na resolução de crises regionais, assim como também sua "notável trajetória pessoal".

Durante sua estadia em Londres, onde permanecerá até sexta-feira, Lula deve se reunir com a rainha Elizabeth II, da Inglaterra, e com o primeiro-ministro do Reino Unido, Gordon Brown.
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Zero Hora

Um assassinato solicitado e anunciado

Em junho de 2003, o governo federal decretou de utilidade pública para fins de Reforma Agrária uma fazenda de 13 mil hectares, da família Southall, em São Gabriel (RS). Esta ação provocou uma ofensiva dos latifundiários gaúchos contra os Sem Terra e que se estende com maior vigor e violência no atual governo da tucana Yeda Crusius.

Naquele mesmo mês, em São Gabriel surgiu um panfleto, tido como apócrifo, que conclamou a população a envenenar, incendiar e matar a tiros os integrantes do MST. O panfleto se referia às famílias acampadas como “massa podre”, “pés deformados e sujos da escória humana”, “ratos que precisam ser exterminados”. Este documento foi entregue às autoridades estaduais e federais, exigindo a apuração e punição dos seus autores. Passado seis anos, nada foi apurado.

Em junho de 2008, o promotor do Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul, Gilberto Thums, concedeu uma entrevista ao Terra Magazine, em que classificou o MST como uma “organização criminosa”, “um braço de guerrilha” e concluiu: “A sociedade brasileira está de saco cheio com este movimento, com esta bandeira. Os objetivos estão esgotados”.

Este promotor foi o mesmo que articulou a aprovação do relatório do Conselho Superior do Ministério Público gaúcho, em 2007, em que pedia a dissolução do MST. Foi o mesmo que, em conluio com a governadora Yeda, decretou o fechamento de todas as escolas em acampamentos do MST. Foi o mesmo que desenterrou a Lei de Segurança Nacional para criminalizar os militantes do MST. Foi o mesmo que classificou o Fórum Social Mundial (FSM) como encontro de “terroristas e marginais”. Mas era insuficiente o vociferante discurso desse promotor. Faltava o personagem que se prontificasse a exercer com rigora repressão institucionalizada, pedida pelo promotor. A governadora tucana tratou de providenciar a peça que faltava na engrenagem da repressão aos movimentos sociais. Em junho de 2008, nomeou para o cargo de Comandante-Geral da Brigada Militar o Coronel Paulo Roberto Mendes.

Ele é o mesmo que, ainda como subcomandante da Brigada, defendeu a pena de morte e a necessidade de levar os bandidos ao paredão. É o mesmo que classificou as mobilizações sociais como “baderna provocada por gente desocupada”. Infelizmente, para as forças reacionárias daquele estado não foi possível manter oculto a quem a Brigada Militar devia obediência.

Em dezembro de 2008, uma gravação da Policia Federal, com autorização da Justiça, mostrou que o Cel. Mendes mantinha vinculações com políticos ligados a fraudes envolvendo merenda escolar e obras rodoviárias. Perdeu o cargo do comando da Brigada, mas governadora decidiu puni-lo, dando lhe o cargo de juiz do Tribunal Militar. No cargo de juiz, ele continuou exercendo influencia sobre a tropa militar.

Em 21 de agosto de 2009, com o tiro nas costas de espingarda calibre 12, a Brigada Militar assassinou um trabalhador rural, acampado em São Gabriel. Um rato, para eles. Para nós, Elton Brum, 44 anos, pai de dois filhos, natural de Canguçu, trabalhador rural, lutador da Reforma Agrária.

Dizem agora, as autoridades, que estão empenhadas em identificar quem puxou o gatilho. É necessário puni-lo, sim. Mas saibam, essas mesmas autoridades, que para nós as causas e os responsáveis pelas condições que levaram um brigadiano se tornar um assassino já são conhecidas. Encarnado no policial que assassinou, estava também os autores do panfleto, estava a conivência ou a inoperância das autoridades que asseguraram sua impunidade.

Estava também a atuação de um promotor público que destila seu ódio contra os pobres organizados, do oficial militar que usa das armas que o estado lhes dá para reprimir o povo e de uma governadora atolada na lama da corrupção. Exigimos a punição do executor e dos responsáveis pelo assassinato de Elton Brum!
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Contra a violência do agronegócio e a criminalização das lutas sociais


As grandes redes de televisão repetiram à exaustão, há algumas semanas, imagens da ocupação realizada por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em terras que seriam de propriedade do Sucocítrico Cutrale, no interior de São Paulo. A mídia foi taxativa em classificar a derrubada de alguns pés de laranja como ato de vandalismo.

Uma informação essencial, no entanto, foi omitida: a de que a titularidade das terras da empresa é contestada pelo Incra e pela Justiça. Trata-se de uma grande área chamada Núcleo Monções, que possui cerca de 30 mil hectares. Desses 30 mil hectares, 10 mil são terras públicas reconhecidas oficialmente como devolutas e 15 mil são terras improdutivas. Ao mesmo tempo, não há nenhuma prova de que a suposta destruição de máquinas e equipamentos tenha sido obra dos sem-terra.

Na ótica dos setores dominantes, pés de laranja arrancados em protesto representam uma imagem mais chocante do que as famílias que vivem em acampamentos precários desejando produzir alimentos.

Bloquear a reforma agrária

Há um objetivo preciso nisso tudo: impedir a revisão dos índices de produtividade agrícola – cuja versão em vigor tem como base o censo agropecuário de 1975 – e viabilizar uma CPI sobre o MST. Com tal postura, o foco do debate agrário desloca-se dos responsáveis pela desigualdade e concentração para criminalizar os que lutam pelo direito do povo. A revisão dos índices evidenciaria que, apesar de todo o avanço técnico, boa parte das grandes propriedades não é tão produtiva quanto seus donos alegam e estaria, assim, disponível para a reforma agrária.

Para mascarar tal fato, está em curso um grande operativo político das classes dominantes objetivando golpear o principal movimento social brasileiro, o MST. Deste modo, prepara-se o terreno para mais uma ofensiva contra os direitos sociais da maioria da população brasileira.

O pesado operativo midiático-empresarial visa isolar e criminalizar o movimento social e enfraquecer suas bases de apoio. Sem resistências, as corporações agrícolas tentam bloquear, ainda mais severamente, a reforma agrária e impor um modelo agroexportador predatório em termos sociais e ambientais como única alternativa para a agropecuária brasileira.

Concentração fundiária

A concentração fundiária no Brasil aumentou nos últimos dez anos, conforme o Censo Agrário do IBGE. A área ocupada pelos estabelecimentos rurais maiores do que mil hectares concentra mais de 43% do espaço total, enquanto as propriedades com menos de 10 hectares ocupam menos de 2,7%. As pequenas propriedades estão definhando enquanto crescem as fronteiras agrícolas do agronegócio.

Conforme a Comissão Pastoral da Terra (CPT, 2009) os conflitos agrários do primeiro semestre deste ano seguem marcando uma situação de extrema violência contra os trabalhadores rurais. Entre janeiro e julho de 2009 foram registrados 366 conflitos, que afetaram diretamente 193.174 pessoas, ocorrendo um assassinato a cada 30 conflitos no primeiro semestre de 2009. Ao todo, foram 12 assassinatos, 44 tentativas de homicídio, 22 ameaças de morte e 6 pessoas torturadas no primeiro semestre deste ano.

Não violência

A estratégia de luta do MST sempre se caracterizou pela não violência, ainda que em um ambiente de extrema agressividade por parte dos agentes do Estado e das milícias e jagunços a serviço das corporações e do latifúndio. As ocupações objetivam pressionar os governos a realizar a reforma agrária.

É preciso uma agricultura socialmente justa, ecológica, capaz de assegurar a soberania alimentar e baseada na livre cooperação de pequenos agricultores. Isso só será conquistado com movimentos sociais fortes, apoiados pela maioria da população brasileira.

Contra a criminalização das lutas sociais

Convocamos todos os movimentos e setores comprometidos com as lutas a se engajarem em um amplo movimento contra a criminalização das lutas sociais, realizando atos e manifestações políticas que demarquem o repúdio à criminalização do MST e de todas as lutas no Brasil.

Exterior:
Eduardo Galeano - Uruguai
István Mészáros - Inglaterra
Ana Esther Ceceña - México
Boaventura de Souza Santos - Portugal
Daniel Bensaid - França
Isabel Monal - Cuba
Michael Lowy - Francia
Claudia Korol - Argentina
Carlos Juliá – Argentina
Miguel Urbano Rodrigues - Portugal
Carlos Aguilar - Costa Rica
Ricardo Gimenez - Chile
Pedro Franco - República Dominicana

Brasil:
Antonio Candido
Ana Clara Ribeiro
Anita Leocadia Prestes
Andressa Caldas
André Vianna Dantas
André Campos Búrigo
Augusto César
Carlos Nelson Coutinho
Carlos Walter Porto-Gonçalves
Carlos Alberto Duarte
Carlos A. Barón
Cátia Guimarães
Cecília Rebouças Coimbra
Ciro Correia
Chico Alencar
Claudia Trindade
Claudia Santiago
Chico de Oliveira
Demian Ternera de Melo
Emir Sader
Elias Santos
Eurelino Conejo
Eleuterio Prado
Fernando Vieira Velloso
Gaudêncio Frigotto
Gilberto Maringoni
Gilcilene Barón
Irene Seigle
Ivana Jinkings
Ivan Pinheiro
José Paulo Netto
Leandro Konder
Luis Fernando Veríssimo
Luiz Bassegio
Luis Acosta
Lucia Maria Wanderley Neves
Marcelo Badaró Mattos
Marcelo Freixo
Marilda Iamamoto
Mariléa Venancio Porfirio
Mauro Luis Iasi
Maurício Vieira Martins
Otília Fiori Arantes
Paulo Arantes
Paulo Nakatani
Plínio de Arruda Sampaio
Plínio de Arruda Sampaio Filho
Renake Neves
Reinaldo A. Carcanholo
Ricardo Antunes
Ricardo Gilberto Lyrio Teixeira
Roberto Leher
Rosalvo Maciel
Sara Granemann
Sandra Carvalho
Sergio Romagnolo
Sheila Jacob
Virgínia Fontes
Vito Giannotti

terça-feira, 27 de outubro de 2009

A sombra

De Ilimar Franco:

Em entrevista a uma emissora de televisão no Ceará, domingo à noite, o presidente do PPS, Roberto Freire, defendeu que a campanha do PSDB para presidente em 2010 se distancie do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Pergunta vai e vem sobre as eleições e Freire sai em defesa da candidatura José Serra, afirmando: "A política econômica de FH não é a do PSDB. Não vamos associar isso ao programa de José Serra, por favor!".

Serra foi ministro de Planejamento do FHC, ajudou a afundar o país. Foi ministro da Saúde de FHC, responsável pela maior epidemia de dengue já vista no Brasil. Faz em SP a mesma política neoliberal de FHC. Privatiza, privatiza, arrocha os salários, aumenta os impostos, enterra todas as CPIs para investigar seu governo, essa não é a mesma política econômica do FHC?

Fala sério Roberto Freire!

Postado por Jussara Seixas em Blog da Dilma

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

“Antitotalitarismo” Totalitário

“…Porque é que a oligarquia capitalista haveria de se abster de gozar finalmente a sua vingança contra a «França vermelha», agora que a vitória da contra-revolução de Berlim a Vladivostok remundializou a exploração capitalista, agora que a Europa socialista e a RDA foram recolonizadas pela Europa do capital pilotado por Berlim”…?

Georges Gastaud*


Seria cômico se não fosse tão grave para a liberdade de pensamento: é com efeito em nome do «anti-totalitarismo» (!) que, apesar de praticamente nunca terem o menor direito de resposta, os defensores do comunismo histórico, e mais genericamente todos os que continuam o combate de Babeuf e de Varlin, de Marx e de Lenine, de Manouchian e de Guevara, são inexoravelmente expostos no pelourinho pelos meios de comunicação do Partido Único Maastrichtiano, muito «laicamente» ajudados pela história oficial da escola «republicana»: concelebrada pelos pontífices da direita dura e da falsa esquerda, hipocritamente acolitada pelo coro incansável dos «comunistas arrependidos», a missa de gala azul-rosa-castanho do anticomunismo de jato contínuo já bateu todos os recordes de anátemas e de excomunhões com que foram respectivamente batizados pelos contra-revolucionários do seu tempo, Spartacus e os Gracos, Robespierre e Marat, Varlin e Louise Michel…

Culminando esta perseguição midiática, uma bateria legislativa de textos europeus e/ou hexagonais pretende criminalizar a história do comunismo: «eleito» por 40% de «europeus», o Parlamento de Strasburg pretende assim amalgamar o III Reich genocida de Krupp e Thyssen à URSS operária e camponesa de Lenine, a Wehrmacht dos Einsatzgruppen aos heróis de Stalingrado, os torcionários nazis aos «terroristas vermelhos» de Châteaubriant e da Cidadela de Arras, que caíram por nós, com a Marselhesa e a Internacional nos lábios, sob as balas alemãs.

O objetivo destes textos infames é dotar com uma base jurídica o euro-maccartismo que alastra por toda a União Européia; uma UE onde os seus dirigentes, através do anticomunismo e do anti-sovietismo retardador, pretendem arranjar uma diversão para a profunda rejeição popular que, de Lisboa a Bucareste, ensombra a «construção européia» capitalista [1].

CNR? Não conheço!

De resto, quantos são os alunos de liceu, habituados desde crianças a confundir num mesmo opróbrio «antitotalitário» a Alemanha Nazi e a URSS de Stalingrado, Mussolini e Lenine, que conhecem a frase pronunciada por De Gaulle em Moscou em 1966: «os franceses sabem [2] que a Rússia soviética desempenhou o principal papel na sua libertação»? E quantos são os compêndios de história que recordam aos seus jovens leitores que as principais conquistas sociais do nosso país, – essas mesmas cujo desaparecimento mereceu as felicitações cínicas de M. Denis Kessler a Sarkozy «por desmantelar o programa da CNR» [3] – foram, no essencial, postas em prática entre 1945 e 1947 pelo governo com participação comunista presidido por Charles de Gaulle? Nesse governo de unidade patriótica, o ex-deportado comunista Marcel Paul nacionalizou a EDF e a Renault; Maurice Thorez redigiu o estatuto dos funcionários públicos e o dos mineiros; H. Wallon et Joliot-Curie reconstruíram a Educação nacional, o CNRS e o CEA numa base democrática; Ambroise Croizat (PCF) instituiu, desculpem o pormenor, as reformas por distribuição, os contratos coletivos, as comissões de empresa… e a «Segurança»: em resumo, todas essas conquistas da civilização que a «ruptura» sarkosista, aplaudida pela UE e pelo MEDEF, tenta arrasar, impondo ao nosso país um plano suicida de alinhamento estrutural.

De resto, porque é que a oligarquia capitalista haveria de se abster de gozar finalmente a sua vingança contra a «França vermelha», agora que a vitória da contra-revolução de Berlim a Vladivostok remundializou a exploração capitalista, agora que a Europa socialista e a RDA foram recolonizadas pela Europa do capital pilotado por Berlim, e que agora, no que se refere à França, a mutação-renegação do PCF e a euro-formatação do estado-maior da CGT deixam os assalariados à mercê de uma french’telecomisation» geral das suas condições de vida? Porque os novos Metternich da Europa contra-revolucionária pouco têm a recear de uma semi-crítica «alter-capitalista» e «alter-europeista» que partilha esses fundamentos do pensamento único que são o anticomunismo, o anti-sovietismo, o antimarxismo e os seus subprodutos hexagonais, o antijacobinismo primário e a sórdida autofobia nacional destilada pela oligarquia financeira «francesa» dirigida por «Sarko, o americano»…

OS HERÓIS NO BANCO DA INFÂMIA, OS HERDEIROS DOS CARRASCOS NO PAPEL DO INQUISIDOR

No clima neo-vichysta atual, já nem sequer nos espantamos que os resistentes comunistas de França que, dos bosques de Corrèze à guerrilha urbana dos FTP-MOI, passando pela insurreição parisiense de 1944, foram a ponta de lança da nossa resistência armada [4], sejam odiosamente sentados no mocho: pelo contrário, os herdeiros dos partidos que investiram Pétain entregando à Alemanha os judeus e os resistentes, acusam hoje os combatentes comunistas de não terem arriscado a pele mais cedo! Que interessa a esses falsários que, da heróica manifestação comunista organizada na Étoile a 11 de Novembro de 40 pela União dos Estudantes Comunistas [5] (proibida desde 39!) às primeiras sabotagens efetuadas no Var a partir de 1940 pelo comunista Roger Landini, passando pela greve mineira do Pas-de-Calais dirigida em Maio-Junho de 41 por Michel Brûlé e pelo prisioneiro ucraniano evadido, o bolchevique Vasil Porik, os comunistas e os cegetistas tenham assumido o grosso da luta armada e do combate de massas antifascista [6]? Que interessa que tenham caído em grande número sob os fuzilamentos nazis, dos bosques da Córsega aos postes de execução do Mont Valérien, com o grito duplo de Viva a França! e de Viva o comunismo!?

O ANTICOMUNISMO, SOMBRA PROJETADA DA CRISE CAPITALISTA

No entanto seria ingênuo pensar que o objetivo principal dos Inquisidores é apenas escurecer o passado comunista para romper com o ponto de apoio revolucionário do movimento operário. Se o espectro do anticomunismo ameaça mais do que nunca a crepuscular Europa de Maastricht, é porque, embora se tenha tornado mundialmente hegemônico, o capitalismo em crise está na defensiva. Não se cansa de depauperar a classe trabalhadora e de arruinar os camponeses, de segregar ao mesmo tempo a miséria mais pungente e as fortunas mais escandalosas, de multiplicar as guerras neocoloniais (ontem o Iraque, amanhã o Irã?), enquanto o comércio de armas e da droga reina sobre o «mercado livre mundial» organizado pela OMC e pelo FMI dos P. Lamy (PS) e outros Strauss-Kahn (PS) à força de privatizações, de deslocalizações e de crises alimentares organizadas. Durante este tempo todo, ritmada pelo duplo roubo da Bolsa e das demissões, a anunciada «saída da crise» promete ser tão insuportável como a própria crise. As pessoas honestas interrogam-se pois: sobreviverá a humanidade a este sistema louco e cruel, em que o lucro privado de alguns priva de todo o sentido humano a história dos povos e a vida dos indivíduos, enquanto que, sob a máscara «liberal», se perfila uma ditadura euro-atlântica detentora de um pensamento, de uma economia, de uma língua e de uma política únicas, cujos piores déspotas de ontem nunca ousaram formar o projeto «globalitário»!

RENASCIMENTO DO IDEAL COMUNISTA

De modo que o ideal comunista refaz o seu caminho: chegado até nós através de Cuba, que agüentou firme numa altura em que Gorby e Eltsine julgavam tê-la entregue de mãos atadas ao Tio Sam, a aspiração a um «socialismo do século XXI» renasce sob diversas formas, especialmente na América Latina. Esta aspiração articula-se no princípio antiimperialista do direito dos povos a criar eles mesmos o seu próprio destino. Porque, enfim, não será irracional que nações, línguas, culturas seculares, sejam esmagadas pelos mercantis incultos do Mac Donald e da Eurodisney? Não será suicida que na nossa época de socialização planetária das trocas, a anacrônica propriedade privadas dos grandes meios de produção confira «democraticamente» a alguns multimilionários um direito de vida e de morte sobre a vida dos povos? Inversamente, não será vital que, planificando a sua cooperação internacional no respeito da sua soberania, os povos garantam o controlo público dos grandes meios de produção e que o mundo do trabalho ocupe finalmente na vida política o lugar central que pertence por direito aos produtores das riquezas? Sim, é urgente que a solidariedade internacional dos novos proletários de colarinho azul ou branco, se alie ao patriotismo republicano para resistir à bárbara mundialização capitalista assim como aos seus cúmplices sangrentos, o racismo, o entreguismo e o comunitarismo. Porque, se é verdade que a exploração do homem pelo homem perdeu historicamente toda a sua força propulsora, se o exterminismo é mesmo a fase suprema dum sistema imperialista que leva a humanidade à morte pela destruição da sociedade, pela depredação ecológica ou pela exterminação nuclear, então a construção de um comunismo de segunda geração, no qual o «desenvolvimento de cada um [7] será a chave do desenvolvimento de todos». (Marx), torna-se objetivamente uma questão de vida ou de morte para todos os homens que quiserem construir racionalmente as suas relações com o outro homem… e com a natureza.

PARA UMA ASSIMILAÇÃO CRÍTICA DA HERANÇA COMUNISTA

Isso não exige de forma alguma que se idealize a primeira experiência comunista da história. A experiência obtida de Outubro de 1917 não teria conhecido a derrota se, por razões que as ferramentas teóricas marxistas permitem amplamente esclarecer, os trabalhadores desses países se tivessem sentido sempre, como em Cuba, os donos eletivos do seu país. Os revolucionários devem fazer esta autocrítica exclusiva de toda a autoflagelação sem ceder à diabolização da sua história por um sistema capitalista cujos crimes não mereceriam um «livro negro», mas… dezenas de bibliotecas castanhas! Também não podem deixar de engolir a água suja dos desvios políticos feitos sob o pretexto de salvar o bebê socialista ou de deitar fora o bebê socialista com a desculpa de deitar fora a água do banho; o que é preciso é partir do atraso inicial nos quais se teve que construir uma experiência historicamente inédita desviando uma parte considerável dos seus recursos para fazer face à corrida aos armamentos, à guerra ideológica e às invasões exterminadoras vindas sem cessar do ocidente. Numa palavra, convém agarrar nas condições profundamente contraditórias nas quais se edificou esse primeiro esforço da humanidade trabalhadora para construir durante décadas uma sociedade liberta da Bolsa e do capital. Importa também recusar categoricamente a desonrosa equação comunismo=nazismo, que criminaliza a revolução social e banaliza o fascismo.

OS POVOS DE LESTE FIZERAM UMA EXPERIÊNCIA HISTÓRICA DE MASSAS:
ESCUTEMO-LOS!


E, antes do mais, escutemos os povos de leste; não esses anticomunistas profissionais que ousam falar em nome dos seus respectivos povos depois de tê-los devorado e arruinado, mas os trabalhadores, os camponeses, os reformados da Rússia e da RDA, da Hungria, da Romênia, etc., que viveram e avaliaram na sua vivência quotidiana a restauração capitalista mascarada de «democratização»: porque, feita a experiência, e sem ter esquecido de modo algum as repressões arbitrárias e os aspectos burocráticos que em graus muito diversos caracterizaram a época precedente, os povos fazem o balanço; comparam os «méritos» do euro-capitalismo (pauperização galopante das massas, enriquecimento fabuloso das máfias) a essas conquistas bem reais do socialismo que se chamaram pleno emprego, educação de bom nível, cultura, desporto, férias e cuidados de saúde acessíveis a todos, habitação garantida a baixo preço, criminalidade baixa, segurança da existência, espírito de solidariedade na vida quotidiana. É o regresso racionalizado do socialismo nas memórias, atestado por todas as sondagens realizadas na RDA, na Hungria ou na Rússia, e ainda melhor nessa sondagem continental de grande envergadura que viu há pouco tempo os povos de leste a boicotar ainda mais maciçamente do que os povos do ocidente essas eleições européias por ocasião das quais o Partido Maastrichtiano Único convoca periodicamente o bom povo a «escolher livremente» entre a versão da direita e a variante de «esquerda» do clique social e do declínio nacional…

SAIR DO ANTICOMUNISMO
PARA CHEGAR À RUPTURA PROGRESSISTA

Sair do anticomunismo permitiria finalmente aos progressistas pensar de forma conseqüente a ruptura revolucionária indispensável para triunfar da sarko-«ruptura» thatchero-fascizante; libertos do complexo contra-revolucionário que lastra o seu pensamento, refreia a sua ação e impede a sua reorganização, os verdadeiros progressistas poderiam finalmente compreender e clamar que é preciso tirar a França do triturador europeu que a mata e a desnatura, que é preciso extrair a 100% a humanidade dum sistema capitalista que apenas cria riqueza «esgotando a Terra e o trabalhador» (Marx). Para toda a humanidade trabalhadora, o que está em jogo é sair a tempo deste «fim da história universal» que a mundialização contra-revolucionária pode transformar a todo o momento, se não for impedida a tempo por novas revoluções, na história universal do fim.

“1989!”, clama a reação festejando a contra-revolução anticomunista e antijacobina que julga eterna: “17 e 89!”, responderão os herdeiros de Gavroche e de Guy Moquet, decididos a triunfar tanto dos Brancos como dos Castanhos de todos os países, coligados em vão para emparedar as Luzes!
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Notas:
[1] Estes textos infames provêm, quer dos regimes anticomunistas desacreditados dos países de leste, quer dos ultras do UMP, quer da dupla neo-mussoliniana Fini/Berlusconi, quer por um cartel de euro deputados desde V. Peillon a Cohn-Bendit, passando por… Gollnisch…
[2] sabiam, melhor dizendo, tanto a história oficial censura o heroísmo de massas consentido pela URSS, bolcheviques na linha da frente, para derrotar Hitler.
[3] Challenges, Novembro de 2007, editorial de Denis Kessler, PDG e conselheiro do MEDEF.
[4] Depois de ter sido a alma das Brigadas de Espanha organizadas pelo Komintern.
[5] Na qual participou G. Moquet.
[6] E isto, apesar da interdição do partido a partir de 39 e apesar da pena de morte que o «socialista» Sérol instituiu contra eles a partir desse período
[7] (povo ou individuo, NDGG.)

Notas do tradutor (Glossário):
CEA - Comissariado da Energia Atômica – instituto público francês de caráter comercial e industrial, cuja missão é desenvolver todas as aplicações de energia atômica, tanto civis como militares. Foi criado em 1945; um dos primeiros altos comissários foi Fréderic Joliot-Curie.
CGT - Confederação Geral do Trabalho
CNR - Conselho Nacional da Resistência – formado em 1943, a partir da união dos oito maiores grupos da resistência francesa; em 1944, o CNR publicou uma carta que exigia uma série de reformas sociais e econômicas após a libertação da França, entre as quais a nacionalização das principais companhias industriais e financeiras, a instituição do salário mínimo, sindicatos livres e segurança social para todos.
CNRS - Centro Nacional de Investigação Científica – maior organização governamental de investigação em França; foi criado em 1939 por decreto do Presidente Albert Lebrun.
EDF - Eletricidade de França – principal companhia de produção e distribuição de eletricidade em França. Foi fundada em 1946, em conseqüência da nacionalização de uma série de transportadores e distribuidores de energia elétrica pelo ministro comunista da Produção Industrial, Marcel Paul.
FTP-MOI - Franco-atiradores e Guerrilheiros – Mão-de-obra-imigrada – subgrupo do movimento dos Franco-atiradores e Guerrilheiros da resistência francesa à ocupação alemã durante a II Guerra Mundial; estes grupos foram criados na região de Paris em 1941; eram constituídos por comunistas estrangeiros que viviam em França mas não faziam parte do partido comunista francês.
MEDEF - Movimento das Empresas de França – maior união de empresários da França. Conhecida anteriormente por Conselho Nacional do Patronato Francês.
UMP - União para um Movimento Popular – fundado em 2002, tem maioria absoluta na Assembléia Nacional e no Senado; este partido nasceu da convergência entre quatro principais tendências políticas francesas: o gaulismo, o liberalismo (republicano), a democracia popular e o radicalismo; o seu candidato Nicolas Sarkozy foi eleito Presidente da França em 2007.
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* Filósofo francês, Georges Gastaud é amigo e colaborador de odiario.info

Tradução de Margarida Ferreira

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

A virtude pedagógica da Confecom

Quando o governo Lula finalmente decidiu convocar a conferência, eles tentaram sabotá-la

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Por Altamiro Borges

Apesar das escaramuças e rasteiras, a convocação da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) já pode ser considerada uma grande vitória. Num curto espaço de tempo, milhares de brasileiros estão se envolvendo no debate estratégico sobre o papel da mídia na atualidade. Na semana passada, segundo balanço parcial, ocorreram mais de 60 etapas municipais, conferências livres da juventude, encontros sindicais e outros eventos para discutir o temário da Confecom. O saldo pedagógico deste rico processo, agregando milhares de pessoas, é incalculável.
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Diagnóstico e propostas concretas

No conjunto, estas iniciativas cumprem dois objetivos básicos. Em primeiro lugar, elas colocam no banco de réus a mídia hegemônica, altamente concentrada e perigosamente manipuladora. Em todos estes eventos, os participantes criticam a crescente monopolização do setor, sua conduta de criminalização das lutas sociais – o alvo do momento é o MST –, as deformações dos valores humanistas e civilizatórios, a sua postura golpista. Como os barões da mídia se recusam a tratar de seus defeitos e nem sequer divulgam a Confecom, é a sociedade que escancara os seus podres.

O segundo mérito é que, além de fazer o diagnóstico do setor, os presentes também apresentam propostas para democratizar os meios de comunicação. Alguns consensos vão se forjando nestes debates:
1) novo marco regulatório, que coíba a concentração do setor e garanta a diversidade informativa;
2) revisão dos critérios de conces são pública para as emissoras privadas de rádio e TV;
3) fortalecimento da rede pública de comunicação;
4) fim da criminalização da radiodifusão comunitária;
5) política pública de inclusão digital, garantindo “banda larga para todos”;
6) revisão dos critérios da publicidade oficial, incentivando a pluralidade;
7) medidas de estimulo à participação popular e ao controle social, com a criação dos conselhos de comunicação.

Cai a máscara dos barões da mídia
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Os latifundiários da mídia fizeram de tudo para sabotar o debate democrático na sociedade sobre os meios de comunicação. Eles impediram a regulamentação dos dispositivos da Constituição de 1988; abortaram todas as iniciativas democratizantes do setor; chantagearam e enquadraram os poderes públicos; desqualificaram os críticos da monopolização e da manipulação midiática, apresentando-os como algozes da censura; contiveram ao máximo a convocação da Confecom.

Quando o governo Lula finalmente decidiu convocar a conferência, eles tentaram sabotá-la. Num gesto desesperado, seis das oito entidades empresariais abandonaram a comissão organizadora do evento. Com isso, os barões da mídia demonstraram que não têm qualquer compromisso com a democracia; que o discurso da “liberdade de expressão” é pura retórica; que eles não defendem a “liberdade de imprensa”, mas sim a “liberdade dos monopólios”. Esta conduta autoritária pode representar um tiro no pé. No esforço pedagógico da Confecom, cai a máscara dos barões da mídia.
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Altamiro Borges é jornalista e diretor do Portal Vermelho
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quinta-feira, 22 de outubro de 2009

“QUEM PAGOU A CONTA?”

Obra da pesquisadora inglesa Frances Stonor Saunders.
(editada no Brasil pela Record, tradução de Vera Ribeiro)

Nunca engoli essa história de Fernando Henrique exilado. Não me passava pela cabeça que um filho de um graduado militar do exército (General) viesse a ser exilado. Exilado para o Chile, onde outra ditadura militar governava? Porque não teve o destino dos outros exilados, tal como: Cuba, União Soviética etc? Isto sempre me cheirou mal. Hoje tenho absoluta convicção que ele sempre esteve a serviço de interesses outros que não os do Brasil. Vou providenciar a compra imediata desse livro, com certeza.

É SEMPRE BOM LEMBRAR O QUE FEZ O FHC NA PRESIDÊNCIA!

FHC enterrou o sonho de todo brasileiro da minha geração. O "maior estadista do mundo" foi apenas, e tão somente, leiloeiro do Brasil no pós guerra fria, o cara que entregou o controle de nossa economia ao Império Anglo-saxão.

DEVEMOS LER ESTE LIVRO!!!
OBRA DE UMA PESQUISADORA INGLESA

Abaixo, informe do jornal Correio do Brasil sobre um livro recém editado por uma pesquisadora inglesa que abre algumas caixas pretas das ligações entre o alto tucanato e a CIA.

LIVRO BOMBA ACUSA FHC DE RECEBER
MILHÕES DE DÓLARES DA CIA!

Mal chegou às livrarias e Quem pagou a conta? A CIA na guerra fria da cultura já se transformou na gazua que os adversários dos tucanos e neoliberais de todos os matizes mais desejavam. Em mensagens distribuída, neste domingo, pela internet, já é possível perceber o ambiente de enfrentamento que precede as eleições deste ano. A obra da pesquisadora inglesa Frances Stonor Saunders (editada no Brasil pela Record, tradução de Vera Ribeiro), ao mesmo tempo em que pergunta, responde: Quem "pagava a conta" era a CIA, a mesma fonte que financiou os US$ 145 mil iniciais para a tentativa de dominação culturale ideológica do Brasil, assim como os milhões de dólares que os procederam, todos entregues pela Fundação Ford a Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do país no período de 1994 a 2002.

O comentário sobre o livro consta na coluna do jornalista Sebastião Nery, na edição deste sábado do diário carioca Tribuna da Imprensa.

"Não dá para resumir em uma coluna de jornal um livro que é um terremoto. São 550 páginas documentadas, minuciosa e magistralmente escritas: "Consistente e fascinante" (The Washington Post). "Um livro que é uma martelada, e que estabelece em definitivo a verdade sobre as atividades da CIA" (Spectator). "Uma história crucial sobre as energias comprometedoras e sobre a manipulação de toda uma era muito recente" (The Times).

DINHEIRO DA CIA PARA FHC

"Numa noite de inverno do ano de 1969, nos escritórios da Fundação Ford, no Rio, Fernando Henrique teve uma conversa com Peter Bell, o representante da Fundação Ford no Brasil. Peter Bell se entusiasma e lhe oferece uma ajuda financeira de 145 mil dólares. Nasce o Cebrap". Esta história, assim aparentemente inocente, era a ponta de um iceberg. Está contada na página 154 do livro "Fernando Henrique Cardoso, o Brasil do possível", da jornalista francesa Brigitte Hersant Leoni (Editora Nova Fronteira, Rio, 1997, tradução de Dora Rocha). O "inverno do ano de 1969" era fevereiro de 69.

FUNDAÇÃO FORD

Há menos de 60 dias, em 13 de dezembro, a ditadura havia lançado o AI-5 e jogado o País no máximo do terror do golpe de 64, desde o início financiado, comandado e sustentado pelos Estados Unidos. Centenas de novas cassações e suspensões de direitos políticos estavam sendo assinadas. As prisões, lotadas. Até Juscelino e Lacerda tinham sido presos. E Fernando Henrique recebia da poderosa e notória Fundação Ford uma primeira parcela de 145 mil dólares para fundar o Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). O total do financiamento nunca foi revelado. Na Universidade de São Paulo, sabia-se e se dizia que o compromisso final dos americanos era de 800 mil a um milhão de dólares.
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AGENTE DA CIA
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Os americanos não estavam jogando dinheiro pela janela. Fernando Henrique já tinha serviços prestados. Eles sabiam em quem estavam aplicando sua grana. Com o economista chileno Faletto, Fernando Henrique havia acabado de lançar o livro "Dependência e desenvolvimento na América Latina", em que os dois defendiam a tese de que países em desenvolvimento ou mais atrasados poderiam desenvolver-se mantendo-se dependentes de outros países mais ricos. Como os Estados Unidos. Montado na cobertura e no dinheiro dos gringos, Fernando Henrique logo se tornou uma "personalidade internacional" e passou a dar "aulas" e fazer "conferências" em universidades norte-americanas e européias. Era "um homem da Fundação Ford". E o que era a Fundação Ford? Uma agente da CIA, um dos braços da CIA, o serviço secreto dos EUA.
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MILHÕES DE DÓLARES
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1 - "A Fundação Farfield era uma fundação da CIA... As fundações autênticas, como a Ford, a Rockfeller, a Carnegie, eram consideradas o tipo melhor e mais plausível de disfarce para os financiamentos... permitiu que a CIA financiasse um leque aparentemente ilimitado de programas secretos de ação que afetavam grupos de jovens, sindicatos de trabalhadores, universidades, editoras e outras instituições privadas" (pág. 153).

2 - "O uso de fundações filantrópicas era a maneira mais conveniente de transferir grandes somas para projetos da CIA, sem alertar para sua origem. Em meados da década de 50, a intromissão no campo das fundações foi maciça..." (pág. 152). "A CIA e a Fundação Ford, entre outras agências, haviam montado e financiado um aparelho de intelectuais escolhidos por sua postura correta na guerra fria" (pág. 443).

3 - "A liberdade cultural não foi barata. A CIA bombeou dezenas de milhões de dólares... Ela funcionava, na verdade, como o ministério da Cultura dos Estados Unidos... com a organização sistemática de uma rede de grupos ou amigos, que trabalhavam de mãos dadas com a CIA, para proporcionar o financiamento de seus programas secretos" (pág. 147).
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FHC FACINHO
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4 - "Não conseguíamos gastar tudo. Lembro-me de ter encontrado o tesoureiro. Santo Deus, disse eu, como podemos gastar isso? Não havia limites, ninguém tinha que prestar contas. Era impressionante" (pág. 123).

5 - "Surgiu uma profusão de sucursais, não apenas na Europa (havia escritorios na Alemanha Ocidental, na Grã-Bretanha, na Suécia, na Dinamarca e na Islândia), mas também noutras regiões: no Japão, na Índia, na Argentina, no Chile, na Austrália, no Líbano, no México, no Peru, no Uruguai, na Colômbia, no Paquistão e no Brasil" (pág. 119).

6 - "A ajuda financeira teria de ser complementada por um programa concentrado de guerra cultural, numa das mais ambiciosas operações secretas da guerra fria: conquistar a intelectualidade ocidental para a proposta norte-americana" (pág. 45). Fernando Henrique foi facinho.

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Reforma ou Revolução?

Filipe
Vivemos tempos de profundas mudanças, aceleradas pelos acontecimentos históricos contemporâneos. No decurso de duas décadas - 1989/2009 - ocorreram acontecimentos de envergadura mundial que transformaram a realidade e operaram mudanças de fundo na nossa percepção dos fenômenos políticos e sociais, sejam os de âmbito nacional ou os de proteção internacional.

Sabemos que no início destes últimos vinte anos, as derrotas do socialismo na União Soviética e nos outros países europeus, operando uma alteração muito desfavorável na correlação de forças, abriram o caminho a uma ofensiva imperialista global. Na defensiva, o movimento operário internacional sofreu derrotas importantes, derrotas que acarretaram as mutações verificadas nos partidos operários e comunistas, afastando numerosos deles do marxismo-leninismo e provocando, nalguns deles, processos de auto-extinção ou a sua transformação em partidos neo-social-democratas.

A debilitação de forças e a passagem, ao longo das últimas três décadas, por uma fase prolongada de resistência à ofensiva imperialista global, operaram um recuo de posições, de objetivo e de palavras de ordem por parte dos partidos comunistas, um recuo político que originou também, em maior ou menor grau, recuos ideológicos significativos. O recente Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários, realizado nos finais de Novembro de 2008, pouco depois do deflagrar da crise, pelas discussões travadas e, sobretudo, pelo conteúdo das resoluções aí aprovadas deixou a claro as dificuldades de uma rápida e decidida viragem política e ideológica por parte destas forças, ainda procurando assimilar - com atrasos e hesitações - o significado da profunda mudança em curso.As medidas tomadas pelos centros de decisão do capital, inicialmente marcadas pela fragilização de posições e pela desorientação, não tiveram as respostas à altura dos acontecimentos e da viragem que estes anunciavam. Exemplo disto foram as contraditórias e débeis respostas dos comunistas à cavalgada de espoliação dos recursos financeiros dos Estados, destinados autoritariamente à "salvação" dos bancos e de outros grandes organismos financeiros especulativos, transferindo, direta e maciçamente, à riqueza arrecadada pelos impostos sobre os contribuintes para as mãos do grande capital.

Subsistem ainda divisões de opinião acentuadas, quanto às várias visões sobre as realidades presentes e quanto aos rumos para o combate imediato. Em vários partidos comunistas são notórias as manifestações do oportunismo (reformista, economicista, "nacionalista", revisionista). A par de um revigoramento do interesse pelo estudo e atualidade do marxismo-leninismo, observam-se manifestações múltiplas de "teorizações" e "interpretações marxianas", visando a degenerescência da teoria do proletariado e a ecletização dos princípios, pelo mascaramento/dissolução dos seus eixos principais (teoria da luta de classes, papel de vanguarda da classe operária, teoria do Estado e da Revolução, missão histórica do partido comunista, seu funcionamento e objetivos orgânicos , sua linha de massas).

Por outro lado, confirmando o processo dialético do materialismo histórico, ocorrem acontecimentos que agudizam as contradições insanáveis do capitalismo: as guerras de agressão e ocupação militar de vários países pelo aparelho militar do imperialismo EUA/NATO; as lutas nacionais de resistência e pela independência nacional dos povos, contra essas ocupações militares e contra a dominação econômico-diplomática imperialista; os processos de emancipação social e revolucionária em desenvolvimento, em vários países sul-americanos; a emergência de novas potências econômicas capitalistas, em competição direta com os antigos pólos dominantes do centro capitalista (EUA, UE, Japão), agravando as contradições e dificuldades inter-imperialistas; e, finalmente, o despoletar da crise sistêmica global do sistema capitalista mundial, com repercussões econômico-financeiras, sociais, políticas, culturais e ideológicas de dimensões inimagináveis há um escasso ano atrás e que criaram, em conjunto, um quadro de atuação inteiramente novo e mais favorável às forças operárias e comunistas, fazendo renascer o ideal do socialismo, não já como um objetivo utópico e distante, mas sim como a meta real para a luta do proletariado e dos povos na nossa época.

Este ano de 2009, tem sido particularmente rico de acontecimentos políticos e sociais de grande dimensão - perda pelos EUA do seu anterior poderio econômico, reuniões de vários G's tentando a reconstrução (duvidosa) de um novo paradigma inter-imperialista, recessão e afundamento das economias reais, regresso da especulação financeira mascarada de "fim da crise", aumento brusco do desemprego, crescimento da pobreza e da degradação social e ambiental, golpe de estado nas Honduras, intensificação dos esforços militares de domínio imperialista em antigos e novos cenários regionais - todos eles criando objetivamente novas e mais favoráveis condições para a luta política e para a luta ideológica.

Deste modo, não obstante um quadro anterior de dificuldades para o campo das forças operárias, vivemos nos dias presentes uma nova fase, que exige a retomada urgente da iniciativa histórica pelas forças revolucionárias, portadoras do projeto do socialismo. Perante a agudização da luta de classes nos planos mundial e nacionais, a luta das idéias entre o trabalho e o capital cresce de intensidade, ao mesmo tempo que se radicalizam os embates teóricos com várias concepções ideológicas que, afirmando-se marxistas, recusam o marxismo. Aos comunistas cabe - de novo, mais uma vez, sempre - intensificarem a luta ideológica, com a defesa firme e convicta do rumo socialista para a Humanidade.

Desde o seu nascimento que as teorias revolucionárias e transformadoras dos criadores do Manifesto Comunista vêm sendo encarniçadamente combatidas pelos representantes do capital. Nesta luta sem tréguas, encontramos no pensamento e nas obras de Lenine uma inesgotável fonte de ensinamentos e apoio para este combate, um combate que nos é continuamente imposto pelos seus detratores. Sempre espantosamente atuais, os escritos de Lenine contêm a marca indelével das suas idéias revolucionárias, idéias cuja atualidade a realidade da luta de classes nos confirma todos os dias. Ouçamos - lendo-o - o que ele próprio nos diz acerca da luta ideológica contra as teses revisionistas:

"O revisionismo saiu ainda pior em relação à teoria das crises e à teoria do colapso. Somente durante um tempo muito curto, e unicamente os muito míopes, podiam pensar em modificar os fundamentos da doutrina de Marx em função de alguns anos de auge e prosperidade industrial. Logo, a realidade se encarregou de demonstrar aos revisionistas que as crises não haviam fenecido: após a prosperidade sucediam-se as crises. Modificaram-se, as formas, o encadeamento, o quadro das diversas crises, entretanto estas continuavam sendo parte integrante, inevitável, do regime capitalista. Os cartéis e os trustes, unificando a produção, reforçaram ao mesmo tempo, à vista de todos, a anarquia da produção, a insegurança econômica do proletariado e a opressão do capital, aprofundando deste modo, em um grau nunca visto, as contradições de classe. Que o capitalismo marcha para o colapso – tanto no sentido das crises políticas e econômicas isoladas, como no sentido da completa demolição de todo o regime capitalista – demonstram, de modo bem palpável e em proporções particularmente extensas, os modernos e gigantescos trustes. A recente crise financeira na América do Norte, o espantoso desemprego em toda a Europa, sem falar da próxima crise industrial, cujos sintomas não são poucos, tudo isto fez com que as recentes "teorias" dos revisionistas tenham sido esquecidas por todos, inclusive, ao que parece, por muitos dos próprios revisionistas. O que não se pode esquecer são os ensinamentos que esta instabilidade dos intelectuais deu à classe trabalhadora.

"No campo da política, o revisionismo tentou rever o que constitui realmente a base do marxismo, ou seja, a teoria da luta de classes. A liberdade política, a democracia, o sufrágio universal destroem a base da luta de classes – nos diziam os revisionistas – e negavam a velha tese do Manifesto Comunista de que os trabalhadores não têm pátria. Na medida em que na democracia impera a "vontade da maioria", não devemos ver no Estado, segundo eles, o organismo da dominação de classe, nem negarmo-nos a fazer alianças com a burguesia progressista, social-reformista, contra os reacionários.É indiscutível que estas objeções dos revisionistas se reduziam a um sistema bastante harmônico de concepções, a saber: as bem conhecidas concepções liberais burguesas. Os liberais sempre disseram que o parlamentarismo burguês suprime as classes e as diferenças de classe, já que todos os cidadãos, sem exceção, têm direito ao voto e a intervir nos assuntos do Estado. Toda a história da Europa durante a segunda metade do século XIX, e toda a história da revolução russa, no início do século XX, demonstram, cabalmente, quão absurdos são tais conceitos. Com as liberdades do capitalismo "democrático", as diferenças econômicas, longe de se atenuarem, se acentuam e se aprofundam. O parlamentarismo não elimina, ao contrário, deixa evidente que, na essência, as repúblicas burguesas democráticas são órgãos de opressão de classe. Ajudando a informar e a educar e a organizar massas da população incomparavelmente mais extensas que as que antes participavam de modo ativo dos acontecimentos políticos, o parlamentarismo prepara, desta forma, não a eliminação das crises e das revoluções políticas, mas a intensificação da guerra civil durante estas revoluções."

"O complemento natural das tendências econômicas e políticas do revisionismo era a sua atitude frente à meta final do movimento socialista. "O objetivo final não é nada; o movimento é tudo"; esta frase proverbial de Bernstein expressa a essência do revisionismo melhor que muitas extensas dissertações. Determinar o comportamento de um caso para outro, adaptar-se aos acontecimentos do dia, às mudanças dos detalhes políticos, esquecer os interesses fundamentais do proletariado e os traços fundamentais de todo regime capitalista, de toda a evolução do capitalismo, sacrificar estes interesses fundamentais no altar das vantagens reais ou supostas do momento: essa é a política revisionista. Da essência desta política se deduz, com toda a evidência, que a mesma pode adotar formas infinitamente diversas e que cada problema um pouco "novo", cada mudança um pouco inesperada e imprevista dos acontecimentos – mesmo que esta mudança só altere a linha fundamental do desenvolvimento em proporções mínimas e por curto prazo –, provocará sempre, inevitavelmente, esta ou outra variedade de revisionismo. O caráter inevitável do revisionismo está condicionado por suas raízes de classe na sociedade atual. O revisionismo é um fenômeno internacional."
("Marxismo e Revisionismo", V. I. Lenine, 16 de Abril de 1908)

Se não fossem as referências espaciais e temporais - e a nomeação de um dos protagonistas do revisionismo da sua época - estes três períodos transcritos poderiam facilmente passar por textos escritos na atualidade e com propósitos e alvos inteiramente adequados aos nossos dias. O revisionismo é um fenômeno internacional, afirmava Lenine com inteira razão, e um fenômeno da sua e da nossa época, podemos nós acrescentar. A exigir-nos uma vigilância e um combate permanentes.

A época da transição do capitalismo ao socialismo teve início com a Revolução de Outubro, em 1917. Num processo acidentado, marcado inevitavelmente pelas contradições do processo dialético, próprio do materialismo histórico, vivemos hoje de novo tempos de mudança. Friedrich Engels, disse um dia: “A sociedade burguesa encontra-se diante de um dilema: ou avanço para o socialismo ou recaída na barbárie.”

Neste início do século XXI, à classe operária, aos assalariados, apresenta-se de novo aquela encruzilhada no caminho dos povos: socialismo ou barbárie. Ou seja, ou avançamos na luta rumo à construção da nova sociedade socialista, ou viveremos - atolados no pântano das teses revisionistas da conciliação de classes - um novo período da barbárie imperialista.

As experiências históricas também nos ensinam que a revolução não é um momento, mas um processo, mais ou menos prolongado, cujos caminhos e traços distintivos são o resultado de um feixe complexo e contraditório de fatores, objetivos e subjetivos, que marcam diferenciadamente cada um dos processos revolucionários e que exigem às forças da revolução estudo atento da realidade e sólida condução política, firmemente ancoradas nos princípios teóricos marxistas-leninistas que constituem um guia para a ação.

Não se alcança o socialismo sem luta. O capitalismo não se transmutará, gradual e pacificamente, no socialismo. Sob o domínio do capital, a "democracia" é um logro. Todos os combates, todas as lutas, todas as manobras tácticas, todas as alianças conjunturais, todos os passos dados devem aproximar-nos do objetivo último e não ocultá-lo ou dificultar-nos a sua conquista. Sem primeiro derrotarmos e destruirmos os aparelhos de dominação da burguesia não estarão garantidas as condições para a construção do poder dos trabalhadores. Com o grande capital explorador e imperialista não existem acordos políticos favoráveis aos explorados e aos povos. A luta do proletariado em cada país é simultaneamente patriótica e internacionalista.

Sempre com o nosso insubstituível critério de classe, definindo com clareza as prioridades, organizando primeiramente a classe de vanguarda, esclarecendo e aprendendo, unindo e mobilizando, ergamos então perante todos os trabalhadores a bandeira da revolução socialista. Coerentes com os ideais humanistas e libertadores que guiam a luta dos comunistas - luta para o nosso tempo, luta rumo ao socialismo - afirmemos com confiança: "Sim, é possível!"
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Publicado em O Assalto ao Céu

Embaixador do Brasil na OEA exige fim da "tortura" na embaixada em Honduras

O embaixador do Brasil na OEA, Ruy de Lima Casaes e Silva, exigiu hoje o fim da "tortura" a que estão submetidos os funcionários e o pessoal que se encontra na embaixada do Brasil em Tegucigalpa, onde se aloja o deposto presidente Manuel Zelaya desde o mês de setembro.
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Traduzido por Rosalvo Maciel

Se trata de um ataque "desumano", disse o representante do Brasil na Organização dos Estados Americanos (OEA), que relatou ante o Conselho da organização hemisférica como se "intensificaram progressivamente as técnicas de tortura" contra os que se encontram na embaixada.

O embaixador assinalou as "pesadas restrições" aos diretos humanos impostas às pessoas que se encontram sitiadas na legação.

A embaixada, aonde a comida chega contada e registrada, está cercada por forças policiais e militares desde que Zelaya ingressou nela, em 21 de setembro.

As casas vizinhas à sede diplomática foram evacuadas para "facilitar as medidas de restrição", entre elas cortes de água e luz.

Além disso, do lançamento de gás lacrimogêneo, ondas sonoras e outro gases de efeito não identificado dos primeiros dias, se somaram, segundo contou, "torturas psíquicas" através de potentes lâmpadas de luz que apontam para as janelas durante a noite e os intensos ruídos que impedem dormir e descansar aos funcionários que estão dentro.

Explicou que um dos focos aponta diretamente para a janela do aposento onde se encontra Zelaya, que ainda que esteja coberta com revistas, papel alumínio e plástico escuro "a intensidade da luz é insuportável".

Outro foco aponta para a garagem onde se encontra o pessoal da embaixada, ao que se unem as buzinas que tocam toda á noite e outros ruídos provocados pelos policiais imitando sons de animais para evitar que possam dormir.

Alem disso, assinalou que 24 horas por dia há guardas armados, postados em duas plataformas instaladas na frente da embaixada, vendo claramente o interior do edifício e que controlam todos os movimentos com binóculos.

Quanto à comida, relatou que o acesso é "limitado", vem preparada do exterior, é revisada e farejada por cães, mesmo que nem sempre se entregue imediatamente, inclusive, ás vezes, é deixada ao sol durante horas o que em uma ocasião provocou uma crise de diarréia generalizada.
Lima Casaes "deplorou" as ações do Governo de fato e exigiu "o fim da situação de tortura à qual estão submetidos os cidadãos brasileiros e hondurenhos" no interior da embaixada.

Ainda recordou que o artigo 2 da Convenção Interamericana contra Prevenção e Castigo da Tortura diz que anular a personalidade da vítima ou diminuir sua capacidade física ou mental ainda que não cause uma dor física ou angustia psíquica "também é tortura".

Os embaixadores e representantes dos 33 países que atualmente são membros da OEA mostraram seu apoio ao Brasil e em suas intervenções individuais pediram que acabe o sitio à embaixada.
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Original em Vos El Soberano

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Indignação com as laranjeiras

Luiz Carlos Bresser-Pereira
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Há uma semana, duas queridas amigas disseram-me da sua indignação contra os invasores de uma fazenda e a destruição de pés de laranja. Uma delas perguntou-me antes de qualquer outra palavra: "E as laranjeiras?" -como se na pergunta tudo estivesse dito.

Essa reação foi provavelmente repetida por muitos brasileiros que viram na TV aquelas cenas. Não vou defender o MST pela ação, embora esteja claro para mim que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é uma das únicas organizações a, de fato, defender os pobres no Brasil. Mas não vou também condená-lo ao fogo do inferno. Não aceito a transformação das laranjeiras em novos cordeiros imolados pela "fúria de militantes irracionais".

Quando ouvi o relato indignado, perguntei à amiga por que o MST havia feito aquilo. Sua resposta foi o que ouvira na TV de uma das mulheres que participara da invasão: "Para plantar feijão". Não tinha outra resposta porque o noticiário televisivo omitiu as razões: primeiro, que a fazenda é fruto de grilagem contestada pelo Incra; segundo, que, conforme a frase igualmente indignada de um dos dirigentes do MST publicada nesta Folha em 11 deste mês, "transformaram suco de laranja em seres humanos, como se nós tivéssemos destruído uma geração; o que o MST quis demonstrar foi que somos contra a monocultura".

Talvez os dois argumentos não sejam suficientes para justificar a ação, mas não devemos esquecer que a lógica dos movimentos populares implica sempre algum desrespeito à lei. Não deixa de ser surpreendente indignação tão grande contra ofensa tão pequena se a comparamos, por exemplo, com o pagamento, pelo Estado brasileiro, de bilhões de reais em juros calculados segundo taxas injustificáveis ou com a formação de cartéis para ganhar concorrências públicas ou com remunerações a funcionários públicos que nada têm a ver com o valor de seu trabalho.

Por que não nos indignarmos com o fenômeno mais amplo da captura ou privatização do patrimônio público que ocorre todos os dias no país? Uma resposta a essa pergunta seria a de que os espíritos conservadores estão preocupados em resguardar seu valor maior -o princípio da ordem-, que estaria sendo ameaçado pelo desrespeito à propriedade.

Enquanto o leitor pensa nessa questão, que talvez favoreça o MST, tenho outra pergunta igualmente incômoda, mas, desta vez, incômoda para o outro lado: por que os economistas que criticam a suposta superioridade da grande exploração agrícola e defendem a agricultura familiar com os argumentos de que ela diminui a desigualdade social, aumenta o emprego e é compatível com a eficiência na produção de um número importante de alimentos não realizam estudos que demonstrem esse fato?

A resposta a essa pergunta pode estar no Censo Agropecuário de 2006: embora ocupe apenas um quarto da área cultivada, a agricultura familiar responde por 38% do valor da produção e emprega quase três quartos da mão de obra no campo.

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, nesta Folha listou esses fatos e afirmou que uma "longa jornada de lutas sociais" levou o Estado brasileiro a reconhecer a importância econômica e social da agricultura familiar. Pode ser, mas ainda não entendo por que bons economistas agrícolas não demonstram esse fato com mais clareza. Essa demonstração não seria tão difícil -e talvez ajudasse minhas queridas amigas a não se indignarem tanto com as laranjeiras.
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LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA , 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Macroeconomia da Estagnação: Crítica da Ortodoxia Convencional no Brasil pós-1994".
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Publicado em MST

Guerra é paz, ignorância é força

por John Pilger
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Barack Obama, o vencedor do Prêmio Nobel da Paz 2009, está a planear uma outra guerra para acrescentar ao seu recorde impressionante. No Afeganistão, os seus agentes aniquilam habitualmente festas de casamento, agricultores e trabalhadores da construção com armas tais como os inovadores mísseis Hellfire, os quais sugam o ar para fora dos seus pulmões. De acordo com a ONU, 338 mil crianças afegãs estão a morrer sob a aliança liderada por Obama, a qual permite apenas gastos anuais de apenas US$29 per capita em cuidados médicos.
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Semanas após a sua posse, Obama iniciou uma nova guerra no Paquistão, levando a que mais de um milhão de pessoas fugissem das suas casas. Ao ameaçar o Irão – o qual a sua secretária de Estado, Hillary Clinton, disse estar preparada para "destruir" – Obama mentiu ao dizer que os iranianos estavam a encobrir uma "instalação nuclear secreta", sabendo que ela já fora relatada à Agência Internacional de Energia Atômica. Em conivência com a única potência com arma nuclear do Médio Oriente, ele subornou a Autoridade Palestina a fim de suprimir o julgamento da ONU de que Israel cometera crimes contra a humanidade no seu assalto a Gaza – crimes tornados possíveis com armas estadunidenses cuja expedição Obama aprovou secretamente antes da sua tomada de posse.
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Em casa, o homem da paz aprovou um orçamento militar que excede o de qualquer outro ano desde o fim da Segunda Guerra Mundial enquanto preside a uma nova espécie de repressão interna. Durante a recente reunião do G20 em Pittsburgh, hospedada por Obama, a polícia militarizada atacou manifestantes pacíficos com algo chamado Long-Range Acoustic Device, nunca visto antes nas ruas dos EUA. Montado na torre de um pequeno tanque, ele emite um ruído penetrante enquanto gás lacrimogêneo e gás de pimenta eram disparados indiscriminadamente. Faz parte de um novo arsenal de "munições para controle de multidão" fornecido por empreiteiros tais como a Raytheon. No Pentágono de Obama, controlado pelo "estado de segurança nacional", o campo de concentração da Baía de Guantánamo, o qual ele prometeu encerrar, permanece aberto e as "rendições", assassinatos secretos e tortura continuam.
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A guerra mais recente do vencedor do Prêmio Nobel da Paz é em grande medida secreta. No dia 15 de Julho Washington finalizou um acordo com a Colômbia que dá aos EUA sete bases militares gigantes. "A idéia", relatou a Associted Press, "é fazer da Colômbia um centro (hub) regional para operações do Pentágono... aproximadamente metade do continente pode ser coberta por um C-17 [transporte militar] sem reabastecimento", o que "ajuda a executar a estratégia de compromisso regional".
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Traduzido, isto significa que Obama está a planear uma "reversão" da independência e democracia que os povos da Bolívia, Venezuela, Equador e Paraguai alcançaram enfrentando grandes dificuldades, bem como com uma histórica cooperação regional que rejeitava a noção de uma "esfera de influência" dos EUA. O regime colombiano, o qual apóia esquadrões da morte e tem o pior registro de direitos humanos do continente, recebeu apoio militar dos EUA numa escala que vem logo atrás de Israel. A Grã-Bretanha fornece treino militar. Guiados por satélite militares dos EUA, paramilitares colombianos infiltram-se agora na Venezuela com o objetivo de derrubar o governo democrático de Hugo Chávez, o que George W. Bush não conseguiu fazer em 2002.
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A guerra de Obama à paz e à democracia na América Latina segue um estilo que ele já demonstrou no golpe contra o presidente democrático das Honduras, Manuel Zelaya, em Junho. Zelaya havia aumentado o salário mínimo, concedido subsídios a pequenos agricultores, reduzido taxas de juros e diminuído a pobreza. Ele planeava romper um monopólio farmacêutico estadunidense e fabricar medicamentos genéricos baratos. Embora Obama tenha apelado à restituição do poder a Zelaya, ele recusa-se a condenar os executores do golpe e a chamar o embaixador dos EUA ou as tropas estadunidenses que treinam as forças hondurenhas determinadas a esmagar uma resistência popular. A Zelaya foi reiteradamente recusada uma reunião com Obama, o qual aprovou um empréstimo do FMI de US$164 milhões para o regime ilegal. A mensagem é clara e familiar: bandidos podem atuar com impunidade em prol dos EUA.
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Obama, o suave operador de Chicago via Harvard, foi alistado a fim de restaurar o que chama de "liderança" por todo o mundo. A decisão do comitê do Prêmio Nobel é a espécie de enjoativo racismo inverso que beatificou o homem por nenhuma outra razão senão a de que é membro de uma minoria e atraente para sensibilidade liberais, se não para as crianças afegãs que ele mata. Isto é o Apelo de Obama. Não é diferente de um apito de cão: inaudível para a maioria, irresistível para os loucos e os estúpidos. "Quando Obama entra numa sala", emocionou-se George Clooney, "você quer segui-lo para algum lugar, seja onde for".
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O grande porta-voz da libertação negra, Frantz Fanon , entendeu isto. Em Os condenados da terra descreveu o "intermediário [cuja] nada tem a ver com transformar a nação: consiste, prosaicamente, em ser a linha de transmissão entre a nação e o capitalismo, desenfreado embora camuflado". Porque o debate político tornou-se tão degradado na nossa monocultura dos media – Blair ou Brown, Brown ou Cameron – raça, gênero e classe podem ser utilizados como ferramentas de propagada sedutora e diversão. No caso de Obama, o que importa como Fanon destacou numa outra era, não é a elevação "histórica" do intermediário, mas a classe a que ele serve. Afinal de contas, o círculo próximo de Bush era provavelmente o mais multirracial da história presidencial. Havia Condoleezza Rice, Colin Powell, Clarence Thomas, todos a servirem devidamente um poder extremista e perigoso.
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A Grã-Bretanha teve o seu próprio misticismo semelhante ao de Obama. No dia seguinte à eleição de Blair em 1997, o Observer previu que ele criaria "novas regras à escala mundial sobre direitos humanos", ao passo que o Guardian se rejubilou com o "ritmo ofegante com que as comportas da mudança arrebentam". Quando Obama foi eleito em Novembro último, o deputado Denis MacShane, um devoto dos banhos de sangue de Blair, involuntariamente nos advertiu: "Eu fecho os meus olhos quando ouço este rapaz e podia ser o Tony. Ele está a fazer a mesma coisa que fizemos em 1997".

Original em johnpilger.com
Este artigo encontra-se em Resistir
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sábado, 17 de outubro de 2009

Movimento pela Vergonha na Cara faz Carta Aberta a William Waack

Não passou em branco o desprezo nem as opiniões entreguistas do jornalista William Waack sobre o pré-sal. Em uma “carta aberta” dirigida nesta sexta-feira (16) ao apresentador da TV Globo e da Globo News, o Movimento pela Vergonha na Cara (MVC) dispara contra Waack.
Os protestos tiveram como base um depoimento dado no mesmo dia pelo jornalista no programa Entre Aspas, da Globo News. Segundo a carta aberta, Waack declarou no ar que “a reserva petrolífera do pré-sal não terá relevância alguma ao futuro do país, em razão do desenvolvimento de energias alternativas.”
A resposta do Movimento pela Vergonha na Cara foi contundente. Entre outras “qualificações”, o jornalista global é acusado de ser “um dos mais esforçados porta-vozes da UGP — União dos Gigolôs da Pátria”, “um dos que sobrevive através de mentiras desenvolvidas para enganar ao povo brasileiro e incentivar a prostituição do país aos interesses internacionais”, “capacho dos interesses externos e prepotentemente contrário aos interesses do futuro do povo brasileiro”, “sabujo dos interesses do capital estrangeiro”.
Confira abaixo a íntegra do texto.

Carta Aberta a William Waack
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Não utilizamos aqui qualquer pronome ou outro tratamento à sua pessoa, por você mesmo se desqualificar através de seus conhecidos e ingentes esforços como traidor da pátria.Nós, do MVC — Movimento pela Vergonha na Cara, tivemos o desprazer de acompanhar hoje, 16/10/09, sua declaração ao programa Entre Aspas da Globo News de que a reserva petrolífera do pré-sal não terá relevância alguma ao futuro do país, em razão do desenvolvimento de energias alternativas.
Fosse você um completo desinformado, incapaz de deduzir as milhares de aplicações dos derivados do petróleo, poderíamos compreender a ignorância contida nessa afirmação e procurar esclarecê-lo, fornecendo-lhe informações elementares a respeito do assunto. Mas é evidente que a bobagem proferida não reflete ignorância ou imbecilidade. Muito pior, reflete mórbida falta de caráter que se faz persistente, denotando-lhe como um dos mais esforçados porta-vozes da UGP — União dos Gigolôs da Pátria.
Sabemos que você não é um idiota de graça. Sabemos que ganha para desinformar o povo brasileiro em benefício do maior crime lesa-pátria já intentado em nossa história com a não consumada privatização da Petrobras, quando já se evidenciavam os indícios de uma das maiores bacias terrestres da matéria prima. Sabemos que, como cúmplice daqueles gigolôs, você é um dos que sobrevive através de mentiras desenvolvidas para enganar ao povo brasileiro e incentivar a prostituição do país aos interesses internacionais.
Esta carta para desmascarar suas intenções será distribuída pela internet através da rede de correspondentes que integra o Movimento pela Vergonha na Cara e, certos de que chegará até você através daqueles a quem tenta enganar, esclarecemos que nosso objetivo é erradicar o malefício que você, seus colegas, seus patrões, e os políticos a que vocês apóiam e promovem, representam para o Brasil e o povo brasileiro. Esteja certo de que voltaremos a apontar suas farsas a cada vez que você usar de espaços públicos de comunicação, sejam concedidos ou assinados, para mentir aos brasileiros se passando por idiota, imbecil ou ignorante.
Sempre que para desqualificar os esforços do maior patrimônio empresarial do povo brasileiro, a Petrobras, você se mentir como incapaz de imaginar que mesmo depois de que todos os biocombustíveis e fontes alternativas de energia substituírem a gasolina ou o diesel, a ampla diversidade de empregos e aplicações do petróleo continuará tornando a exploração do pré-sal um dos mais significativos empreendimentos mundiais; desmascararemos abertamente sua farsa. Destacaremos que você mesmo entrevistou, com abjeta subserviência, um general do Departamento de Defesa dos Estados Unidos especialmente enviado ao Brasil para negociar a participação daquele país na exploração do pré-sal, como você mesmo anunciou em notável demonstração da canalhice contida em sua personalidade que com tamanha empáfia, hoje, declara nossa reserva do pré-sal como inócua.
Se faz de imbecil, mas tem plena ciência de que se o pré-sal fosse tão insignificante quanto afirmou para sua colega (em caráter inclusive) Monica Waldvogel no Entre Aspas, aquele seu entrevistado não seria enviado pelo governo norte-americano ao Brasil e nem teria se servido, há poucas semanas atrás, de seu servilismo no lamentável noticiário que você apresenta.
Não nos interessa quem lhe paga para ser capacho dos interesses externos e prepotentemente contrário aos interesses do futuro do povo brasileiro, mas nos esforçaremos para tornar pública sua função de gigolô da pátria, alertando a todos que queiram recuperar a dignidade e a vergonha na cara, até que um dia possamos erradicar os farsantes que como você trabalham para corromper o futuro de nossos filhos e do nosso país.
Por enquanto, continuaremos colhendo informações sobre sua longa experiência como sabujo dos interesses do capital estrangeiro, a serem usadas sempre que tornar a expor suas mentiras e enganações de gigolô.
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MVC - MOVIMENTO PELA VERGONHA NA CARA
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Publicado em Vermelho

Viva o dia da resistência originária!

Elaine Tavares

É outubro na pequena ilha de Santa Catarina, um outubro friorento, nunca visto. Diferente, com certeza, daquele outubro de 1492, quando Cristóvão Colombo aportou em Santo Domingo, julgando ter chegado às Índias. Na manhã daquele dia 12 um pequeno grupo da etnia Taino observou a grande nau e preparou-se para o encontro. Na praia, eles esperaram, sem maldade. Pouco depois desciam os espanhóis e nunca mais a vida seria a mesma. Começava ali um processo de destruição que dura até hoje.

No rastro da invasão, povos inteiros foram dizimados, civilizações foram destruídas e milhões de almas aprisionadas. A conquista das terras novas, por espanhóis e portugueses, abriu caminho para a sangria das riquezas que, levadas para a Europa, propiciaram o florescimento do capitalismo, um jeito de organizar a vida tão predador quanto os tempos feudais.

As comunidades autóctones foram conquistadas por cavalos, canhões e homens de além mar. Mas, apesar da dominação, as gentes originárias nunca se renderam de verdade. Vencidas sim, mas não destruídas. Vez ou outra, ao longo destes 500 anos, levantaram-se os heróis da liberdade. Tupac Amaru, Tupac Catari, Sepé Tiarajú, Guaicaipuro, Daquilema Apu e tantos outros, abrindo caminhos que hoje seguem sendo trilhados.

Nestes primeiros anos do século XXI as culturas originárias estão vivendo um novo esplendor. Levantadas em luta elas buscam o reconhecimento de seus deuses, de seu jeito de viver. Querem ser reconhecidas como nacionalidades e recuperam seus verdadeiros nomes. Não mais índios, como se fossem uma coisa só. Não! São aymara, guarani, quíchua, shuar, bororo, caraíba, xavante, tamoio, uru, sioux, navajo, zapoteca, naso, embera, mapuche... e centenas de outros que voltam a dizer sua palavra viva.

Muito há para conquistar, muita luta por travar, mas a primeira delas é com os bem intencionados que dizem lutar pelos direitos dos originários, mas não lhes reconhecem o direito de ser quem são. É fato que grande parte das comunidades autóctones estão submetidas pela lógica do capital e, tal qual os empobrecidos de outras etnias são companheiros de classe: a dos oprimidos pelo sistema capitalista. Mas, de qualquer forma, para além desta condição de parceiros de classe, muitos dos originários que ainda vivem em comunidades estabelecidas por laços de parentesco tem sua especificidade étnica. Esquecer isso é não compreender que estes povos, mesmo tendo passado 500 anos, jamais se olvidaram de sua velha cultura, passada de pai para filho, no silêncio da resistência.

Não é sem razão que as comunidades autóctones tenham logrado conquistar o estado plurinacional na Bolívia e no Equador, garantindo assim a condição de seguir mantendo sua forma original de organizar a vida. Não como um retorno obtuso a um passado acrítico de tradições, mas dialeticamente uma volta acima, recuperando os conceitos que podem ser retomados e inventando novas formas de viver num mundo que já não é mais o mesmo de antes. Um jeito permeado de telúricas lembranças, sim, mas diferente.

Hoje, o movimento originário avança e não se submete mais a teorias alheias. Conquistou sua maturidade, construindo saberes próprios, desgarrados do eurocentrismo e da submissão. Lutam pelo seu território, pela sua cultura e seus deuses. Sabem que são parte de um sistema que depreda, que destrói, que esgota a natureza. Sabem ser também parte do mesmo exército de desvalidos que representam a periferia do capital. Mas, como nacionalidades, querem o direito de viver de acordo com suas próprias regras, atendendo ao chamado da terra-mãe.

É este novo movimento autóctone que dá o seu grito neste 12 de outubro. Não mais como um povo tutelado pelos estados-nação, mas como uma gente que conquistou a possibilidade de voltar a dizer seu nome e de gerir a própria existência. Hoje, neste 2009, nunca o dito de Tupac Catari foi tão verdadeiro. “Eu voltarei e serei milhões”. Pois assim é agora.

Viva a resistência dos povos de Abya Yala!

12 de outubro de 2009
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Desde a terra dos Guarani - Meiembipe
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Original em Brasil de Fato

Para incriminar MST, imprensa corporativa ignora grilo da Cutrale

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Transnacional já foi notificada pela Justiça Federal em 2007; imprensa usou imagens para tentar impor CPI

Luís Brasilino e Renato Godoy de Toledo

No dia 5, O Jornal Nacional da Rede Globo exibiu imagens captadas pela Polícia Militar de São Paulo nas quais integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) passam um trator sobre plantações de laranja, na zona rural de Iaras (SP).

O telejornal não citou nominalmente a empresa que controla as terras ocupadas pela organização. Trata-se da Sucocítrico Cutrale, transnacional brasileira que tem como finalidade a exportação de suco de laranja. A notícia veiculada pela TV Globo repercutiu em todos os veículos. Em editorial, os jornais de maior circulação do país usaram terminologia agressiva contra o movimento. Terroristas, criminosos e vândalos foram termos recorrentes atribuídos aos militantes do MST. Tais jornais trataram o ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, e o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), Rolf Hackbart, praticamente como membros do movimento, mas que discordaram da ação em Iaras.

Terra grilada


Para o MST, a intenção da imprensa e da polícia é criminalizar o movimento e instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito. Em setembro, a bancada ruralista conseguiu reunir assinaturas para instaurar uma CPI contra o MST, mas a tentativa acabou frustrada. Agora, as imagens de Iaras deram novo fôlego

a esses setores que, no fundo, miram inverter o debate e barrar a atualização dos índices de produtividade rural, prometido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

As versões sobre o que ocorreu em Iaras são muito opostas, a começar pela titularidade da terra, que a imprensa "concede" à Cutrale. Mesmo dando muito espaço sobre o caso de Iaras, os jornais não abordaram profundamente o tema. Disseram que o movimento destruiu plantações numa propriedade produtiva, mas não deram importância ao fato de o INCRA reivindicar a área, alegando que a terra foi grilada.

A área, atualmente controlada pela Cutrale, faz parte de um lote chamado Núcleo Monções, que possui cerca de 30 mil hectares pertencentes à União, segundo o INCRA. Em 2007, a Justiça Federal concedeu a totalidade do imóvel para o instituto. A empresa, no entanto, permanece na área e utiliza-se de ações judiciais para reverter a decisão.

Argumentos do MST

No dia 28 de setembro, o movimento ocupou, pela terceira vez, uma área de cerca de 2,7 mil hectares no Núcleo Monções a fim de pressionar o governo para que ele retomasse a área e realizasse assentamentos. De acordo com o movimento, os dois hectares destruídos seriam utilizados para plantar alimentos básicos aos acampados. O MST calcula que cerca de 400 famílias poderiam ser assentadas na área ocupada. No entanto, a divulgação das imagens acelerou o processo de reintegração de posse, que acabou ocorrendo no dia 6.

A imprensa corporativa usou o argumento da produtividade da terra para criticar o MST, que rebateu, em nota: "Somos os primeiros e mais interessados em fazer com que as terras agrícolas realmente produzam alimentos. No entanto, não podemos nos calar enquanto terras públicas continuarem sendo utilizadas em benefício privado; enquanto milhares de famílias sem-terra continuarem vivendo na beira de estradas, debaixo de lonas pretas. A produtividade da área não pode esconder que a Cutrale grilou terras públicas. Aos olhos da população, por mais impactantes que sejam, as imagens não podem ocultar que uma multinacional extrai riqueza de terras griladas. Mais do que somente esclarecer os fatos, é preciso entender a complexidade e a dimensão da luta pela terra naquela região", afirma nota do MST-SP.

O movimento também criticou a atitude da Justiça, que, em agosto, decretou a extinção do processo em que o INCRA reclama a fazenda como terra pública. "A Justiça alegou que o INCRA, órgão federal responsável pela execução da Reforma Agrária, é ilegítimo para reivindicar a área. Quem poderá fazê-lo então?", contesta.

Estranheza

A ação dos trabalhadores havia ocorrido no dia 28 de setembro, e neste dia fora divulgado que o movimento ocupou a fazenda e destruiu pomares de laranja. No entanto, apenas no dia 5 as imagens foram divulgadas. A demora para publicar as imagens - que, sem dúvida, contêm forte apelo midiático - causou estranheza em movimentos sociais.

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) acredita que a divulgação tardia das imagens possa ter sido usada como uma carta na manga dos ruralistas, para dar novo fôlego à CPI do MST, que havia sido enterrada dias depois da ocupação. “(A CPI) acabou frustrada porque mais de 40 deputados retiraram seu nome e, com isso, não atingiu o número regimental necessário. A bancada ruralista se enfureceu”.

A ação do MST do dia 28, que, ao ser divulgada pela primeira vez não provocara muita reação, poderia dar a munição necessária para novamente se propor uma CPI contra o MST. “E numa ação articulada entre os interesses da grande mídia, da bancada ruralista do Congresso e dos defensores do agronegócio, se lançaram novamente as imagens da ocupação da fazenda da Cutrale”, aponta nota da entidade.
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Original em Brasil de Fato

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