Além do Cidadão Kane

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Moralizar o capitalismo?

Traduzido por J.A. Pina/Rosalvo Maciel

O dinheiro público corre em abundancia para salvar os bancos. Para fazer aceitável a medida, os governantes prometem rigor e moral. Mas se calam ante os grupos de pressão, mestres na arte das artimanhas.


Moralizar o capitalismo – cuja imagem está muito deteriorada pela crise - era o grande propósito da reunião do G20 de Londres, em 2 de abril último. Ia-se colocar em ordem as finanças, causas de todos os males! Regular, enquadrar, vigilar. Mas dos belos discursos aos fatos, há um passo que os dirigentes políticos atuais se esforçam em não ultrapassar. Ou por opção ideológica: deixa andar os mercados e todo estará em seu lugar! Ou por medo, como bons vassalos, a contrariar aos mercados mencionados. As finanças, em troca, têm retomado muito rapidamente a lucratividade, como o mostra a soberba recobrada dos bancos norte-americanos. Estavam no centro da crise das subprimes, abarrotados de títulos podres. À beira da bancarrota, inclusive completamente quebrados como Lehman Brothers em setembro de 2008. E de repente em alguns meses, tudo vai vento em popa. Os resultados do primeiro trimestre de 2009? Melhores do que o previsto. Benefícios para todo o mundo: Citigroup, Goldman Sachs, JP Morgan Chase, Wells Fargo, Bank of America… O controle de eficiência ao qual lhes submeteu o Federal Reserve (o Fed) para avaliar sua capacidade de enfrentar um agravamento da crise? Ainda que dez bancos sobre dezenove inspecionados deverão reforçar-se aumentando seu capital, os resultados são muito menos ruins do que o previsto, nos dizem.

Efetivamente, para sair do apuro, as autoridades norte-americanas não têm economizado em nada. Entre as intervenções excepcionais do Fed para descongelar o mercado do crédito e os aportes do Tesouro para recapitalizar as entidades mais frágeis, o salvamento mobilizou em alguns meses o equivalente a 1,8 trilhões de euros. Mas legais que são, agora que vão melhor, os bancos já tem uma só idéia na cabeça: reembolsar as ajudas públicas. Há um pequeno problema: suas motivações, não tem nada de virtuosas. Trata-se de pagar rapidamente ao Estado para que não se meta em seus assuntos. Sobre tudo em seus salários, com um teto, em contrapartida às ajudas recebidas, de 500.000 dólares por ano (em torno de 300.000 €). É preciso poder “remunerar normalmente os quadros diretivos” e “restabelecer os bônus”, explica, falando seriamente, Kenneth Lewis, presidente do Bank of America (“Les Echos” de 24 de maio).

Cínico? Não mais que o resto. Os resultados dos controles de resistência “arranjados” sob a pressão dos diretores das grandes entidades (“Wall Street Journal” de 9 de maio), um poderoso lobby que aportou 1,6 bilhões de euros de contribuições para a última campanha eleitoral. As contas “maquiadas” graças a mudança das normas contábeis. Em primeiro de abril, o Congresso autorizou os bancos, em caso de crise, a não taxar seus ativos a preços de mercado: falando sem rodeios, a não “contabilizar” a zero todos os ativo “tóxicos” que possuem. Segundo a imprensa norte-americana, a Wells Fargo, campeã do exercício, havia desta maneira, inflado seus ativos em varias dezenas de bilhões, anunciando um beneficio trimestral de 2,3 bilhões de euros. Ou mais ainda, a limpeza “mutua” de balanços graças ao plano do secretario de Estado do Tesouro, Timothy Geithner, uma cooperação público-privado para resgatar os ativos “tóxicos” dos bancos. Para uma transação de 100, o Estado porá 7, o comprador privado 7, e o resto será financiado por um empréstimo do Estado. Os primeiros leilões terão lugar nos primeiros dias de julho. Os bancos e seus testas-de-ferro estão na linha de largada… sobre tudo para comprar. Para comprar barato com um lance inicial ridículo, uns ativos, possivelmente, não tão podres como este: se os negócios se recuperam, serão vendidos com um grande beneficio. Se não, está claro, que é o Estado que assumirá o essencial do risco. Especulação, incentivo e dispersão de batatas quentes: os banqueiros não pedem o costume! e, uma vez mais, os governos calam.

Notas
O milagre dos bancos norte-americanos (em bilhões de euros)
* Citigroup : Perdas 2008 : 13,2
Lucro no primeiro trimestre 2009: 1,2
Ajuda do Estado : 35
* Bank of America : Perdas 2008 : 1,3
Lucro no primeiro trimestre 2009: 3,2
Ajuda do Estado : 35
Wells Fargo : Perdas 2008 : 2
Lucro no primeiro trimestre 2009 : 2,3
Ajuda do Estado : 19
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Original em L'Humanité

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