EMERSON LEAL*
Que meus bons amigos da rádio Intersom-FM entendam minha manifestação como uma forma de contribuir com o debate sobre a realidade cubana. Faço-o pelo fato de que suas observações no programa de terça-feira passada, sobre a decisão de Raúl Castro de substituir alguns ministros, apresentaram algumas incorreções.
Poucas pessoas no Brasil sabem como funciona a democracia cubana. Elas não têm culpa disso. A culpa é da nossa mídia monopolista que, por ser subserviente aos interesses norte-americanos e, óbvio, por pura ideologia também, distorce os fatos, omite-os ou mente sobre a realidade na Ilha de Fidel. Então fica difícil, senão impossível, formar uma opinião correta sobre o que ocorre em Cuba.
A maior desinformação, divulgada aos quatro ventos, é a seguinte: “Fidel ficou mais de 45 anos no poder. Nunca quis largar a rapadura. Portanto, é um ditador”! Ora, afirmar isso é desconhecer, primeiro, que o sistema de governo em Cuba é parlamentarista, como na maioria dos países europeus; segundo, que esta decisão, consubstanciada na Constituição cubana, foi construída num amplo processo em que o povo participou amplamente das discussões, aprovando-a; terceiro, que Fidel, como todos os membros do Parlamento Cubano, tem de se submeter, de quatro em quatro anos, ao veredicto popular através de eleições, como candidatos a deputado. Isso é democracia!
Simples assim, meus amigos. Por outro lado, se o Parlamento a cada quatro anos escolhia Fidel Castro como Primeiro-Ministro, era pelo fato de que ninguém, dentre os deputados do partido (nem dos sem-partidos – sim, porque em Cuba qualquer cidadão sem partido pode se candidatar às eleições, como acontecia na ex-URSS) tinha uma liderança ou uma popularidade maior que a dele. Além disso, o voto em Cuba é distrital. Pergunto: quem, no Distrito em que Fidel morava, o sobrepujava em reconhecimento e popularidade? Então, não era nenhuma surpresa que ele sempre se elegia deputado com mais de 90% dos votos. Registre-se ainda que é o primeiro-ministro, em qualquer sistema parlamentarista, que forma o governo, como fez Raúl Castro recentemente.
Em síntese, chamar Fidel Castro de ‘ditador’ é não só ignorância política, como um desrespeito para com o povo cubano. Eles escolheram sua democracia dessa forma, e não da nossa (felizmente), onde o que prevalece é a força do poder econômico – que o digam as bancadas do setor agro-exportador (ruralista), a dos banqueiros, a dos evangélicos etc., no nosso Parlamento (o Congresso Nacional).
Outra grande desinformação é sobre a eleição ilimitada. Pelos comentários de meus amigos na rádio pode-se concluir que os EUA, por mais de 150 anos – desde a eleição de seu primeiro presidente George Washington em 1789, até 1950 quando acabou o sistema de eleições ilimitadas – foram sempre uma ‘ditadura’ e, portanto, seus presidentes foram todos ‘ditadores’. Da mesma forma, os países europeus como a Alemanha, França, Inglaterra, Espanha, etc., seriam hoje ditaduras também, porque neles prevalecem as eleições ilimitadas.
O que não entendo, é por que Fidel ou Hugo Chaves seriam ‘ditadores’ por apoiarem as eleições ilimitadas, e os presidentes ou primeiros-ministros dos países europeus não! Registre-se ainda o fato de que a classe dominante norte-americana acabou com as eleições ilimitadas nos EUA por puro medo de que um outro Franklin D. Roosevelt fosse eleito e acabasse com a ‘alegria’ do complexo industrial-militar e do setor financeiro, como fez o presidente Roosevelt com o ‘New Deal’, ou como tentou fazer Kennedy (por isso o mataram).
Moral da história: há que respeitar, sempre, o sentimento do povo, que é sábio! Ninguém se elege ilimitadamente se ele – o povo – não quiser! ‘Eis a questão...’
*Doutor em Física Atômica e molecular e vice-prefeito de São Carlos.
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